A reunião do Conselho Universitário do dia três de setembro acabou discutindo um único ponto: o da resolução dos concursos para professores. Dois pontos provocaram intensos debates e deixaram a nu as concepções de universidade que se confrontam no dia-a-dia da instituição. O primeiro deles debateu como seria a prova escrita. Havia a proposta da comissão que era a de que a banca do concurso, baseada nos itens públicos divulgados com antecedência para os candidatos, formulasse duas questões abertas para que o candidato pudesse responder livremente, inclusive utilizando conceitos de diferentes itens. Para contrapor, apareceu outra proposta, vinda da vice-diretora do CFH, que era a de manter a prova sem questões, apenas com o sorteio do item. Segundo ela, assim seria possível evitar uma especialização das perguntas, ficando mais difícil qualquer tipo de favorecimento. Foram muitas as defesa a favor e contra cada uma das proposições, com alguns conselheiros colocando das especificidades de cada curso, argumentando que em alguns casos sortear o item seria melhor, e, em outros, o melhor seria a formulação de questões. Ao final, a proposta do professor Nilton, da Física, contemplou as duas visões. As duas possibilidades serão válidas, ficando a decisão para o colegiado do curso.
O outro ponto foi mais polêmico. O debate era sobre se a prova escrita teria ou não critérios específicos no que diz respeito ao respeito à língua portuguesa. A comissão que apresentava a resolução defendia que a banca de cada concurso tivesse critérios bem específicos para evitar ações na justiça relacionadas a avaliações subjetivas. Outras falas, de diversos conselheiros, defendiam que os critérios deveriam ser genéricos quanto à clareza, raciocínio lógico, capacidade de articulação etc... Também apareceram defesas de que não houvesse rigor na correção da língua portuguesa. O professor Carlos Eduardo, do HU, chegou a dizer que muitos médicos tinham dificuldades com a escrita e isso poderia impedir que bons profissionais ficassem em desvantagem na prova por conta da língua. Também houve a defesa de que os professores estrangeiros igualmente seriam prejudicados num eventual critério de precisão da língua, o que impediria a entrada deles na universidade. A discussão avançou a ponto do surrealismo.
O conselheiro Hélio, dos TAEs, fez uma fala indignada cobrando da administração que fosse apresentado um mínimo de dados sistematizados sobre os problemas das bancas. Argumentou que estava sendo impossível se posicionar diante de tantos “achismos”, sem qualquer base real. A pró-reitora Roselane Campos, respondeu dizendo que era fato não haver dados ainda sistematizados, mas que havia sim um histórico de conhecimento sobre a questão, o que capacitava todos os conselheiros a tomar decisões. A professora Sônia, que representa a comissão que reajusta a proposição, igualmente redarguiu dizendo que não existe achismo e que a comissão tem até dado cursos de capacitação nos diversos campi. “As dúvidas estão todas sistematizadas”.
E o debate sobre a língua prosseguiu. A vice-diretora do CFH, também defendendo uma flexibilização no uso correto da língua formal, disse que era hora da universidade sair da escolaridade de segundo grau e que os critérios deveriam ser mais genéricos. Foi acompanhada pela reitora que também defendeu critérios gerais, os mesmos definidos para a prova didática. Outro momento de debate. Vários conselheiros entendiam que os critérios para a prova didática não poderiam ser os mesmos da prova escrita, visto que era outro o caráter e outros os elementos a serem avaliados. Passou-se a votação sobre se a prova teria critérios ou não. A maioria decidiu que sim. O problema seguia em relação às quais critérios deveriam valer.
Volta o debate sobre a língua. E, de novo, aparece o argumento baseado no professor estrangeiro. O representante do CDS lembrou que o professor terá de ensinar, pesquisar e fazer extensão. Logo, deverá ter domínio da língua. E questionou: Como fará tudo isso se não souber escrever? O professor Cancellier ironizou dizendo que até votaria a favor de não levar em conta a língua se todos ali não se importassem que a resolução dos concursos – um documento oficial - também saísse com erros de português. Eu resolvi entrar no debate e lembrei aos colegas conselheiros que esse debate sobre o uso da língua certamente não seria feito em nenhuma universidade estadunidense ou europeia, ou mexicana. Qualquer universidade de qualquer país iria exigir de seus candidatos a professor o uso correto da língua oficial. Não teria qualquer cabimento flexibilizar o uso correto da língua com o argumento de alguns bons profissionais não seriam contratados por simplesmente não saberem escrever em português. Primeiro, porque isso não seria verdadeiro. O uso correto da língua seria apenas um dos critérios, não o único. Logo, se eles estavam preocupados com os estrangeiros que querem dar aulas na UFSC, não seriam os erros no português que os eliminariam. Para mim, a discussão era totalmente bizarra. Se estamos no Brasil, a língua é o português. E não se trata de defender a língua do “opressor” como chegou a dizer um conselheiro estudante. É a língua do país. Dizer que exigir conhecimento da língua portuguesa é fortalecer o opressor soa quase ridículo no contexto em questão.
O diretor do CFH afirmou que exigir correção no português empobreceria a UFSC. E a polêmica rolou até que se chegou a votação de três propostas diferentes: a primeira exigiria apenas que a forma de expressão fosse clara, sem menção a correção gramatical, a segunda exigia só correção linguística e a terceira exigia a correção gramatical. Na explicação de um dos professores conselheiros, a correção linguística já envolve a gramática, embora defina que as formas regionais de se expressar sejam válidas. Resta saber se no caso da UFSC também serão válidas as formas linguísticas de outros países. Em votação, a primeira proposta ficou com 9 votos, a segunda com 19 e a terceira com 8. A bancada dos TAEs votou dividida, metade ficou com a proposta 2 e a metade com a proposta 3.
É bom que se diga que tenho muito claro o debate sobre as formas de falar e se expressar nas diversas regiões do país. No nosso caso é comum, ao falarmos, usarmos expressões como: “Ouvisse? Entendesse? Vixe! Oncotô? Mofax! “ e tantas outras. Do ponto de vista da língua, essas são expressões certas e válidas, porque usadas pelas gentes em todos os cantos do país. Mas, ali, estávamos discutindo regras para um concurso de professor universitário, onde o uso correto da língua formal, na forma escrita, deveria ser respeitado. Com isso, não se está refutando as variadas formas de expressão, muito menos impedindo que professores estrangeiros possam dar aulas na UFSC. Mas, se para uma tese de doutorado, dissertação ou monografia, o que vale são as regras da língua formal, não seria justo que assim fosse para os concursos?
Enfim... Esse é um bom debate!
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