Já vai longe o dia em que cheguei a Florianópolis, com minha
velha mochila verde, vinda de Passo Fundo para fazer a faculdade de Jornalismo.
De cara, meu primeiro encontro com a cidade foi o Mercado Público, a
Conselheiro Mafra, a Lurdinha. Eu olhava para toda essa beleza e pensava: “onde
estará a luta popular”? Foi então que me disseram que a vida pulsava em
Florianópolis a partir do trabalho do padre Vilson Groh, do Mont Serrat e da
irmã Ivone. Eles dirigiam o Centro de Apoio e Promoção do Migrante. Não demorou
muito para eu estar com eles, disposta a partilhar daquele trabalho bonito de
acolhida e organização das gentes que chegavam a levas do interior do estado.
A cidade, repleta de espaços vazios, ansiava por pessoas de
outras cores, outras etnias, outros quereres. A velha província do
funcionalismo público estava prestes a mudar.
Na caminhada fui encontrando outros lutadores. O Loureci, a
Elisa, O Lázaro, a Melita, a Chica, o Roberto, tanta gente, tanta gente e, com
eles fui vivenciando a dolorosa luta por moradia, por direito à cidade. Foram
muitas noites de organização de ocupação, muitas madrugadas de terras
repartidas, muitas ocupações da prefeitura, da Câmara de Vereadores, muitos
despejos, muitos vídeos feitos nas piores condições, muitos textos.
Com o passar dos anos fomos vendo a cidade mudar, com o
nascimento de bairros inteiros como o Monte Cristo, Chico Mendes, Vila
Aparecida e tantos outros. Vivíamos a cidade pulsante, popular, comunitária.
Uma experiência única.
Agora, no início desse ano, a jornalista Miriam Santini de
Abreu, da Pobres e Nojentas, decidiu recuperar aquela linda história das lutas
de ocupação da cidade. E, aos poucos foi juntando as gentes, em longas entrevistas
de memórias. Pela linha do tempo estão passando esses rostos e vozes que um dia
ousaram enfrentar os chamados “donos da cidade”. Ocuparam os vazios urbanos e
fincaram ali suas casas e seus corações.
Nas entrevistas explodem as lembranças e vão se descortinando as
batalhas cumpridas coletivamente. Muitos dos personagens já foram escutados,
outros ainda o serão. Também está prevista uma discussão com todos os
envolvidos nessa luta histórica, para organizar as memórias. E, por fim, haverá
um documentário o qual servirá como uma linha condutora de todas essas vidas
que se encontraram na década de 80 para fazer história.
Vale a pena navegar pela página do projeto que Miriam coordena
com a parceria do professor Jorge Ijuim, e outros tantos companheiros da UFSC e
do movimento popular.
Ali, viceja a vida real, a vida da cidade, essa Florianópolis
guerreira, migrante, negra, mestiça e rebelde.
Vejam o meu depoimento
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