quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Feliz despertar...

As celebrações de um novo começo na vida das gentes são tão antigas quanto a própria raça. Nas culturas mais remotas o “recomeço” era celebrado sempre no solstício ou equinócio de primavera (dependendo do hemisfério), quando tudo começa outra vez a florir. É que como o conceito de tempo ainda não havia sido aprisionado nos relógios a vida das comunidades se regia pelas estações. Naqueles dias, o povo se reunia em festivais, cantando, dançando e bebendo em honra da terra. As mulheres engravidavam e a vida florescia. Era a completude do ciclo da existência, sempre se repetindo.

De qualquer forma, na medida em que as culturas foram se complexificando, igualmente encontraram formas de medir o tempo. Os maias, por exemplo, lograram construir um intrincado calendário com 364 dias, e mais um outro, chamado de “dia fora do tempo”. Este, celebrado em 25 de julho, marca o início do novo ciclo. Já nas culturas do médio oriente, a festa era no equinócio de março, por conta da estação. A comunidade judaica comemora sua festa de Ano Novo, ou Rosh Hashaná, uma espécie de dia do julgamento, em meados de setembro ou no início de outubro, onde as pessoas fazem um balanço da vida. Os islâmicos celebram em maio, contando o tempo a partir do aniversário da saída do profeta Maomé de Meca para Medina, a Hégira, cujo marco corresponde ao 622 da era cristã.

Na China, o “recomeço” é celebrado em datas nem sempre fixas, mas entre final de janeiro e início de fevereiro. Lá, o calendário está relacionado ao movimento da lua e conta cada mês como o mês de um dos 12 animais que se apresentaram na frente de Buda e o ciclo da vida segue esta dinâmica, sempre começando na primavera.

O mundo ocidental também institui o seu “recomeço” a partir de um deus, que não é o cristão. Foi o imperador Julio César, no ano 46 antes de cristo, que determinou o primeiro de janeiro como o dia do início do ano, em homenagem a Jano, o cuidador dos portões. Depois, mais tarde, com a oficialização do calendário gregoriano, esta data permaneceu. Os franceses deram o toque romântico chamando-o de réveillon, que vem do verbo réveiller, cujo significado é "despertar".

E assim as gentes escolhem seus momentos de despertar, de balanço, de julgamento de suas vidas. Vemos que tudo depende da cultura onde se está inserido embora a idéia seja sempre a mesma: recomeçar, jogar fora o que foi ruim, esquecer, olvidar. Começar de novo, dar-se novas chances. E assim, vai avançando a raça, buscando aquilo que os filósofos gregos insitiram em chamar de “felicidade”. Pois eu, que reverencio a terra, os animais, as forças da natureza, que amo Jesus, Maomé e Buda, também vou comemorar. Que venha mais um ciclo, e que seja bom. Que floresça a vida, o amor e a paz. E que todos os povos possam vibrar na mesma onda cósmica. Eu te convido a dançar nesta bela noite de lua cheia, com os deuses e deusas, sob as estrelas. Para receber o ano novo, recomeçar... despertar! Ah, quanta bênção em se viver neste grande grande jardim!

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Mais-valia ideológica no ônibus


O pensador venezuelano Ludovico Silva desenvolveu um conceito perfeito para a televisão: mais-valia ideológica. Ele diz que o sistema capitalista, não satisfeito em sugar mais valia do trabalhador no seu local de trabalho, ainda suga a mais-valia ideológica quando ele pensa que está descansando diante de sua televisão. Na verdade, diz Ludovico, a pessoa diante da TV não está fruindo, curtindo ou descansando. Não! Está sendo inundada pelos apelos do sistema: compre isso, compre aquilo, siga as regras do natal, seja assim, vista aquilo. Prisioneira, então, da mais-valia ideológica.

Pois agora, a gente que vive sob o terror do transporte coletivo de Florianópolis, tampouco consegue se desconectar da mais-valia ideológica. Não bastasse todo o estresse de ficar nas insuportáveis filas que se formam ao longo do caminho nestes dias de verão de uma cidade turística que não tem estrutura, ainda temos de aturar uma espécie de televisão dentro do ônibus. Ali, enquanto as gentes bufam de calor e ódio, ficam passando propagandas: compre isso, compre aquilo, tal pré-vestibular é melhor. Vez em quando entra uma notícia sobre algum famoso e depois uma vídeocassetada. Um verdadeiro atentado à inteligência e à paciência. Pergunto-me, onde está o Ministério Público que não vê isso? Será possível que ninguém se importe que as pessoas sejam submetidas a esses abusos? O que pode fazer uma pessoa comum diante deste descalabro?

Ah, mas não é só isso não. Tem mais. Como o transporte é completamente desintegrado, a gente fica muito tempo sentado nos terminais de baldeação, esperando o terceiro ônibus que finalmente nos deixará em casa. E ali, por toda a parte estão as televisões com os quadros de horários. A gente fica olhando para ver quando vai sair o maldito ônibus e o quadro não vem. O que passam são propagandas, propagandas e propagandas. Infernal. Mas não é desrespeito não. É a mais-valia ideológica levada às últimas conseqüências.Uma verdadeira lavagem cerebral.

Outro dia vi uma informação de que em São Paulo já existem grupos contra isso. Bom,vou fazer a luta por aqui, mesmo o rebanho ache bom esse tipo de coisa. Odeio que me suguem a alma.


segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

SUS: um bom plano para quem não está doente


Insisto no SUS. Acredito nele. Sei que é um dos melhores planos do mundo, embora a maneira como vem sendo administrado possa colocar tudo a perder. Quando não se está doente serve muito bem. A gente vai ao posto de saúde, aguarda na fila, é certo. Mas, de um jeito ou outro se consegue a consulta para os exames de rotina e é possível fazer um bom acompanhamento da saúde. Os médicos de família são bons, as agentes visitam as casas, tudo certo.

Mas, a coisa estraga quando a gente fica doente. Como já não há mais diagnóstico sem exames, a pessoa corre o risco de morrer até que consiga um resultado. É o que passei neste final de ano infernal. De repente, me apareceu uma bola no pescoço. Pirei. Pronto, deve ser uma baita infecção. Fui ao posto. Médica olha, apalpa. Hum! Não parece grave. Vamos aguardar. Espera mais uma semana, aparecem outras bolas. Agora é a morte.

Estamos perto do natal. Febre, dor de cabeça, delírios. Não dá mais. Vou à Policlínica, na emergência. Médica olha. “Hum... Parece grave, mas tem que ir ao posto”. Toca a pegar outro ônibus, meio grogue, mas vamos lá. Chega ao posto, outra médica. “É pode ser toxo ou câncer no sangue. Mais pra toxo, mas vamos fazer um exame para confirmar. Enquanto isso, toma um antiinflamatório para aliviar a dor”. Lá vou eu marcar o exame. “Só depois do natal, tudo fecha amanhã”. Ah, tá!

Passa o natal e eu mergulhada na febre e na dor. Danação. Ir à emergência, nem pensar. Sem resultado de exame é perda de tempo. Passam os dias. Segunda-feira. Uff... Lá vou eu fazer o exame. “Moça, eu tô mal mesmo, será que dá para agilizar aí o resultado”. “Olha, é difícil, vem aí o ano novo, só lá pelo dia 4”. “Mas eu tô há três semanas me danando toda...” “É, mas não posso fazer nada. Só depois do dia 4”. E lá vou eu, outra vez, pegar o ônibus, meio aturdida. Uma semana mais de sofrimento. Entrando 2010 muuuuito bem. E assim é. Só no dia 4, isso se ainda houver vida para buscar o resultado. Enquanto isso, na UNIMED...