quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

Sem caminhos para Gaza



Terminei de ler o livro "Sem caminhos para Gaza", de Renatho Costa (professor da Unipampa), Rodrigo Campos (documentarista) e Lucas Bonatto Diaz (músico). É um retrato sem retoques da jornada de 20 longos dias que eles viveram tentando chegar à Palestina para gravar um documentário. O destino era Gaza e eles optaram por fazer o caminho pelo Egito, já que a tentativa feita de entrar por Israel não deu resultado. A troca de emails com a embaixada de Israel beira o surreal. Não basta ao Estado sionista ter invadido o território dos palestinos e os aprisionado atrás de muros e cordões de arame farpado, também é preciso impedir que outras pessoas entrem, evitando assim que a realidade apareça sob o sol.  

A equipe então começou as tratativas com o Egito, visto que Gaza está há poucos quilômetros da fronteira. A ideia então era chegar ao Cairo e dali seguir até a fronteira e cruzar para Gaza. Todos os vistos foram providenciados com antecedência. Mas, uma coisa é o que diz a burocracia, outra o que acontece realmente quando se está em um país estrangeiro, sem falar a língua local e onde as regras mudam conforme o humor dos burocratas e militares de plantão. A odisséia dos três documentaristas é tão extraoridinária que definitivamente foi preciso que virasse livro. 

Foram 20 dias no Egito, chegando muito perto de passar para o lado palestino, mas, ao fim, não foi possível. O Egito obviamente faz parte do cordão de isolamento formado por Israel para impedir que as pessoas entrem na Palestina e tudo é feito para dificultar, ainda mais quando os visitantes têm câmeras na mão. 

A descrição de todas as peripécias para chegar à Gaza, incluindo aí até a internação hospitalar de um dos integrantes da equipe motivada por um AVC, é impactante e nos carrega sofregamente até o fim. O livro, por conta da descrição detalhada de todas as vicissitudes dos autores, vai além disso, porque consegue mostrar com profunda claridade a tragédia que é a vida dos palestinos na fronteira com o Egito, eles também impedidos de ir e vir, passando por humilhações das mais diversas. 

Sem tempo, sem dinheiro, estressados ao máximo, os três documentaristas tiveram de voltar para casa sem conseguir chegar ao destino. Mas, ao colocarem à luz todo o processo que viveram, acabam desvelando a dolorosa realidade de um povo aprisionado e bloqueado, impedido até de receber visita, o que viola todos os códigos de direitos humanos. Ainda assim, Israel segue sendo apoiado no mundo todo, inclusive sendo o maior aliado dos EUA, que vivem fazendo cruzadas de defesa dos Direitos Humanos, acusando Venezuela, Cuba, Coréia e outros que não se alinham com sua política. 

A Palestina é um campo de concentração. Ler esse livro é um soco no estômago, necessário e urgente. 

O trabalho foi editado e publicado pelo Monitor do Oriente Médio. Vale a pena ler. 

terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

Dos horrores do capitalismo

Um homem foi queimado vivo na Beira-Mar (morada dos ricos) em Florianópolis. Estava rolando uma festa ali, mas ninguém viu. O homem era pobre e preto. A mídia diz que ele tinha passagem pela polícia, como se isso justificasse. O horror. Ele lembra que ouviu risos. Ou seja, quem ateou fogo nele, riu, achou engraçado. E foi embora, certo da impunidade. A polícia não sabe de nada, não tem imagens no local (coisa bem estranha, visto que é a região mais nobre da ilha) e chegou a pensar que ele tinha sumido do hospital, aparentemente sem se importar muito. 

Um velho morreu congelado em Paris, França, num bairro elegante.  Sentiu-se mal, caiu no chão e ninguém, absolutamente ninguém, se importou de ver o que estava acontecendo. Era uma noite fria, de inverno. Ele ficou ali caído por nove horas e a primeira pessoa que se acercou dele pra ver se estava vivo foi um morador de rua. Provavelmente as pessoas que passaram por ele acharam que era um bêbado ou um homem da rua e, isso, por si só, era uma indicação de que deveria ser deixado ali. Quando na manhã seguinte soube-se que era um fotógrafo famoso, a comoção foi grande. Teria sido se fosse só um andarilho? Com certeza não. 

Um garoto de 24 anos, pobre e preto, foi espancado, amarrado, e espancado de novo, por ter ido cobrar seu salário do dono de um quiosque no Rio de Janeiro. Se alguém viu o horror, não se manifestou. E cerca de cinco caras mataram o jovem africano porque ele ousou pedir o que lhe era direito.  

Essas são cenas de horror que acontecem praticamente todos os dias em quase todos os lugares do mundo onde impera o capitalismo. Porque neste modo de produção, no qual a exploração do outro é base, há uma completa falta de preocupação com o pobre, o caído, o oprimido, o trabalhador. Não há empatia, não há comprometimento. No geral as pessoas preferem não se envolver. Se está apanhando, alguma coisa fez! Se está aí no chão, boa coisa não é. Se foi queimado é porque estava incomodando.  É o que a maioria pensa. 

Para nós, que nos horrorizamos, é sempre importante lembrar o óbvio: as saídas não são individuais. A saída é coletiva. Para que isso não mais aconteça há que mudar a maneira como a sociedade se organiza. Por isso que a única forma de acabar com essas tragédias é a construção de um modo de vida no qual a cooperação, a solidariedade e a justiça existam de verdade. É necessário que venha o socialismo e depois o comunismo. Claro que ainda acontecerão tragédias, é do humano, mas, certamente não será algo cotidiano como é hoje no mundo capitalista. Disso eu tenho a mais absoluta certeza.

Queria que todos pudessem ter essa certeza também e, desde aí, construir esse mundo novo, a partir da revolução. Afinal, apenas chorar não resolve...