quinta-feira, 24 de outubro de 2024

A Turma da Umbu









No sábado, dia 19 de outubro, reunimos a “Turma da Umbu” para o lançamento de um livro com nossas histórias, vividas na chamada década de ouro da televisão de Passo Fundo: os anos 1980. Num tempo em que as condições para produzir jornalismo e programação local em uma emissora do interior eram precárias e desafiadoras, um grupo de profissionais, vivendo seus verdes anos, arregaçou as mangas e fez história, inclusive dando vida a toda uma série de produções que mais tarde foram incorporadas pela RBS de Porto Alegre, como o programa de música nativista (Galpão Crioulo), a promoção da Garota Verão e até o hoje famoso Planeta Atlântida, entre outros. Também era ali, na TV Umbu, que a gurizada inventava as peças de propaganda mais criativas e os videoclipes famosos que faziam febre na época. Quase nenhuma tecnologia, mas muita ideia circulando na cabeça. 

A turma se desfez ao longo dos anos, mas nunca deixou de se comunicar. Até que, na pandemia, foi criado um grupo no uatizapi, onde as histórias daqueles dias foram rememoradas entre risos e lágrimas. Foi o que bastou para virar um livro. Um relato bem humorado daquela década em que a RBS inaugurou sua emissora em Passo Fundo e criou espaço para que toda aquela turma pudesse mostrar seu trabalho. Voltar ao velho prédio e rever os velhos amigos passou a ser uma meta e, finalmente, neste dia 19, aconteceu. Um momento estelar, de reencontro e de lembranças. Quase quarenta anos depois, estávamos juntos outra vez.  

Lembro que quando deixei para trás na TV Umbu, onde trabalhei como repórter, o caminho até ela parecia outro. Antes, o que se via, enquanto subíamos o morro que levava ao prédio onde se plantava a sede da televisão, era um imenso descampado. Agora já não havia vazios, só casas e mais casas. A entrada, pela Avenida Brasil, era totalmente desconhecida. O prédio também. Naqueles dias dos anos 1980 era uma construção branca, sem muros ou grades, destacando-se na paisagem em cuja mureta a gurizada ficava a fumar e tramar as noitadas de farra. Agora, murada, gradeada e com cerca elétrica, virou uma espécie de bunker. Sinal dos tempos. Para entrar precisamos chamar no porteiro eletrônico. Rimos, Bozó e eu, registrando que nos velhos tempos os cobradores entravam porta adentro, exigindo o pagamento das noitadas dos guris, sem passar por entregas. De, apenas o Seu Ivo, de revólver na cintura e sua cara bonachona. 

O portão aberto e na entrada estava o querido Milton Reimers, o técnico que cuidava da “porra toda”, responsável por manter tudo funcionando. Pois não é que ele ainda está ali, cumprindo 44 anos de casa. O mesmo sorriso, o mesmo carinho, o mesmo abraço. Disse-me depois que até hoje guarda a lembrança que deixei pra ele quando fui embora: um cartãozinho com o desenho de um gato e palavras amigas. Na recepção, nenhum sinal da bancada onde a maravilhosa Mara Cavalheiro cuidava da recepção. Chequei a vê-la, linda, com suas trancinhas de kanekalon, lixando as unhas enquanto comandava o telefone e organizava a entrada do povo, com sua risada inconfundível. Ela e a Indiora Crivelli eram as guardiãs da portaria e de todos nós.

Tudo parecia estar como antes, apesar da nova pintura e outras modernidades. A sala do Valmir Correia, onde eu ia contar dos amores e fofocar, o estúdio, o espaço do jornalismo, o salão de festas. Até no espaço do pátio onde ficavam os carros, se podia sentir a presença do Manão e do Seu Ângelo, que eram responsáveis ​​pelo jardim. Tudo ali evocando os bons fantasmas – dos nossos colegas que já partiram – e boas lembranças. O Pedro, mais sensível, nem quis ver o estúdio onde atuoso. Depois, mais tarde, deixou que as lágrimas rolaram sem freio ao lembrar-se da Angélica – colega já falecida - e de tudo que viveu ali naquelas paredes. 

O encontro foi o esperado, cheio de emoções. Cada um que está chegando passando pelo estalar de abraços e beijos, acompanhado de muita gritaria. Até o Lúcio Rodrigues (cinegrafista), hoje uma estrela da Rede Globo, apareceu, para a alegria de todos. Ele, que começou a carreira ali na TV, sempre é lembrado como um dos grandes profissionais que o Umbu deu à televisão. Muitos colegas já estão fora do mundo da comunicação, hoje participam em outras profissões como advocacia, negócios, arte. Outros seguem na empresa, como o Milton, o Paulo Souza, o Carlos Alejandro e o Arno Brinker. Este, que havia perdido o irmão no dia anterior, nosso querido Coroco, chegou quase ao final e foi recebido como um ídolo. Além disso, está ali na TV há mais de 40 anos e é uma referência para todos nós. É uma das pessoas mais queridas que já conheci. 

Tio também a presença de José Carlos Bortoloti, o primeiro apresentador da TV, o Paulo Ricardo e o Ipácio Carolino, vozes espetaculares da Atlântida, a Mara, hoje uma atriz de raro talento. Enfim, a gurizada toda, agora já na estrada dos sessenta, fez com que a gente pudesse se considerar, como há 40 anos, na nossa juventude rebelde, irreverente e criadora. E no salão onde protagonizamos festas de arromba, o tempo voltou atrás, revelando nossos dourados anos. Da porta, Amélia e Leonilda, como “donas” da cozinha, já em outro plano, com certeza celebraram também.    

Nesse clima o nosso livro foi distribuído para que as nossas antigas aventuras agora possam estar na cabeceira de cada um de nós, alimentando as lembranças e assim, concretizadas em palavras, para a eternidade. Não foi um lançamento público. É um livro para nós. Mas, certamente encontre caminhos para as bibliotecas locais, afinal, registre a história. Nosso carinho ao Pereira, Fonseca, Carlinhos e Carlos Alejandro, pela organização do encontro que, com certeza, revigorou a amizade que nasceu bem ali, naquele chão, e que resistiu ao tempo. Afinal, 40 anos é uma vida.

Viva a Turma da Umbu.