No último dia 23 de março, durante
as comemorações do “dia do mar”, celebrado pelos bolivianos para recordar o
momento em que o país perdeu sua saída para o oceano Pacífico, em 1879, o presidente
da Bolívia anunciou que vai entrar com uma demanda contra o estado chileno no
Tribunal de Haya, visando recuperar território. Segundo o presidente Evo
Morales, naqueles dias de conflito não se pode dizer que houve uma “guerra” com
o Chile, como consta nos livros de história, afinal, a tomada de Antofagasta em
14 de fevereiro de 1879 não teve qualquer resistência armada. “Foi uma invasão.
A Bolívia só conseguiu reagir mais de um mês depois”. Evo também considera que
o Tratado de 1904, que firmou a soberania do Chile sobre 120 mil quilômetros
quadrados de terra boliviana, incluindo 400 quilômetros de costa, foi uma
imposição injusta.
A disputa entre Chile e Bolívia, na
verdade, foi fomentada pelas empresas britânica que, à época, detinham o
controle das empresas que faziam a exploração das riquezas minerais na região
do Atacama. Como a Bolívia queria definir novas taxas, mais altas, pela
exploração, os britânicos, aliados aos chilenos, decidiram conquistar o
território. Também havia muita controvérsia sobre os limites reais de cada país
depois das guerras de independência e isso levou o Chile a se autoproclamar
dono das terras. Por outro lado, sabe-se que quando a Bolívia foi criada, em
campanhas de Simón Bolívar, ele mesmo já deixara claro que o novo país deveria
ter uma saída para o mar. O fato é que as disputas comerciais levaram os dois
países à guerra, incluindo ainda o Peru (que também perdeu território) na
disputa.
Desde então, o Dia do Mar sempre foi uma data especial na
Bolívia, porque, nela, é possível reviver esse momento e também reverenciar a
memória do patriota Eduardo Abaroa Hidalgo, um dos primeiros civis que decidiu
incorporar-se as milícias nacionais quando teve início a resistência contra a
invasão chilena na chamada “Guerra do Pacífico”. Ele participou da histórica
Batalha de Topáter e resistiu, sozinho numa trincheira, contra dezenas de
inimigos. Chamado a render-se ele assomou, atirando com sua velha espingarda,
até que finalmente caiu, abatido. Por sua bravura, foi enterrado com honra pelo
exército chileno na cidade de Calama. Só em 1952 seus restos foram repatriados
e enterrados numa cerimônia que levou milhares de bolivianos às ruas. É um dos
mais importantes nomes do panteão boliviano. Por isso, nos dias em que se
recorda sua bravura e seu amor à Bolívia, sempre volta, profunda, a certeza de
que o país não pode ficar sem o seu acesso ao mar.
Nesse dia 23 de março, quando Evo Morales anunciou que vai
buscar os tribunais internacionais, o ex presidente de Cuba, Fidel Castro,
enviou uma carta ao amigo boliviano, na qual afirma que o cobre extraído da
região de Antofagasta, garante pelo menos 39.500 milhões de dólares por ano ao
poder imperial e à burguesia internacional, desde que o território foi tirado
da Bolívia. E o cubano não está errado, a produção de cobre de todo o Chile,
cerca de 50 milhões de toneladas, gera 70 milhões de dólares ao ano, mas apenas
30% vai para os cofres da nação chilena, perfazendo 52% do PIB. O Chile exporta
uma proporção de 30/70 do todo o cobre da região do Atacama, sempre na parceria
com agentes privados, na maior parte estrangeiros.
Depois da declaração de Evo Morales
A Assembleia Legislativa
Plurinacional (ALP) da Bolívia já formalizou o seu respaldo a essa decisão de demandar
o Chile frente a Haya por uma saída soberana pelo Pacífico. E o
vice-presidente, Garcia Linera, lembrou que a Guerra do Pacífico iniciou um
longo calvário da pátria boliviana, provocado pela"ambição e cobiça
chilena", reiterando que o tratado também é ilegal pois foi firmado sob a
ameaça de ocupação de novos espaços do território. Assim, nessa discussão a
Bolívia já vai para mais de 100 anos tentando encontrar sua saída para o mar e,
agora, já não está mais disposta a seguir com os intermináveis encontros que
levam a lugar nenhum.
No Chile, o presidente Sebastián Piñera, tem declarado que
essa demanda boliviana não tem qualquer fundamento histórico ou jurídico. Para
ele, o Tratado de Paz e Amizade firmado em 1904 é legítimo e o Chile vem
cumprindo com todas as disposições do acordo. Alega também que os chilenos
estão dispostos a defender a unidade nacional.
O clima está bastante tenso entre os dois governos.
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