Protestos contra o Código Florestal
Toda vida encerra um mundo de belezas. Nascer é como um presente. A chance de brincar nesse imenso jardim. Mas, como dizem nas redes sociais: ninguém nasce Darth Vader. As pessoas vão se construindo historicamente através das escolhas que fazem, do ambiente onde vivem, das pessoas que encontram. Também há que considerar a classe a qual pertencem e os que escolhem servir.
Muitos tem sido os comentários sobre o senador catarinense Luiz Henrique da Silveira, que morreu essa semana. Aqueles que trabalharam com ele e privaram de sua intimidade derramam boas lembranças, o que deve ser fato. Familiares, amigos, correligionários, pessoas que receberam favores ao longo da vida política, obviamente terão recordações agradáveis, colocarão luz naquilo que de bom compartilharam. E os que travaram com ele embates políticos e pessoais trarão de volta à memória os desserviços, as maracutaias, os equívocos e os males que provocou.
Luiz Henrique como todos nós é um ser histórico. Fez escolhas. Decidiu servir a uma determinada classe e com ela caminhou. Tendo poder, usou-o para alavancar seus interesses e o dos seus aliados.
Não partilhei de sua vida pessoal. Meu encontro com LHS foi na política e ali só travei embates. Ainda não me sai das retinas a votação do Código Florestal, quando seu governo fretou centenas de ônibus, cheios de agricultores, que vieram de vários cantos do estado para apoiar aquilo que seria uma derrota para eles. Na Alesc, chegaram a ameaçar de agressão alguns ambientalistas que ainda tentavam protestar. Foi uma queda de braço desleal. Mentiram para os agricultores, enganaram e fizeram parecer que o Código era bom. A lei passou e os agricultores vibraram, acreditando que iria ser benéfico para eles. O mesmo código de Santa Catarina, depois, serviu de modelo para o nacional, que igualmente passou, dando mais benesses para o agronegócio e promovendo a destruição da natureza. Uma conta que pagaremos todos nós.
Também lutei contra o então governador LHS quando ele iniciou todo o processo de privatização do Hemosc e do Cepon, apostando na gestão via Organizações Sociais. Foi uma luta gigantesca travada pelos trabalhadores da saúde e por parte da sociedade catarinense que entendia ser aquilo a entrega de instituições chave da saúde popular aos empresários da doença. A batalha contra os trabalhadores foi feroz e os espaços de saúde foram tomados pelas ONGs. Foi uma derrota dura para a sociedade. Também seguimos pagando alto preço por isso.
Igualmente os professores de Santa Catarina não têm boas lembranças do ex-governador. Durante seu governo buscou a velha tática de dividir para reinar, ignorando o sindicato. Defendia que o piso salarial nacional era um "absurdo" e atuava com mão dura nas greves. Foram três grandes greves - uma delas a mais longa da história - no seu governo e ele chegou a cortar salários sem dó nem piedade, negociando em separado com pequenos grupos e dividindo a categoria.
Na cultura LHS também deixou uma marca. Privilegiou alguns espaços e deixou à míngua outros, definindo suas escolhas para o benefício dos seus correligionários. Seu nome está colado ao Festival de Dança de Joinville e a ao convênio com o Balé Bolshoi. Mas, a cultura do estado não se resume a isso, por isso chega a ser chocante ler nos jornais que ele foi um patrono das artes. É preciso muito pouco cuidado com a informação e com a pesquisa para afirmar algo assim. É fato que o festival virou uma marca de Joinville, mas isso não significa que a cultura catarinense como um todo tenha recebido atenção. Pelo contrário, durante sua gestão como governador, os artistas, os escritores, os trabalhadores da cultura viveram tempos de penúria, sem uma política pública que distribuísse de forma equitativa os recursos. Não foram poucas as críticas à Secretaria de Turismo, Cultura e Esporte durante seu governo. E o mote era o mesmo de sempre: muito recurso para os projetos de interesse político e nada para os demais. A cultura usada como vitrine, mas tendo apenas uma para mostrar.
Luis Henrique governou como governa um político aliado aos interesses dos grandes, dos poderosos, da oligarquia sempre dominante. Ele fez suas escolhas. Atuou muitas vezes como um coronel de fazenda colonial, ou melhor, um feitor. Criou uma estrutura de governo que até hoje sangra os cofres públicos, as indefectíveis secretarias regionais, inviabilizando investimentos nas áreas necessárias como saúde, educação e segurança. Um político tradicional, truculento com os de baixo.
Morreu, e como homem público deixou sim um legado. Mas, é preciso que se tenha a correção de especificar que legado foi esse. Para os amigos e aliados foi um, para os adversários e para a classe trabalhadora foi outro. Há que conhecer os dois lados da moeda para apresentar um retrato mais próximo da realidade.
E assim, desaparece um político que construiu-se no apoio a classe dominante.
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