sábado, 7 de julho de 2012

Voltar às costas ao mar



É comum a gente ouvir a maioria dos políticos – de esquerda inclusive - e os empresários de Florianópolis dizer que a cidade virou as costas para o mar e que é chegada a hora de mudar essa concepção atrasada. Investir no turismo, vocação natural. Pois, na contramão da história eu digo que isso está errado. Na verdade, já faz muito tempo que a cidade está bem de frente para o mar, embarcando na onda estúpida do desenvolvimento capitalista que considera o mar e a sua orla como espaço de especulação e lucro.

Quando a cidade de Florianópolis estava mesmo de costas para o mar, a concepção de vida era outra. O mar era visto como espaço de trabalho, lugar onde as famílias iam buscar a comida do dia-a-dia, quintal de descanso e fruição. Quem conheceu a velha Desterro, antes do inchaço migratório dos anos 80, deve se lembrar que, nas praias, as casas tinham o mar ao fundo, onde ficavam os ranchos de canoa, os apetrechos da pesca. Porque ninguém via a natureza como coisa à venda.

Mas, aos poucos o mar começou a ser disputado pelo “empreendedorismo imobiliário”. Como era possível que as famílias vivessem de costas para tanta beleza? Era o que diziam... Mas, isso nunca foi verdade. Ter o mar no fundo de casa não era virar-lhe as costas. Pelo contrário. Era proteção. Aquela maravilha não se lhes aparecia como paisagem especulada. Era mesa farta, morada das sereias, dos peixes, do mistério.

Foram os abutres do capital que mudaram a lógica. Chegaram com suas pastas pretas oferecendo uma vida melhor. “Por que não trocar a difícil vida na beira praia por um bom apartamento no Roçado, em Serraria, em São José? Já não é hora de deixar de andar com os pés sujos de areia e viver num lugar onde o chão é um carpete felpudo?” E tantas famílias caíram nesse conto de sereia, abandonando a beira da praia em busca de um eldorado moderno. Foram viver a promessa capitalista do apartamento seguro de 50 metros quadrados enquanto as empreiteiras iniciavam a construção de monstros verticais ou condomínios de luxo nas praias. O mar deixava de ser mesa para tornar-se paisagem à venda.

Arrisco dizer que aquele que ama Florianópolis deveria pensar melhor sobre essa sanha turística. Talvez fosse hora de, de novo, voltar às costas ao mar, como faziam os antigos. Proteger essa beleza, esse patrimônio. Pensar outra lógica de turismo, comunitário, popular. Um processo de compartilhamento da beleza do qual as próprias gentes da cidade possam se apropriar. Vi essa experiência há pouco tempo no Egito. Ao longo do rio Nilo, lugar de extrema beleza, berço de uma das mais antigas civilizações, circulam milhares de turistas. Mas, a forma como as comunidades compartilham a maravilha de sua cultura é radicalmente diferente. Ainda não está tomado pelas grandes companhias ou grandes empresas, embora elas existam, é claro. Mas, a maioria dos serviços é prestada por famílias, pessoas físicas. Tudo se intercala e se complementa. Cada um ganha um pouco e ao mesmo tempo preserva a margem do rio dos monstrengos imobiliários.

Penso que essa realidade é possível de ser constituída na ilha. As pessoas têm essa condição de tomar nas mãos os destinos de Florianópolis e protege-la da destruição. Por isso eu quero muito ver a nossa cidade voltar às costas ao mar, para que ele volte a ser mesa e rede onde descansamos... Eu quero ver, e luto por isso!

sexta-feira, 6 de julho de 2012

A brincadeira que é real...

Governo orienta dedo-durismo


O secretário das Relações de Trabalho no Serviço Público, Sérgio Mendonça, encaminhou - nesse dia seis de julho - mensagem aos dirigentes do setor de recursos humanos das universidades orientando para o corte de ponto dos trabalhadores que estiverem participando das paralisações ou greve. O documento solicita ainda que sejam repassadas informações a cada três dias sobre a extensão das paralisações e os possíveis “prejuízos”. Diz ainda que como não há nenhuma regulamentação do direito de greve, os dirigentes devem aplicar a mesma lei que se aplica em empresas privadas.

No parágrafo seguinte, o representante do Ministério do Planejamento pede que seja também informado se os trabalhadores cumpriram com o aviso antecipado da greve e se estão usando “métodos pacíficos” de manifestação. Depois, argumenta que o governo mantém diálogo abertos com os trabalhadores na mesa de negociação permanente.

Resta agora aos comandos locais acompanharem os desdobramentos, não permitindo que seja inaugurado o dedo-durismo por parte dos dirigentes da universidade. A ameaça de corte de ponto ou a sua efetivação, historicamente nas universidades só serviram para acirrar a luta. É esperar para ver. O governo federal insiste em mentir sobre “negociações permanentes”. Isso não é real. Negociação é quando as partes conversam e chegam a algum acordo. No caso do governo petista, a tal da mesa permanente está instalada desde Lula e nada avançou. Tudo o que os trabalhadores conquistaram foi nas greves.

A semana que vem deverá ser bem interessante.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

A gripe e o ônibus

aí está o vírus da gripe

Basta que cheguem os meses de inverno e já vem com eles a gripe. É batata. Ela aparece e contamina toda a gente. Quem está com a imunidade corporal em alta, pode resistir, mas os que estão mais fragilizados, não conseguem escapar. E, como a alimentação do brasileiro médio não é lá muito boa, o mais provável é que quando o vírus apareça, carregue para a cama milhares de criaturas.

A gripe é assim: transmitida por um vírus altamente contagioso, e sua propagação acontece sempre que alguém tosse ou espirra. As gotículas de secreção podem chegar até um metro. Daí que um dos lugares mais propícios para esse contágio é o ônibus.

Eu sinceramente não sei quem foi o inventor desse absurdo de fazer ônibus sem janela. Isso foi surgindo aos poucos e agora já quase não se consegue encontrar um carro sequer, no qual se possa abrir a janela para que entre o ar puro. São dezenas de pessoas espremidas num ambiente altamente contagioso, sem chance de escapar do maldito vírus. E o que é pior. Como ninguém nunca sabe se pegou um resfriado ou gripe, as pessoas saem de casa para trabalhar, para a escola e lá se vão, contaminando todo mundo.

Eu tenho sido a maior chata da paróquia na denúncia do ônibus sem janela. Sempre que viajo para outra cidade me deparo com o maldito. Chego ao posto da agencia nacional que faz a fiscalização e reclamo, escrevo longas cartas com argumentos sólidos e peço que a coisa muda. Ninguém me dá bola.

Agora a coisa passou do limite dos ônibus intermunicipais e interestaduais. Os coletivos urbanos estão entrando nessa onda de “modernidade”. O sofrimento é grande. Não bastasse a superlotação ainda tem mais essa. Potencial de contágio de gripe: 100%.

Nas duas últimas semanas eu peguei o maldito vírus. E, premida pelas urgências da luta, greve, atos, assembleias, compromissos militantes, fui pela vida espalhando o danado. Parece que ele sabe quando a gente está no ônibus. Vem aquela vontade louca de tossir e não dá para segurar. Mesmo tossindo dentro da bolsa eu creio que algum deles consiga fugir e pegar alguém.

O fato é que é que a parada da gripe é dura. Não há remédio para ela. Não há amparo. No posto de saúde a única receita é o paracetamol. E, para os mortais comuns, que não podem se dar ao luxo de ficar em casa repousando por uma semana só resta a triste tarefa de sofrer sozinha e ainda espalhar o vírus a outros pobres companheiros de desdita.

Quero registrar aos que infectei que não tenho culpa. Os ônibus não têm janela. O ar puro fugiu da nossa vida. A mim só resta pedir desculpas entre uma crise de tosse e outra. E que a gripe perca mais essa, embora eu não esteja me sentindo muito bem...

Trabalhadores da UFSC discutem redução de jornada: seis horas para atender 12


A luta pela redução da jornada de trabalho é histórica. Desde os primeiros tempos do capitalismo, quando o trabalho virou máquina de moer gente, essa batalha vem sendo dada. Na UFSC, a discussão pelas 30 horas, já garantida em lei, ainda segue se arrastando. Agora com a nova conformação de forças na reitoria os trabalhadores acreditam que essa polêmica terá um final. Por conta disso, aproveitaram a greve para juntar as pessoas num debate sobre o tema, contando com a presença da reitora Roselane Neckel. A atividade foi organizada por uma comissão de trabalhadores coordenada por João Sol e Gilberto Braga.

A proposta foi trazer as experiências de 30 horas que já se consolidaram em instâncias federais como o caso do Instituto Federal de Santa Catarina e a Universidade Federal do Paraná, mostrando que a questão já não está mais no âmbito da lei – visto que é legal – mas sim na decisão política. A redução de jornada pode acontecer em qualquer ambiente federal que tenha atendimento por mais de 12 horas. Ora, a universidade funciona em três turnos, logo, não há o que discutir. Basta que a reitoria encaminhe a decisão ao Conselho Universitário e a coisa se consolide. Essa luta vem sendo travada desde anos, passando pelos reitores Lúcio Botelho e Álvaro Prata, sem que nenhum deles desse consequência. A desculpa era sempre a mesma: não havia amparo legal. Mas, um estudo feito pelo advogado do Sintufsc, Guilherme Quernes – que serviu de amparo aos trabalhadores do IFSC e da UFPR – mostra claramente que não há qualquer impedimento. “Inclusive, se há interesse público a universidade deve aplicar a lei. E é óbvio que um setor aberto por 12 horas seguidas é muito melhor para o público”.

O representante do IFSC, Paulo Amorim, também deixou bem claro que a luta é política. Foi o que os trabalhadores do Instituto fizeram. Sabiam que havia amparo na lei e que só a mobilização garantiria que a direção implantasse o novo sistema de atendimento. Com os turnos divididos em seis horas, a comunidade teria muito mais tempo para resolver seus problemas. E assim, o sindicato mobilizou os trabalhadores e a luta se fez. Não foi coisa fácil e ainda há arestas a aparar, mas o novo horário já está em vigor. A mesma coisa aconteceu no Paraná, conforme o relato de Carla Cobalchini, do sindicato de trabalhadores. Foi a organização dos trabalhadores - a luta persistente - que garantiu a redução para as 30 horas. Segundo ela, também há coisas a acertar no documento que institui o novo horário, mas isso tudo deverá ser consequência da luta mesma. “Não há outro caminho que não o da luta”.

O representante da Fasubra, Gibran Ramos Jordão, trouxe o relato histórico das lutas dos trabalhadores lembrando que o primeiro de maio, celebrado mundialmente, é fruto da grande batalha pela redução de jornada travada pelos trabalhadores dos Estados Unidos. E essa luta acabou vencedora, apesar de muitos trabalhadores terem pagado com a vida. “Isso mostra que vem de longe essa batalha pelo tempo. E que o capital nunca está disposto a ceder”.

Mas, a desilusão do seminário veio por conta da ausência da reitora. No lugar dela veio a Secretária de Gestão de Pessoas, Neiva Aparecida Gasparetto, que, mesmo diante de toda a argumentação feita anteriormente, pediu paciência aos trabalhadores, porque a nova administração ainda estava fazendo os estudos, que não havia segurança jurídica, que era preciso fazer um mapa de dimensionamento. Frustração geral, visto que a redução para 30 horas foi promessa de campanha.

Assim, quando se abriu o debate, foi uma chuva de intervenções. Os trabalhadores argumentaram que, na UFSC, o tempo sempre foi uma moeda de barganha, um elemento de dominação. As velhas administrações usavam o tempo de trabalho para oferecer privilégios aos correligionários, “comprando” assim, os favores nas eleições. Não foi sem razão que quando a luta pelas seis horas começou, houve trabalhador que se colocou contra. Porque muitos deles fazem apenas quatro horas, atuando num único turno, de manhã, de tarde ou de noite. Também foi lembrado que a reitora eleita já foi dirigente de Centro e sabe muito bem dessa luta, logo, não haveria motivo para tanto desconhecimento e para um pedido de paciência. Como os trabalhadores da UFSC estão nessa batalha há tempo, eles sabem muito bem como resolver a questão. Qualquer trabalhador no seu setor de trabalho saberá como implantar o novo regime de horário. Inclusive, sempre foi proposta das gentes que os turnos fossem definidos em cada local, com o nome dos trabalhadores afixado à porta, garantindo assim um controle por parte da comunidade. Isso, por si só, já elimina a ideia de ponto eletrônico. Também as desculpas de que faltam trabalhadores carece de fundamento, pois o déficit de trabalhadores é estrutural e não será o turno reduzido que vai provocar mais problemas dos que já existem. Pelo contrário. Com as seis horas, os setores ficarão abertos inclusive no horário de almoço da maioria das gentes, permitindo assim uma otimização do tempo de quem precisa os serviços da UFSC.

O seminário, que teve uma audiência bastante expressiva, terminou com a certeza de que essa luta deve ser travada com toda a força pelos trabalhadores. Também foi percebido que as eternas “enrolações” sobre legalidade parecem fazer morada na nova administração. Mas, ao mesmo tempo, os trabalhadores esperam que as argumentações apresentadas cheguem ao conhecimento da reitora e que ela mude de posição. “A pergunta é: como é que a reitoria está distribuindo os novos trabalhadores pela universidade se ainda não há um mapa de dimensionamento? Isso não pode ser desculpa. Os trabalhadores sabem como fazer. É só aprovar e a coisa se faz!” É lutar para ver!

Fortalece a greve na UFSC




O movimento de greve na UFSC está diferente e isso se pode notar com uma simples espiada nas assembleias. Os novos trabalhadores, contratados nos últimos anos, aparecem em grandes grupos. Muitos deles foram militantes do movimento estudantil e isso só fortalece a luta. Outros, nunca colocados diante das lutas trabalhistas, percebem que só com a batalha firme podem chegar a garantir direitos. O cenário mudou.

Isso pode ser percebido na última assembleia quando um grupo de trabalhadores propôs o vale-almoço, argumentando que as pessoas ficam aqui o dia inteiro e precisam de um incentivo para permanecer no campus. Foram os trabalhadores mais jovens que se levantaram contra a proposta. Pagar para lutar? Financeirizar a greve? A discussão pegou fogo na assembleia e estabeleceu um divisor de águas. A proposta passou, mas o movimento fortaleceu com os trabalhadores mais novos definindo melhor seu campo de luta. Também é desse sangue novo que nascem as propostas de atividades da greve, coisa que já andava esquecida. Tem cine-pipoca, tem debate sobre carreira, as 30 horas, discussão sobre os espaços de decisão na UFSC. E em todos esses fóruns se percebe a presença maciça da juventude.

Na manhã de quinta-feira a universidade amanheceu fechada. Desde a madrugada o grupo do ato-surpresa fechou todas as entradas do campus e quando o sol apareceu – e com ele os seres-carro – a confusão começou. O entorno da UFSC é um caos cotidiano de trânsito porque boa parte dos professores, alunos e técnicos vêm de carro. E, com o trancamento das rótulas e passagens, não havia onde estacionar. Desde as sete horas os engarrafamentos aumentavam.

Com a ação do movimento também não foram poucos os conflitos. Pessoas há que precisam estacionar os carros na porta do local de trabalho, andar alguns passos, nem pensar... Sobram gritos, xingamentos, ameaças. Tudo como sempre foi. Os trabalhadores resistem com cantos, danças e café quentinho. A polícia chega, fica um pouco, observa, mas não intervêm. O dia promete ser longo.

Os trabalhadores da UFSC, novos e velhos, prometem manter a greve com muito gás, o que já é uma coisa boa demais. Quando tem atividade, debate, ação, as pessoas se sentem mais comprometidas e comparecem. A greve tem como pauta a arrumação do Plano de Cargos e Salários e a luta contra a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. É a velha luta do trabalho contra o capital. E, por esses dias, com muito mais beleza por conta da renovação dos trabalhadores. A universidade viveu quase 15 anos sem que entrassem novos trabalhadores para o quadro. Agora, a UFSC vive uma primavera. É coisa muito linda de ver.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Pensando na militância



Errico Malatesta é um italiano que fez história no campo do debate anarquista, sendo um de seus mais influentes pensadores. Ainda jovem, participou da Primeira Internacional em 1871 e por suas ideias e oratória inflamada acabou sendo um dos líderes do anarquismo, ajudando a organizar grupos nos lugares mais inauditos como Egito, Estados Unidos, Romênia, e América do Sul, além da Espanha e Itália. Naqueles dias ser um militante era enfrentar riscos, correr perigo. Assim, por ser um homem de pensamento e ação, Malatesta passou 10 anos preso, chegou a ser sentenciado à morte por três vezes seguidas e viveu no exílio por 35 anos. Sua prioridade era a organização dos trabalhadores. Acreditava que só esse grupo poderia fazer a revolução social necessária. Viveu intensamente, lutou intensamente e morreu de pneumonia, preso pelo regime fascista italiano. Malatesta viveu em outro tempo, no qual a luta era coisa da paixão. Malatesta choraria se soubesse que trabalhadores há que para fazer a luta precisam de “incentivos”, de preferência financeiros. Ah, esses dias tristes...

terça-feira, 3 de julho de 2012

Pedra do Urubu canta o Campeche


Campeche, espaço da cultura ilhoa, lugar de luta e de tradição. Na beira do mar, as canoas são ventres de peixe, que chegam aos milhares, pelas mãos dos pescadores do lugar. Quem é do Campeche aprendeu a se guiar no mar olhando para o morro do Lampião. Bem no alto, a pedra do urubu é como um farol. E, dali, as gentes podem abarcar a cidade inteira, numa visão de deslumbramento.

A pedra do urubu é o ponto mais alto da comunidade e serviu de inspiração para que um grupo de músicos começasse a cantar as coisas do lugar. A vida do Campeche e as coisas que o conformam viraram canções, sons, acordes, poemas. Assim nasceu a banda Pedra do Urubu, com a missão de universalizar aquilo que é mais singular no tradicional bairro do sul. A praia, o Bar do Chico, o morro do Lampião, a Lagoa da Chica, as gentes. E a música que vai nascendo torna-se hino e luta. Porque o povo do Campeche está sempre alerta com a proteção da natureza, dos bichos, das águas, dos seres.

Então, para quem quer conhecer a vida que vive na comunidade mais aguerrida dessa ilha, é só aportar no “Parada Roots”, um bar que fica na estrada geral do Rio Tavares, perto da Pedrita. Ali, nesse dia 07 de julho, a Banda Pedra do Urubu vai cantar o Campeche e as coisas bonitas que esse lugar tem. Depois das dez da noite é só somzera, som de raiz, meio açoriano, meio mané, meio gringo, tudo junto misturado. Um toque único, vibrando em uníssono, pelas mãos daqueles que escolheram esse espaço para viver. Pedra do Urubu, dez da noite, no Parada Roots, dia 07 de julho. Vale a pena arribar!

segunda-feira, 2 de julho de 2012

A Globo e os HUs



A rede Globo, dizem as boas línguas, entra na casa de 180 milhões de brasileiros. É quase a totalidade das gentes. E o programa Fantástico, nas noites de domingo também tem uma audiência cativa, de quase 70% destes 180 milhões. Não é pouca coisa. E, invariavelmente, como é comum na Globo, as informações são manipuladas, quando não mentirosas mesmo.

Foi o que vimos nessa noite de domingo do primeiro dia de julho. A reportagem da Globo realizou uma extensa matéria sobre os Hospitais Universitários. Pura ideologia e manipulação. A proposta era mostrar o caos na saúde pública, o que é muito louvável. E principalmente a situação dos Hospitais Universitários, que são referência em nível nacional em praticamente todos os estados onde existem. Isso também é fato, há uma precariedade e falta de funcionários. Há demora no atendimento e até mau atendimento. Até aí, tudo certo.

Depois de expor todos os problemas, o Fantástico mostra os protestos de alunos de medicina em alguns estados, exigindo melhorias. Também mostra as imagens feitas pelos alunos, denunciando o péssimo estado de alguns HUs. E, finalmente, para fechar , mostra a entrevista do presidente da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, dizendo que, agora, com essa nova empresa, as coisas vão mudar e os hospitais universitários voltarão a ter condições de atendimento, bons profissionais e serviço de qualidade.

Isso foi o que a maioria do povo brasileiro ficou sabendo: os hospitais são um horror, tá todo mundo indignado com isso, mas o governo, através dessa nova empresa, vai ajeitar tudo. As coisas ficarão bem. Certamente as famílias que se utilizam dos hospitais universitários – e não são poucas – suspiraram aliviadas. Que bom.

E é aí que está o engano, a mentira e a manipulação. Vamos aos fatos: É verdade que os hospitais universitários estão sucateados. Vivem há anos mendigando verbas, que não são liberadas. Também passaram mais de uma década sem contratação de novos funcionários e muitos deles acabaram terceirizando serviços, o que serviu para piorar ainda a situação. As contratações novas que aconteceram no governo Lula não foram suficientes para suprir tantos anos de esquecimento e segue havendo um déficit muito alto de pessoal.

A mentira: as manifestações nos HUs, que tem acontecido desde que os trabalhadores das universidades entraram em greve, são de denúncia desse caos, mas também são contra a EBSEHR, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, porque essa é uma empresa criada pelo governo, a qual ele chama de pública, mas que é de direito privado. Isso significa que a partir de agora a lógica de atendimento nos HUs será a das empresas privadas. Ou seja, doença vira mercadoria. Os hospitais terão de cumprir metas de produtividade. E o que é produtivo num hospital? Doença? A empresa também poderá contratar trabalhadores via CLT, o que significa criar mais uma categoria de trabalhadores nos HUs, esses fazendo as mesmas tarefas, mas tendo menos direitos que os trabalhadores públicos.
 
Assim, a entrevista da reportagem, que finaliza tudo, não por acaso é do presidente dessa empresa, a qual levou dos cofres públicos mais de cinco (5) bilhões de reais para ser constituída. Imaginem esse dinheiro todo indo para os HUs. Quanto bem não fariam? Mas não, o governo preferiu injetar recursos numa empresa de caráter privado. O mesmo de sempre. Os abutres que lucram com a dor humana ainda recebem dinheiro público, dessas mesmas gentes, para depois cobrar novamente pelo atendimento. Perversidade total.

A Globo, nessa noite de domingo, cumpriu mais uma vez seu papel de referendar qualquer governo. Não importa sua cor ou seu caráter. E o governo se utiliza – como sempre foi desde a sua criação – dessa empresa que consegue chegar aos lares de quase todos os brasileiros. Casamento perfeito para manter o povo enganado ou na esperança interminável de que “agora sim”, a coisa vai.

O fato é que o estrago está feito. Como desfazer essa ideia agora? Nós, com nossos panfletos, nossos atos públicos? Como chegar a essas 180 milhões de pessoas e dizer que tudo aquilo que eles viram no fantástico foi manipulação e mentira? Que os abraços nos HUs são abraços de luta. Em defesa do serviço público e não do serviço privado que essa empresa criada agora representa? Pois é! Tremendo desafio!

O que fica é a certeza de que o velho Brizola estava correto na sua incansável luta para tomar a Globo. As gentes precisam ter nas mãos o controle dos meios massivos de comunicação, para evitar que mentiras como a que foi escancarada ontem à noite, não repitam mais.