segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Recuerdos del mar


Uma das tantas maravilhas de estar no Instituto de Estudos Latino-Americanos é poder conhecer intelectuais, escritores e investigadores de tantos lugares dessa nossa Abya Yala. Nessas férias terminei de ler mais uma obra do escritor guatemalteco Rafael Cuevas Molina, que hoje vive na Costa Rica e que já participou das nossas Jornadas Bolivarianas.

Não fora o IELA como conheceria essa narrativa abissal que toca até a medula? O livro é pequeno, mas o conteúdo é gigantesco. “Recuerdos del mar” é uma história única, mas universal. Trata das lembranças de um jovem, as memórias que tem de um lugar onde foi feliz. Poderia ser qualquer um de nós.

A história é simples, quase prosaica. Um garoto, uma praia, uma menina, garotos, barcos, casas, cheiros. Mas o jeito de contar beira a perfeição. Vai-se passando pelos capítulos, que são curtos, com a sofreguidão de quem foi encantado pela escrita. A descrição da praia, das pessoas, do ambiente, o intimismo das lembranças e dos sentimentos, tudo aparece como uma manhã banhada de sol. É mágico.

A praia na tem lugar, é em algum ponto do Pacífico, com o mar bravio e a areia gris, tão típica dessa margem. Quem já pisou alguma aldeia de pescadores do Pacífico sabe bem o que digo. Esses lugares perdidos no interior da nossa América, onde as gentes se banham no mar por puro gozo e não se vislumbram corpos torrando na patética tentativa de “ficar bronzeado”. O mar é parte da vida, é parte do corpo.

A experiência humana que Rafael conta mostra essa vida imanente na beira do Pacífico, onde os dias ensolarados passam devagar e cheios de beleza. A riqueza dos detalhes, a profundidade da narrativa,  a densidade úmida da América Central, o jeito singular dos moradores, que tudo tem e nada esperam. Palmeiras, sol, mar, areia, brincadeiras, suspiros, amor, abismo de sentires. O olhar ferino de quem observa os forasteiros que buscam a praia no verão, deixado-a cheia de lixo e nada levando. Uma paisagem especulada, nada mais. Enquanto que para os moradores é pura vida.  

A gente termina o texto com lágrimas nos olhos. Pela solidão do homem, pela dureza do progresso que tudo destrói, pela certeza de que o monstro da especulação segue comendo paisagens e vidas. Mas também se sente uma afável ternura. Pela vida que segue, que se amolda, que resiste.


"Recuerdos del mar" é mais um livro incrível desse romancista de honor, Rafael Molina, e está no IELA, na Biblioteca Simón Rodríguez,  para quem quiser ler. Sem sair da cadeira, passeamos por essa risca de terra úmida que é a América Central e vamos conhecendo melhor nossos irmãos e irmãs abyaiálicos...


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