A cidade nos reserva surpresas inauditas. Andando apressada em direção ao almoço, cabeça baixa, cheia de minhocas a minhocar, de repente, eu as vi. Estavam ali, lado a lado, no chão, em meio à algaravia das gentes que passavam rumo ao centro de compras da Trindade. Cada uma delas oferecia, no mercado, o produto que lhes permite seguir tocando a vida. Uma expunha os ecos de sua cultura milenar: cestos, maracás, colares, bichos de madeira. A outra, exposta ao turbilhão do sistema, oferecia lenços da moda. Todas duas tinham ao lado uma criança, a lhes exigir cuidados. Tão perto e tão longe.
As mulheres com as quais me deparei eram uma guarani e uma kichwa, respectivamente do Brasil e do Equador. Duas originárias, filhas legítimas da terra de Abya Yala. A guarani vive no morro dos cavalos, na aldeia, e vem todos os dias tentar ganhar um troquinho que trocará por comida. A kichwa vem de Cotopaxi, com um grupo grande de migrantes que saiu do Equador em busca de vida melhor. Os maridos, filhos e parentes cantam e dançam nas ruas enquanto elas vendem produtos da moda comprados em quantidade.
As duas mulheres originárias estão ali, na esquina da UFSC. Estão perto, mas não se falam. Vivem cada uma no seu mundo particular, sem comunicação. Sem se dar conta, talvez, que são irmãs, iguais na condição de povos primevos, donos desta imensa terra. Estão na rua, sentadas no chão frio, esperando que algum passante apressado se interesse pelos seus produtos. Disputam a calçada de um lugar que lhes pertence.
As mulheres originárias não se conhecem, não se olham, não se falam. Submetidas estão ao modo de ser ocidental, de competição e indiferença. As mulheres originárias precisam se conhecer, e saber... Hoje o dia passou, mas segunda-feira eu vou apresentá-las! Alguma coisa haverá de mudar naquela esquina da UFSC...
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