quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Todo apoio ao povo do Egito





Terríveis imagens do massacre que vitimou mais de mil pessoas no Egito (dados ainda não oficiais). Há pouco tempo, quando estive lá, conversando com as pessoas, elas estavam cheias de esperança. A maioria sabia que a Irmandade Muçulmana não era a melhor das opções, que havia ganhado as eleições por estar melhor organizada num país onde toda a possibilidade de organização tinha sido podada. Mas havia a vontade de avançar, de fazer do Egito um lugar de alegria, de paz, de felicidade. Havia o desejo de construir novas possibilidades, novos partidos, novas formas de organização. Com o golpe, as coisas se complicaram. Agora, o massacre de civis, a gente simples que estava se manifestando em favor do presidente deposto. A resposta dos milicos foi a violência e a morte.De novo, o Egito mergulha na escuridão. 


terça-feira, 13 de agosto de 2013

No Egito, a velha cidade de Alexandre, o grande







Na estrada que vai do Cairo até Alexandria tudo o que se vê por quilômetros é deserto. Mais perto da cidade começam as plantações de uva e já no perímetro urbano aparecem as chaminés, possivelmente relacionadas à exploração do gás natural. Sua orla mediterrânea, de mais de 30 quilômetros, é de uma beleza imensa. Impossível não vislumbrar, olhando para aquela imensidão azul, o mítico farol que guiou os barcos por mais de mil anos, uma das maravilhas construídas pelos gregos que dominaram a região. Ele não está mais lá, mas a aura encantada da beleza permanece.  A cidade, que leva o nome de Alexandre, até hoje vive da sua lembrança.

Os grandes períodos de ouro do Egito já tinham passado quando Alexandre chegou àquele pedaço de terra, em 332 a.C,  no centro norte do país. Quem tinha o domínio da região era o rei Persa Dário III. Na beira do mar restara apenas um povoado de pescadores chamado Rakotis. Mas, o lugar já era habitado desde há 3.000 a.C, quando levava o nome de Al Farma, e em 1.200 a. C. chegou a ter um porto, criado por Ramsés II. Depois, decaiu e foi sumindo. O espaço foi escolhido a dedo por Alexandre, depois de vencer os persas, por ser um lugar abrigado das variações do Nilo, embora perto o bastante para ligar o grande rio ao mar. Por isso Alexandre mandou reconstruir o porto, que foi uma das mais importantes ligações dos vários reinos do mundo antigo, recebendo navios de toda a orla mediterrânea e atlântica (África), além de Índia e China. Também ali foi construída a famosa biblioteca que reunia todo o saber do mundo da época e chegou a ter mais de cinco milhões de livros, cerca de 700 mil rolos de papiro. A proposta era ter no lugar um exemplar de cada manuscrito escrito sob a terra.

Alexandre teve pouco tempo para desfrutar da cidade que criou. Logo partiu para novas campanhas de guerra, deixando Alexandria sob os cuidados de seus comandados. Quando ele morreu, em 323 a.C, um de seus generais, Ptolomeu, decidiu coroar-se imperador, mas apesar de tudo, seguiu governando a cidade com espaço para a arte, a educação e a beleza, bem ao gosto de Alexandre, inaugurando uma dinastia, a dos Ptolomeus, que iria ser muito importante para o campo do conhecimento. Foi no seu reinado que a grande biblioteca foi criada. A cidade viveu então sua fase mais opulenta, com grandes palácios, museus, bibliotecas, praças, mercados, banhos e ginásios. Naquele período toda a região já tinha bem mais a cara grega que egípcia. Esses, os nativos, ficavam confinados a um pequeno bairro de pescadores, um dos mais pobres da cidade. A cidade tinha mais de 150 mil habitantes e era toda asfaltada com basalto negro.

O sucessor de Ptolomeu I, o II, que governou o Egito de 285 a.C a 246 a.C, foi mais um dos grande incentivadores do saber. Tanto que a Escola de Alexandria, fundada pelo seu antecessor, chegou a ser um dos mais importantes centros de conhecimento do mundo. É a ele também que se atribui a construção do famoso farol, visto como uma das maravilhas daquele tempo, iluminando o mar por mais de mil anos, de 280 a.C até 1320, quando foi destruído. A cidade só vai perder o seu fulgor quando, sob o reinado de Cleópatra (a última da linhagem dos Ptolomeus), cai nas mãos dos romanos em 46 a.C.  

Essa também é outra história que produz todo o encantamento da cidade de Alexandria. Foi bem ali que Cleópatra aprisionou o coração do conquistador Júlio César e depois o de Marco Antônio, até a derrocada final, dela mesma e do Egito.

É por isso que quando se anda pelas ruas da cidade é possível sentir do peso dessa história milenar. Fora da região central e da orla, Alexandria parece uma grande escavação a céu aberto. Até hoje ninguém encontrou o corpo da mítica rainha, e sabe-se que a cidade tem sob seus pés outras centenas de cidades, monumentos e templos ainda por serem encontrados. Os arqueólogos e pesquisadores estão por toda a parte e em cada virada de esquina pode-se dar de cara com um entulho. Não é sujeira, é trabalho de arqueologia. Dizem os moradores que bem embaixo de onde está erguida a cidade nova existem palácios e infinitas riquezas. Até mesmo o corpo de Alexandre, o fundador da cidade, há quem diga que está ali. A cidade é envolta em beleza e mistério.

Na beira do mar está construída a nova biblioteca, terminada em 2002, que é gigante, embora não chegue aos pés da criada pelos Ptolomeus. Tem quatro bibliotecas especializadas, laboratórios, planetário, 200 salas de estudos, museu de ciências e de caligrafia, além de uma biblioteca cibernética. Ali estão mais e dez mil livros raros, cem mil manuscritos, 300 mil publicações periódicas, 200 mil cassetes de áudio, 50 mil vídeos e quatro milhões de livros. O prédio tem uma arquitetura moderna e impressionante. Bem na frente, uma cabeça de Alexandre em mármore homenageia o fundador da cidade. Na parede da frente estão gravadas as letras de todos os alfabetos das civilizações antigas e modernas numa tentativa de recuperar a ideia dos seus criadores: reunir todo o conhecimento do mundo. Isso ainda está longe de acontecer já que bibliotecas como a do Congresso dos EUA e da França tem muito mais livros do que ali, mas o certo é que o fato de saber que a cidade de Alexandria já abrigou praticamente todo o conhecimento do mundo antigo dá um peso quase mítico ao prédio.

De noite, quando o vento sopra forte na beira do mar, e as luzes vão marcando a orla, a gente volta os olhos para o infinito e se perde nas redes da história. Sussurram os antigos egípcios, Alexandre, Cleópatra e, mesmo sem querer, a gente se transporta para aquele tempo tão longe. Na vida real, da Alexandria moderna, os egípcios seguem com sua lida diária, trabalhando, procurando o passado, tentando construir um país novo. No caminho da orla é surpreendente como convivem ainda casas velhíssimas com grandes mansões, prédios moderno com antigos e corroídos prédios de apartamentos onde a classe trabalhadora se espreme. Mas, segundo dizem, essa mistura está perto de acabar. A região perto do mar vai sendo cada vez mais especulada e muitos dão como certo que os pobres acabarão expulsos. Há que acompanhar o desenrolar dessa história porque afinal, o Egito é essa turbulência, essa beleza, esse mundo em revolução.