quinta-feira, 22 de março de 2012

Prefeitura não escuta a cidade

Já muito bem definiu o filósofo Enrique Dussel sobre o que seja comunidade: são as forças que atuam de maneira consciente na vida local. Nesse sentido, a comunidade de Florianópolis, desde os anos 80, decidiu, coletivamente, que tipo de cidade quer para viver. Ao longo desse tempo as forças vivas da comunidade vêm se reunindo, discutindo e construindo essa cidade desejada. Cada bairro, cada região, já desenhou a cara do seu lugar. E isso ficou ainda mais claro no Plano Diretor Participativo montado de forma “legal” (com audiências públicas e tudo mais) desde há seis anos. Mas, mesmo assim, os governantes municipais insistem em tripudiar e desconhecer a vontade popular. Como os desejos da comunidade não bateram com a proposta empresarial/governamental eles fizeram o que sempre fazem: encerraram o diálogo e construíram outro Plano Diretor, feito por uma empresa, sem levar em conta as incontáveis noites e finais de semanas despendidos pelas gentes no debate do Plano Participativo. Em 2010, depois de uma quase revolta popular, a prefeitura decidiu parar a discussão e tudo foi zerado.
Agora, em 2012, às portas de mais uma eleição municipal, a prefeitura volta à carga e quer aprovar o Plano Diretor que diz ser participativo. Mas, de novo, não quer saber das decisões populares. Insiste no seu projeto “empreendedor”, que consiste em tornar a cidade de Florianópolis uma espécie de Dubai, com um adensamento populacional bem ao gosto das empreiteiras, senhoras do cimento e da destruição ambiental. A ideia é fazer do que hoje ainda é um paraíso natural, uma selva de edifícios.
Na última reunião do Núcleo Gestor Municipal, agora em março, que visava retomar o processo interrompido, os representantes das comunidades foram surpreendidos com a apresentação de uma proposta que vai contra todas as diretrizes aprovadas nas intermináveis reuniões do Plano Participativo. Segundo nota divulgada pelos representantes do Núcleo Distrital do Campeche, na proposta apresentada pela prefeitura há uma radical discordância com o que foi elaborado pelas comunidades. No caso do Campeche, por exemplo, não estão contemplados os condicionantes ambientais legais que delimitam o adensamento populacional, e muito menos os limitadores decorrentes da área de proteção e de ruído do aeroporto de Florianópolis na definição das áreas edificáveis. Ou seja, o mapa construído pela comunidade no PDP (Plano Diretor Participativo) não foi levado em conta. “Não vamos aceitar isso e exigimos, uma vez mais, a absoluta prioridade da apresentação do mapa com os rebatimentos dos condicionantes legais para dar continuidade ao processo de elaboração do plano”, diz o documento apresentado ontem no Núcleo Municipal.
Segundo os representantes do Campeche, o projeto que a prefeitura insiste em reapresentar sustenta um modelo de cidade que induz ao crescimento populacional, contra a quase unânime proposta constituída nas diversas comunidades da cidade, de optar por um modelo de cidade baseado no respeito à capacidade dos recursos naturais disponíveis, no estimulo à preservação ambiental e à qualidade de vida. Isso significa que a comunidade de Florianópolis não quer esse modelo de crescimento a toda prova e, nas reuniões que duraram mais de quatro anos, definiu e estabeleceu critérios urbanísticos na direção de uma “cidade lenta”, com a preservação das tradições culturais locais e de uma forma de viver que é a que faz desse lugar um espaço atrativo para os tão desejados “turistas”. É a beleza natural assim como a cultura original deste lugar que o faz cobiçado e apreciado. E é o que as comunidades querem defender. Tripudiando desse desejo o plano da prefeitura chega a chamar de “ação deflagrante de desenvolvimento” o esperado Parque Cultural do Campeche, totalmente contrário ao que a comunidade construiu. Ninguém no bairro quer o “desenvolvimento” que destrói a vida e a cultura em nome dos prédios nas dunas e da imobilidade nas ruas. O parque tem outra concepção.
O fato é que o projeto que a prefeitura quer empurrar goela abaixo é um mosaico “monstruoso” no entendimento da maioria das comunidades de Florianópolis. A proposta de cidade desenhada pela prefeitura é a da destruição, dos carros, da falta de mobilidade, do cimento, do asfalto, da homogeneização da vida ao gosto de um “turista cosmopolita” que não quer ter contato com a cultura ou a vida real. Esse projeto já foi rejeitado pelas forças vivas que atuam nas comunidades e que fizeram o plano participativo. Por conta disso, os representantes do Campeche acreditam que esse plano da prefeitura não tem legitimidade para ser apresentado no dia 27 de março, como vem sendo anunciado pela imprensa, como um plano discutido e aprovado pelas comunidades. “Se tal apresentação é mantida, a revelia do aval do Núcleo Gestor Municipal, a equipe técnica deve fazer público o fato de que tal proposta não é proposta avalizada pelo NGM e que se trata apenas de um esboço de proposta elaborada pela equipe técnica da Prefeitura Municipal de Florianópolis”, diz o documento do Núcleo do Campeche, também endossado pelos representantes do Pântano do Sul.
O que se espera é que a prefeitura deixe de ser surda aos desejos das gentes e, de uma vez por todas, incorpore o projeto criado e desenhado pelas comunidades, aceitando a decisão tomada sobre como a cidade deve ser. Um lugar onde caibam todos e não só alguns e no qual também todos possam ter acesso à cidade e as suas belezas.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Helena da UFSC


Ela é uma mulher gigante, no tamanho e na dedicação a causa dos trabalhadores. Durante os anos 80, quando os trabalhadores públicos ainda eram impedidos de ter um sindicato, ela foi incansável na disputa pela então associação, que reunia os trabalhadores da UFSC, mas apenas atuava na área social e recreativa. Ela não estava sozinha nessa luta, é verdade. Muitos eram os companheiros e companheiras que pensavam, conspiravam, sonhavam e lutavam. Mas, de certa forma, pelo seu jeito atrevido, destemido e valente, ela acabou incorporando a liderança do grupo.

Depois de muito tempo na batalha, o grupo ao qual pertencia tomou a associação e foi sob sua liderança que os trabalhadores caminharam para a construção do Sindicato dos Trabalhadores da UFSC, o Sintufsc, que mais tarde acabou sendo a porta por onde entraram as mais importantes conquistas dos trabalhadores desta universidade.

Helena não gosta que digam que ela é importante, que fez história na UFSC. Mas, o fato é que ela fez e ainda faz. Lembro como se fosse hoje uma cena épica que presenciei pouco tempo depois que entrei na UFSC como trabalhadora concursada, e que me fez assumir a luta junto com o grupo ao qual ela pertencia. Era uma das tantas greves que já fizemos. Havia a proposta de ocupar a reitoria. Os trabalhadores estavam ali, no hall, temerosos, indecisos. Então, Helena, com aquele seu jeito duro, pegou o microfone e vaticinou: ”vamos entrar e é agora”. Então, largou o microfone e se dirigiu para a entrada da reitoria. Ninguém mais pestanejou. Em um segundo lá estavam todos os trabalhadores subindo atrás dela. Isso é liderança. E isso ninguém pode negar.

É por essas e outras que Helena foi lembrada pelo vereador Lino Perez para receber uma medalha de Honra e Mérito que é oferecida no dia do aniversário da cidade.
Porque num dado momento da história dos trabalhadores da UFSC, ela personificou toda a luta da categoria. Não é um prêmio à pessoa, não é um culto individual. É a homenagem a uma mulher que, durante anos a fio, dedicou sua vida a ser aquela que comandava as batalhas. Isso não significa que os companheiros e companheiras que, coletivamente, construíram essa luta, não sejam importantes. Todos são, e todos, na verdade, estarão recebendo essa homenagem no dia 23, Dia de Florianópolis.

Cada trabalhador que pintou cartazes, carregou mesas do RU, bramiu bandeiras, fez caminhada, ocupou reitoria, dormiu nos acampamentos, encheu balão, fez piquete, fez comida, participou de assembléia, enfim, cada um de nós, estará recebendo essa homenagem proposta pelo vereador Lino (que é professor da UFSC). Porque todos nós, os que lutamos, constituímos a história dessa universidade. Helena nos representa, como sempre fez, ao longo de toda sua vida na UFSC.

Assim que no dia 23, às 20h, no Auditório do Tribunal de Justiça, ela estará recebendo a medalha de honra. Porque fez por merecer. Porque é bom que nossos companheiros e companheiras de luta também sejam lembrados por essa burguesia que domina a cidade. Helena estará lá, gigante como sempre, mostrando que a despeito de tudo o que o poder faz para envilecer os trabalhadores, eles não desistem, não se entregam e não deixam nunca de lutar. Com ela, estaremos todos nós, seus companheiros. Parabéns para Helena, que não é a de Tróia, mas que também traz a guerra, quando ela é necessária contra os vilões do amor.

Conselho Universitário barra especulação


Texto de Manoel Arriaga

Caros amigos de luta,
O dia de hoje (19.03) tem um sabor muito especial como já tivemos outros na nossa história política deste grupo. É um grande dia pois conseguimos com nossa participação de coletivo, juntamente com outras forças da UFSC, impedir que nossa universidade se curvasse aos fortes interesses econômicos e políticos dominantes na cidade.
A aprovação do parecer (construído coletivamente) apresentado no CUN, rejeitando a cessão do terreno da UFSC para a execução de mais um atentado urbanístico em Florianópolis, foi uma votória arrasadora das forças políticas progressistas e dos movimentos sociais desta cidade. Barramos a passagem do automóvel para liberar a passagem da população com qualidade de vida, barramos o interesse imobiliário para preservação da vida comunitária, barramos os acordos políticos espúreos para reunir, numa luta vitoriosa e democrática, uma parte significativa da sociedade que rejeita os métodos e propostas deste "desgoverno" florianopolitano.
Com base nesta decisão, a UFSC abriu mais uma ferida nesta estrutura dominante, atrasada e mesquinha da cidade e abriu um campo enorme de debates para a recuperação da sua imagem frente a sociedade, transformando o caráter mercantilista de suas relações externas em uma relação baseada na ética, na produção científica de interesse social e, mais que isto, em uma relação onde as estruturas burocratizadas internas poderão ser transformadas para torná-las democráticas, transparentes e progressistas aos olhos de todos.
Espero que possamos continuar em nossa luta para transformar esta universidade, torná-la autônoma, participativa, igualitária em suas instâncias, com priorização do caráter social de suas atividades, com controle social de suas atividades e finanças e em defesa da organização e luta dos trabalhadores universitários e estudantes.

Este momento de mudança de gestão da UFSC me parece muito especial. Nunca tivemos uma oportunidade como esta de dar um salto de transformação política, acadêmica e administrativa. Mas isto só virá, como demonstrado hoje no CUN, se houver um movimento forte da comunidade universitária para as mudanças necessárias, não só nas lutas trabalhistas mas tambem nas lutas pelo controle social deste processo, ou seja, depende de nossa disposição de construir isto de forma coletiva. Sabemos que o caminho pode ser longo e difícil mas as transformações tambem precisam ser duradouras e não por uma só gestão.
Parabéns a todos,

terça-feira, 20 de março de 2012

Derlei de Luca fala sobre a Comissão da Verdade

O Coletivo Catarinense Memória, Verdade e Justiça e o Memorial de Direitos Humanos da UFSC convidam para o seminário “Assassinados pela ditadura: Santa Catarina”. O objetivo do evento é provocar o debate sobre o direito à memória histórica e também sobre a busca da verdade a respeito dos mortos e desaparecidos no período da ditadura militar. O momento é oportuno para a realização deste seminário, tendo em vista a aprovação da Lei Federal que criou a Comissão da Verdade e a necessidade de mobilizar iniciativas a nível estadual que acompanhem esse movimento, bem como criar o Memorial de Santa Catarina, conforme Lei aprovada na Assembleia Legislativa em março de 2012.


Palestrantes: Prof. Dr. Fernando Ponte de Sousa (MDH/UFSC); Prof. Ms. Luiz Fernando Assunção (UNASP, autor do livro “Assassinados pela ditadura: Santa Catarina”); Dr. Márcio Vettorazzi (presidente da Comissão da Verdade da OAB/SC); Procurador Dr. Mauricio Pessutto (representante do Ministério Público Federal).
O seminário é aberto à comunidade acadêmica e ao público em geral.

Local: Auditório do Centro de Filosofia e Ciências Humanas – UFSC, Florianópolis
Data: 21 de março (quarta-feira)
Horário: 19 horas

Veja entrevista com Derlei de Luca