sábado, 23 de abril de 2011

Dário aumentou, estudante gritou

Veja o vídeo da primeira manifestação do ano em Florianópolis, contra as altas tarifas, pela Tarifa Zero.


Uma cidade para se estar



A cidade deveria existir para as pessoas. Ser lugar de encontro, de contemplação, espaço de partilha generosa e cooperativa. Mas, o que se vê, hoje, é que a cidade é só um lugar onde se passa. Não há tempo para se deixar ficar. É a cidade capitalista, sem qualquer humanidade. Florianópolis é assim. Lugar de carros, de gente que cruza apressada em direção a algum centro de compras. Nas duas principais ruas do centro, que viraram calçadão, a vida se mostra, em riqueza. Mas quase não se pode ver. Porque ali é o espaço da pressa, da ligeireza, da azáfama da compra, do grande afã pelo nada a ver.


Até há alguns anos ainda havia a possibilidade de a gente ficar sentada no Ponto Chic, quando existiam aquelas mesinhas de lata vermelha. Tomava-se uma cerveja, lia-se um livro e ficava-se a observar a correria desenfreada dos “consumidores”. Hoje não há nem isso. Nas ruas do centro há dois bancos em frente ao insuportável Mc Donalds, umas poucas mesas em frente ao Bobs, e pronto. E são lugares para o consumo, alienígenas. Nenhum espaço para descansar ou simplesmente ficar a olhar o movimento. Pois eu reivindico bancos nas ruas.


Outro dia estive em Montevidéu e o que vi me deixou pasmada. Por todas as principais ruas do centro abundam os bancos. Estão em toda a extensão da via. E, as pessoas podem ficar por ali, sentadas, sentindo a brisa, tomando sol, sorvendo o chimarrão, ou apenas olhando a vida passar. No final da tarde vêem-se famílias inteiras sentadas nos bancos enquanto a cidade segue o seu ritmo. As pessoas compram coisas, mas também se deixam ficar. É uma outra cadência. A vida não é um frenético comprar. E isso transparece também nas bancas da Praça da Matriz, nas quais pessoas mais velhas vendem coisas antigas. Colheres de prata, baixelas da década de 30, coisas sem nenhuma serventia, objetos de arte.


E aquilo ali é um adorável e tranqüilo mercado, no qual os que vendem e os que compram se conhecem. As pessoas se demoram vasculhando bugigangas em meio a uma imensidão de coisinhas, bibelôs, tralhas e belezas. A vida é lenta sob a fresca das árvores. Um sorvete, um descanso no banco. A cidade de Montevidéu é uma cidade para se viver.


De volta a minha amada Florianópolis era isso que eu queria ver. De novo os artesãos lá na Praça XV, como antes, tocando suas flautas, com seus badulaques e a gente rodando a praça mil vezes, olhando, tocando, sentindo, cheirando. Queria que pudessem existir bancos por toda a extensão da Felipe e da Conselheiro. Para que a gente pudesse ficar, a larga, observando a vida passar no corre-corre do dia. Lugares para simplesmente estar, sem a obrigação de consumir. Espaços de vivência, de esperas, de lentidão.


Eu reivindico uma cidade que tenha bancos esparramados pelas ruas, e árvores frutíferas, e sombras, e música. Uma cidade para as pessoas!

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Nossa ilha na telona

Estreia no dia 29, em todos os cinemas de Florianópolis, o filme do Zeca Pires, A Antropóloga. Mostra um pouco da cultura local com as bruxas, as benzederias, o canal, os pescadores. Imperdível... No elenco o querido amigo e grande ator, Eduardo Bolina. Vale a pena ver...Olha o gostinho bom deste "pedacinho"....



terça-feira, 19 de abril de 2011

Mudanças de trânsito na UFSC


Uma equipe de professores da UFSC apresentou há poucas semanas o seu plano para o trânsito no entorno da universidade. Isso tudo porque é cada dia mais difícil chegar ou sair da UFSC. Os caminhos que vem da região da Costeira, tanto a subida pela Capitão Romualdo como pela Edu Vieira são totalmente trancados. O motivo não é outro senão o número de carros. Carros demais. De manhã é assim. Na ida para a UFSC as duas vias estão engarrafadas. No final da tarde igualmente.



Pois a proposta de solução para o problema é tornar a Edu Vieira uma via de duas pistas, só de ida, e a Capitão Romualdo com as duas pistas só de vinda. Mão única. Sinceramente, não vejo como isso pode melhorar o trânsito. O fluxo que hoje se move devagar em direção a UFSC vai seguir igualzinho em duas vias. Não há diferença nenhum, a não ser que a fila ficará lado a lado e não em vias diferentes. Mas que idéia de jerico é essa?


Como se não bastasse isso, ainda tem mais. A idéia é fechar totalmente o campus da UFSC para os ônibus. Nenhum mais entraria. Segundo o professor que explicou a proposta: “não há sentido nenhum em os ônibus entrarem na UFSC”. Ora, é claro que o senhor em questão não deve usar o ônibus. Hoje, já é um parto pegar ônibus na UFSC, principalmente a noite, porque, dependendo a rota, a pessoa precisa atravessar o campus. Imagine que a criatura esteja no CFH e queira pegar o Direto. Tem de atravessar pela escuridão da região do Básico até a parada em frente ao CSE. Aquilo ali é um perigo diário. Há anos que se reivindica a administração da UFSC uma melhor iluminação. Mas nada é feito.. . Até que venha uma tragédia.


Se a mesma criatura que está no CFH precisa pegar o ônibus para Canasvieiras, tem de atravessar a escuridão do Básico, passar pelo escuro do caminho da Biblioteca, até a parada em frente ao Banco do Brasil. E assim por diante. É um verdadeiro suplício, além de perigoso.



Pois a proposta dos “técnicos” é jogar as paradas para fora da UFSC, para além das rótulas, o que significa que as pessoas precisarão andar muito mais para chegar à parada. Ou seja, já temos o pior transporte público do país, o mais caro, o mais demorado, o mais cheio e se assim for, na UFSC, o mais distante.


Sinceramente, rogo aos técnicos, professores, engenheiros, enfim, estes todos que se arvoram em saber o que é melhor para as gentes, que ouçam os que sofrem o transporte. Já basta de pensar a cidade para os carros. Há que facilitar a vida das pobres criaturas que precisam enfrentar as desgraças do busão. Basta de complicação. Já é dureza demais ter de enfrentar o transporte desintegrado que nos obriga a levar de duas a duas horas e meia para chegar ao trabalho e à casa.


A única possibilidade de aceitação das duplicações da Capitão Romualdo e da Edu Vieira é se elas forem abrigar um corredor exclusivo de ônibus. Uma via fica para os carros, que seguirão na mesma de hoje. Mas a segunda seria para os ônibus, que cruzariam rápido e chegariam à UFSC em 10 minutos. Seria uma medida que privilegiaria o transporte de massa, enfim. E ônibus seguiriam passando por dentro da UFSC para que a gente pudesse entrar neles sem precisar atravessar os escuros, para que a vida ficasse mais fácil e a gente pudesse chegar as nossas casas mais cedo. Pensem nas gentes, senhores, nas gentes... Ao diabo com os carros. A cidade é das pessoas!

Campeche se mobiliza contra a destruição


De repente, desde há dois anos, a praia do Campeche se encheu de gente sarada, adepta do frescobol. Mas não aquele jogo delicioso, que se joga relaxado, brincando. Não! É um frescobol de força, vitrine de bíceps, bundas duras, corpos bronzeados. Gente muito “bem nascida”, criada a Toddy. Nada contra que eles estejam no Campeche, afinal, a praia é pública. Mas, o tal do “point”, chamado de “riozinho” foi uma invenção, destas que se cria a cada verão. A mídia encontrou ali um filão, um lugar privado que se dispunha a ganhar dinheiro dos graúdos da cidade, e decidiu apostar na ideia. Então, de velhas e conhecidas bocas alugadas começaram as loas ao lugar. “Melhor pico do verão”, “espaço de natureza exuberante”, “lugar propício para as crianças”. E assim foi, dia após dia, na RBS TV, e nos demais veículos do mesmo grupo, praticamente monopólico na cidade.

Estava em andamento uma agressiva campanha de ocupação dos espaços do Campeche. Este era um bairro que ainda resistia aos ataques dos grandes empreendimentos, porque ancorado num forte movimento popular e comunitário. Mas as terras do sul estavam sob o olhar guloso de empreiteiras e grandes especuladores. A campanha midiática deu resultados. Os granfinos vieram para o “paraíso”, a praia, e, pouco a pouco começaram a pipocar os empreendimentos de luxo, com toda a sorte de irregularidades e desrespeito ao modo de vida escolhido pela comunidade.

Com a ascensão do moderno espaço do “riozinho”, veio também a guerra contra o tradicional, apontado como velho, ultrapassado, e até ilegal. As “autoridades ambientais” passaram a questionar a presença do Bar do Chico na praia, e usavam como argumento o fato de ele estar em cima das dunas, portanto, “destruindo a natureza”. Mas, enquanto se travava na Justiça a batalha para destruir o bar que era espaço comunitário, patrimônio cultural, as grandes construções começaram a ser erguidas, muitas delas também sobre as dunas, como é o caso da casa do tenista Guga. Só que estas não eram questionadas.

Assim, a comunidade passou a se mobilizar para defender o bar, e muitas manifestações foram feitas. Aconteciam reuniões, encontros, mobilizações. O bairro fervia na tentativa de barrar o absurdo. Afinal, o bar praticamente estava incorporado à natureza desde os anos 80 e era parte da vida das gentes, nas festas populares como o carnaval e nas religiosas, como a Páscoa e o Natal. Pois, o Bar do Chico foi o bode na sala. Enquanto as forças vivas do bairro andavam as voltas com documentos e reuniões, a mídia incensava as belezas do lugar e os empreiteiros erguiam seus condomínios de massa.

Numa triste manhã chuvosa as máquinas derrubaram o Bar do Chico e, aturdida, a comunidade viu que, bem ali, em frente ao bar, estava um condomínio gigante pronto para privatizar as dunas com um “belo” deck, onde antes estava o tradicional espaço comunitário. E mais, por toda a parte surgiam novos outros condomínios, bate-estacas, rebaixamento de lençol freático, ilegalidades. Tudo sob o beneplácito da lei. Ou seja, a questão do bar do Chico não era sua ilegalidade, já que tem dezenas de construções ilegais na praia. Era uma derrubada política, uma rasteira na história da comunidade.

O bairro cresceu vertiginosamente sem que crescesse com ele a estrutura para manter a qualidade da vida, tão típica do lugar. Sem mobilidade, sem rede de esgoto, a vida começou a deteriorar. Pessoas inescrupulosas e sem qualquer compromisso com a natureza passaram a também cometer sua fatia de ilegalidade e, com as obras da Casan para a implantação do esgoto, ligaram seus esgotos a rede pluvial, fazendo com que os dejetos começassem a correr para o mar e para os rios que ainda vivem no Campeche.

Mas todas estas coisas não aconteceram sem luta. Desde os anos 80 que a comunidade se organiza e mantém uma série de movimentos na defesa do seu modo de vida. O lixo, o esgoto, a cultura, o Plano Diretor, em todas as áreas tem gente se mexendo. A Associação dos Moradores do Campeche, com a ação vigilante de seu presidente, Ataíde Silva, tem feito um trabalho gigantesco de levantamento de dados, de fotografia, de fiscalização. Cada denúncia de esgoto sendo lançado na rede pluvial é investigada e canos são lacrados quase que diariamente. Há um batalhão de pessoas atentas, discutindo, propondo, e lutando. Este é um trabalho cotidiano. Há mais de cinco anos, os representantes destas entidades se reúnem, religiosamente, todas as segundas-feiras, no Clube Catalina. Ninguém nunca esmoreceu na batalha pela vida digna, por um lugar preservado e de qualidade.

Este ano, de novo, promovido pelo mesmo jornalista que criou o “point” do riozinho, o lugar foi palco de um show internacional, dentro da lógica dos mega-shows. A comunidade reagiu, como sempre fez quando a vida por ali é ameaçada. Ainda assim coisas “mágicas” aconteceram como, por exemplo, a empresa conseguir licenças ambientais em tempo recorde. Na verdade a magia foi feita pelo vice-prefeito que liberou o show e assumiu todos os riscos. Ou seja, seguindo o padrão de “para os ricos, tudo”, a prefeitura afrontou os movimentos populares e abriu as dunas para a destruição. Tripudiando não fez um, mas dois shows.

O Rio do Noca tem história

Pois agora, como se a comunidade do Campeche fosse formada por um bando de imbecis e incapazes, a mesma criatura midiática inventou de comandar um projeto de “salvamento do riozinho” que, segundo ele, estaria correndo o risco de estar poluído. Um evento, apenas, sem qualquer compromisso com a luta de décadas. Em primeiro lugar, aquele não é um “riozinho” sem identidade. É o Rio do Noca, que tem uma história de ligação visceral com a gente deste lugar como bem define o morador do bairro, Adir Plácido Vigânigo: “... O Rio do Noca como foi denominado pelos moradores nativos do Campeche há quase um século, precisa ser cuidado com muito respeito. Pois nele, muitos pescadores aprenderam a remar nas canoas de remo de voga, muitos aprenderam a nadar (entre elas eu), muitas mulheres lavaram roupa, muitos campistas banharam seus filhos, beberam sua água, muitos agricultores deram de beber a seus animais. Nosso Rio do Noca tem história. Não essa história que estão tentando contar, a da faixa de areia que é atravessada pelo Rio e chega ao Mar. O Rio do Noca na praia do Campeche define o limite da pesca da Tainha entre a rede do Seu Chico (Francisco Daniel) e a rede do seu Aparício e Getúlio (antes rede do seu Deca). Ele sempre serviu de referência de localização para os moradores. Quem conhece nossa História não esquece das frases: "acima ou abaixo do Rio", "na boca do rio", "até o rio, etc..”.

Este depoimento repleto de paixão e conhecimento é decisivo para mostrar que nesta comunidade ninguém vai se arvorar em dono do rio, muito menos o nomeará como querem os empreiteiros, assim, de forma impessoal, como se fosse um adorno, um produto, pronto para ser comprado ou vendido. O rio que corre para o mar ali na praia do Campeche sempre foi defendido e cuidado pelo povo do bairro, pelo menos o povo que realmente se importa com a vida, com a história e que sabe que tudo aquilo que se faz a terra, faz-se ao filho da terra. Não há como separar a natureza do homem.
Janice Tirelli, do Núcleo Distrital do Campeche, acerta no ponto quando diz: “Vale lembrar que quem estragou o Rio do Noca foi quem fez dele o seu instrumento de ganância sem pensar nas consequências. Para o capital imobiliário é importante um movimento de revalorização da área do rio, porque ele carrega todos os negócios sustentados na sua propaganda que podem cair ante a concorrência com a nova imagem de poluição e fedor na praia”.

Contam os surfistas locais que, entre eles, desde há anos chamam o rio do Noca de “riozinho”, mas segundo eles, não tem o caráter depreciativo ou diminutivo. É apenas carinho. Coisa que não se pode dizer dos que promovem o pico na mídia local.

A comunidade está atenta. As pessoas que estão em luta há décadas pela qualidade de vida no Campeche nunca deixaram um dia sequer de denunciar, fiscalizar e propor saídas para o processo de destruição que o progresso capitalista traz. Por isso, essa campanha que figuras estranhas ao bairro querem fazer de “SOS Riozinho” não encontra qualquer sentido. No Campeche não há nenhum “riozinho”. Há cursos de água com nome e sobrenome, ligados a história deste lugar e que são defendidos com unhas e dentes por aqueles que ali vivem e amam. No Campeche trava-se uma feroz batalha contra os que insistem em destruir e transformar o lugar em espaços desumanos e impessoais.

E justamente porque a batalha é renhida que ninguém despreza novos integrantes que queiram fazer luta conjunta, como explica Janice Tirelli: “Os que querem uma boa causa, que se integrem a essa que tem sua raiz na comunidade, que tem o argumento forte de quem conhece o lugar porque é parte de sua historia – não apenas os nativos, mas todos os que apostaram no espaço coletivo aqui no Campeche. Não nos peçam apoio. Ao contrário, entrem com o seu apoio na defesa do Plano Diretor Comunitário que, se aprovado, evitará que o estrago seja maior”.

É isso. Não passarão!