sábado, 13 de fevereiro de 2016

14 de fevereiro - Dia de São Valentin


























Nas culturas anglo-saxônicas o dia 14 de fevereiro é um dia especial: celebra-se São Valentin, o padroeiro dos enamorados. Muitos países de fala inglesa e também alguns países da América Latina, como o Paraguai, Argentina, Costa Rica, Cuba, Equador, México, Venezuela, Panamá e Chile, comemoram o dia dos namorados nesse dia. No Brasil, o dia dos namorados é em 12 de junho e não tem relação com São Valentim.

A celebração do dia de São Valentin passou a se transformar numa tradição nos Estados Unidos em 1842 quando uma mulher chamada Esther Howland começou a vender alguns cartões postais com corações e cupidos desenhados. Esses cartões ficaram conhecidos como "valentines". Já nos países nórdicos, que também celebram os namorados nesse dia, a origem é bem mais antiga e tem a ver com a natureza, pois naquela região essa é a época em que os pássaros se acasalam e são vistos como um símbolo da criação. 

Ainda que nos EUA o dia de São Valentin, depois dos coraçõezinhos de Esther, tenha virado um dia de consumo, adorado pelo comércio, a história de São Valentin como patrono dos enamorados remonta ao Império Romano. Ele era um padre que vivia em Roma e que enfrentou o imperador Cláudio II, quando esse tentou impedir o casamentos dos jovens, alegando que os solteiros eram melhor soldados. Indo contra a lei e contra o imperador, o padre celebrava casamentos às escondidas. 

Denunciado por inimigos padre Valentin foi preso e martirizado em 14 de fevereiro do ano de 270. É para reverenciar o homem que protegeu o amor dos jovens que se celebra o dia dos namorados na data de sua morte. 


segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Em busca do jornalismo perdido






O grande livro de Ray Bradbury, Fahrenheit 451, ficção científica escrita em 1953, apontou uma sociedade futura na qual as pessoas teriam uma tela multidimensional na sala de casa e que ali ficaria passando informação sem parar,  o dia todo, e a pessoa, viciada naquela algaravia, não conseguiria mais compreender o mundo criticamente. Tudo se resumiria naquele caleidoscópio de palavras desconexas que perpetuavam o poder de quem mandava. Aquela passagem do livro sempre me causou calafrios. Era o mundo perdido no qual vivia a esposa do personagem principal, o que descobre a beleza dos livros num mundo no qual eles não mais existiam.

Apesar da mensagem de esperança que o perturbador livro de Bradbury traz, aquela imagem da sociedade futura fica a corroer os miolos, principalmente quando aquilo que era só uma invenção ficcional nos anos 50 do século passado parece ser a realidade dos tempos atuais. Esse é o nosso mundo. As televisões espertas, de 50 polegadas, já conectam a internet e, nela, o facebook, esse espaço multicomunicacional que parece ter abduzido todas as mídias numa só. Ali, no seu mural, as informações passam em velocidade da luz, formando a mesma algaravia enfeitiçante da sala do mundo Fahrenheit. A vida está ali, prisioneira e saltitante.
Essa constatação aterrorizante é o que me leva a pensar sobre a minha profissão: o jornalismo. Onde ele está? Quem consegue vê-lo em meio a selva de informações fortuitas, rápidas, e mentirosas? Sobreviverá ao buraco negro do facebook, cada vez mais empoderado?

Antes de mais nada é preciso entender sobre o que estou falando, visto que há muitos entendimentos sobre o que seja o jornalismo. Falo da análise do dia, a descrição da realidade com impressão de repórter, contexto histórico, narrativa. Falo da produção de textos e vídeos que apresentem criticamente aspectos da realidade, levando o leitor/espectador a pensar sobre os fatos e estabelecer nexos com a vida.

É fato que não é o facebook o assassino do jornalismo. Ele agoniza desde há tempos na medida em que foi hegemonizado como mera propaganda, a apontar as belezas do sistema capitalista, da agricultura predadora, do consumo desenfreado e outras facetas mais desse modo de organizar a vida. As notícias que pipocam nas telas de TV, nos jornais, não dizem da realidade. Elas servem para aprisionar e alienar numa verdade inventada, que esconde o discurso da maioria da população. A voz do jornalismo existente é a voz oficial, do presidente, do deputado, do economista, do especialista. Nele não aparecem os trabalhadores, os que lutam, os que realmente criam o mundo. Esses estão fora, sem lugar onde expressar sua voz.

Por conta disso que ao longo dos tempos sempre foi necessário constituir um jornalismo de verdade, que se faz em outras instâncias, alternativas e populares. Um jornalismo que abre espaço para a voz do oprimido, da comunidade das vítimas e que contextualiza a realidade. E desde há tempos, esse jornalismo vem se equilibrando no emaranhado de um mundo midiático, criado para o engano. É a luta de classes se  expressando no campo da palavra, da informação. De um lado, os poderosos, buscando impor seu modelo de mundo como o modelo universal, e de outro lado - ainda que com menos poder de abrangência, mas valente  - as gentes em luta, procurando abrir espaço para a informação crítica que leve as pessoas a pensar sobre a realidade e, desde aí, transformá-la.

Com a ascensão da revolução tecnológica, o jornalismo precisou se reinventar. A Rede Mundial de Computadores trouxe uma novidade até então impossível de ser pensada: a possibilidade de a palavra do oprimido também ultrapassar os limites geográficos. Isso aprecia bom. Com a popularização da internet, os sindicatos, movimentos sociais, movimentos indígenas, movimentos populares, pessoas individuais, cada um que quisesse externalizar seu pensamento, tinha a sua chance. E não apenas para a sua aldeia, mas para o mundo inteiro. As incognoscíveis páginas, criadas em linguagem html foram se popularizando, com a criação de modelos facilmente manipuláveis. Vieram então os blogs que se tornaram muito mais acessíveis. A internet não apenas democratizava o espaço para que os movimentos coletivos se expressassem mundialmente, mas também viabilizava que qualquer um, com acesso à rede, pudesse ser um produtor de conteúdo.

Aí mais uma vez foi a hora de pensar o jornalismo. Se qualquer um pode divulgar informações, como peneirar o que é apenas informação e o que é jornalismo? Como reconhecer o que é uma opinião? Como estabelecer os nexos entre as informações soltas divulgadas aos borbotões? Como encontrar espaços de informação crítica e contextualizada? O que se viu num primeiro momento foi que as pessoas continuavam a acessar a informação formal, produzida pelos mesmos grupos que já dominavam a informação televisiva ou do papel. Ou seja, a informação/propaganda produzida pelo jornalismo das grandes empresas de comunicação ainda era a referência. E, de novo, os movimentos e entidades da luta popular tiveram de disputar o espaço internético como "ilhas alternativas", sempre perdendo a batalha para os velhos grupos de poder que controlam a mídia no mundo.

Foi então que chegou o facebook, um espaço na rede que começou a abocanhar todas as possibilidades comunicacionais, aglutinando-as numa só. O correio eletrônico foi sendo abandonado e a comunicação agora vai se fazendo - em tempo real  - pelo esquema de mensagens do face. A ideia é de que a pessoa esteja o tempo todo conectada, aproximando-nos daquela assombrosa ficção de Bradbury. E assim, no mundo atual, ou a pessoa está conectada, ou não é. É a versão eletrônica do consuma ou te devoro, outro mantra do capitalismo.

Agora, a novidade que se aproxima me foi sussurrada por um texto do irianiano Hassein Derakhshan, chamado de o pai dos blogs do Irã, que informa o novo plano de Zuckerman: acabar com a possibilidade da publicação de links no facebook. E o que isso significa? Que se hoje os blogs e os movimentos sociais utilizam o facebook para potencializar suas informações, divulgando os links para serem consultados, amanhã isso já não será possível. A tendência será a morte das páginas individualizadas. Segundo Hassein, o facebook acabará sendo a única fonte de informação, totalmente homogeneizada. Não é sem razão que o criador dessa tecnologia tem andado pelo mundo fazendo convênio com os governos para permitir que "todos" tenham acesso ao facebook.

Atualmente um bilhão e meio de pessoas usam a internet diariamente e mais da metade tem o facebook como fonte principal de informação. Se considerarmos que somos sete bilhões no planeta, ainda há gente demais fora dessa mídia, coisa que Zuckerman está batalhando muito para mudar. Mas, esse mudar é apenas seguir sendo o mesmo, já que a tal da internet dos pobres apenas possibilitará o acesso ao facebook, tornando a pessoa prisioneira dessa plataforma.

A questão é que o futuro nos reserva uma espécie de oligopólio mundial, uma plataforma única de comunicação, na qual será muito difícil discernir o que é verdade, o que é mentira, o que é propaganda, o que é crítico. Estaremos jogados na sala multidimensional de Bradbury, com as vozes falando, falando, falando e não dizendo nada, fortalecendo a dominação.

Voltamos então a questão do jornalismo. Como ele sobreviverá nessa sala caleidoscópica? Haverá saída? Encontraremos um espaço para a informação crítica? Estará perdido para sempre o jornalismo que desaloja, que perturba, que faz pensar? Perguntas incômodas, mas necessárias.  

No mundo ficcional de Bradbury as pessoas acabaram encontrando uma maneira de fazer seguir o pensamento crítico. E nós, encontraremos? Essa é a questão que tem me corroído as entranhas.


domingo, 7 de fevereiro de 2016

O meio-ambiente é um bem comum


Entrevista realizada no Programa Campo de Peixe, com o professor da UFSC, Daniel José da Silva, sobre a necessidade de a população se apropriar da luta pelo equilíbrio ambiental.


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

O ano que vem



A abertura dos trabalhos legislativos no Brasil mostrou que o ano de 2016 não vai ser fácil para os trabalhadores. Com a presença da presidenta Dilma, que falou para os deputados e senadores, buscando apoio para suas pautas, o que ficou nítido e claro é que muita luta será necessária para garantir que direitos não sejam tirados e outros possam vir. Tendo como mote a retomada do crescimento, Dilma pediu apoio para a aprovação de um novo tributo, a CPMF, que incidirá sobre movimentações financeiras e também para as novas medidas que aprofundarão o chamado ajuste fiscal.

Não precisa ser muito esperto para saber que o tal ajuste será pago pela maioria dos trabalhadores, uma vez que o carro chefe da sua proposta é a desvinculação das receitas. E o que isso significa: que com ela, o governo poderá manejas os recursos do orçamento jogando verbas para onde julgar mais necessário. Com isso, o orçamento da seguridade social, que envolve saúde, moradia, educação, assistência social e previdência, poderá ser movido para outros objetivos, coisa que atualmente não pode ser feita. A Constituição define que arrecadação das contribuições sociais só podem ser gastas com o social. Desvinculando as receitas, o governo pode puxar recursos das contribuições sociais e garantir o superávit fiscal sem precisar criar outros tributos.

Com essa proposta de desvinculação o governo já acena com redução de financiamento do programa Minha Casa, Minha Vida, para quem tem menos renda, e cortes no Pronatec (formação técnica e para o trabalho) e o programa Ciência sem Fronteiras (formação no exterior). O argumento da presidenta para que aconteça a desvinculação é de que a carga tributária - que é a parte do orçamento que pode ser movida - diminuiu de 16% do PIB para 13,5%, enquanto que as contribuições previdenciárias aumentaram. A proposta é criar a CPMF e colocar parte dos recursos desse imposto na previdência. É deveras, uma matemática estranha, já que põe e tira recursos ao mesmo tempo e ainda continua com o velho discurso de que a previdência é deficitária.

Não bastasse querer mexer nos valores orçamentários das contribuições sociais, a presidenta ainda quer fazer nova reforma na Previdência que vai aumentar a idade mínima, mudar o fator previdenciário e ajustar a previdência dos trabalhadores públicos. Com isso, as novas gerações  - as mudanças não valerão para quem já está no sistema - terão de trabalhar muito mais tempo para garantir aposentadoria, além de terem de recorrer, obrigatoriamente à previdência privada, caso seus salários ultrapassem o valor definido como máximo que é, na verdade, muito baixo: 2.400 reais. 

Nesse pequeno mas significativo pacote de propostas se esconde um mundo de mudanças que mexe diretamente com o bolso e vida da maioria dos trabalhadores, visto que os mais ricos seguirão acumulando sem maiores problemas. Dilma acenou com medidas que beneficiam os empresários médios e prometeu abrir novos mercados para os grandes exportadores, bem como a privatização de estratégicos espaços, como é o caso dos terminais dos portos públicos e estradas. 

As pautas legislativas

Mas se as metas do governo federal não parecem muito atrativas para os trabalhadores, as outras pautas que estarão em debate nesse ano novo legislativo também representam péssimas mudanças, quando não um retrocesso abismal.

Pelo menos 10 grandes projetos deveriam preocupar sobremaneira os brasileiros e mobilizá-los no debate e na resistência pois, ainda que sejam temas periféricos às questões estruturais influem demasiado na vida cotidiana e reforçam preconceitos e ódios que já se expressam em grande número no país. Um deles é a proposta de um Estatuto da Família, da bancada evangélica, que considera família apenas a união entre um homem e uma mulher. Nada poderia ser mais atrasado que isso, mas já foi aprovado nas comissões. Outro é o da redução da maioridade penal para 16 anos, que pretende encher as cadeias para melhor alimentar a roda do capital. Também estará em pauta a chamada lei antiterrorismo que nada mais é do que legalizar a criminalização das lutas sociais  visto que, hoje, o conceito de terrorismo ficou mais largo, abrangendo nele qualquer pessoa que se coloque em luta contra os governos. Nessa linha de leis esdrúxulas está também a que criminaliza os agentes de saúde que informarem às mulheres sobre soluções abortivas como por exemplo a pílula do dia seguinte, mesmo que em caso de estupro.   

A pauta do ano igualmente se ocupará de temas como a permissão da terceirização sem limites, a retirada da Petrobras como exploradora exclusiva do pré-sal, a revogação do estatuto do desarmamento, a privatização dos Correios e da Caixa Federal, a flexibilização do conceito do trabalho escravo e a redução da idade para o trabalho que deverá ficar em 14 anos. 

Assim que os dramas serão intensos e a vida nacional colocada num profundo turbilhão. Nesse cenário temos um movimento social ainda muito dócil, sindicatos adormecidos e centrais de trabalhadores mais ocupadas em defender o governo, o que torna tudo muito incerto. Permitirão os trabalhadores brasileiros a retirada de mais direitos? Suportarão uma nova reforma da previdência? Estarão dispostos a aceitar retrocessos bárbaros e a consolidação de preconceitos? 

Recentes pesquisas mostraram que 1% da população mundial detém a riqueza equivalente aos 99% restantes, o que mostra que o abismo entre os mais ricos e os mais pobres só aumenta. Os dados ainda comprovam que 62 pessoas no mundo detém uma riqueza equivalente a riqueza da metade da população - ou seja, do que 3 bilhões e meio de pessoas. Isso não é bolinho. São dados aterradores. Esse abismo se expressa igualmente nos países capitalistas, nos quais os índices de riqueza também aumentam e se separam drasticamente dos mais pobres. Isso significa que motivos para luta existem e sobram. 

Ocorre que o capitalismo moderno e sua pedagogia da sedução ainda tem muito poder sobre as pessoas que, ingenuamente, acreditam que "com muito esforço" podem vencer na vida, "chegar lá". Esse tipo de crença é o que permite que os pobres permaneçam pobres e os ricos cada vez mais ricos. Romper essa mentira é tarefa difícil, ainda mais se considerarmos a crise pela qual passa o sindicalismo, que deveria ser o espaço da rebeldia e da organização para a luta. Sem trabalho de base e sem credibilidade essas entidades estão aí, em vida vegetativa. Caberá aos trabalhadores e aos que vivem sob a opressão do capital encontrar os caminhos da luta para mudar tudo isso.  


terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

O veneno de todo dia



Acompanhei a polêmica dos feirantes que vendiam produtos ditos “normais” como se fossem orgânicos. Um crime contra a economia, contra as pessoas. Uma fraude. Bom que tenham denunciado, evitando assim que pessoas comprem – e paguem caro – por um produto que, apresentado como saudável, não o é. Mas, o ponto de fundo, que definitivamente toca meu coração e meu corpo, é que poucos falam dos produtos cheios de agrotóxicos que são empurrados para nós em todos os mercados e feiras. O fato inexorável é: comemos veneno, e comemos muito veneno.

As feiras de orgânicos que começaram timidamente e agora já são encontradas com mais facilidade na cidade são uma alternativa boa, mas ainda para poucos. Como a produção é pequena e todo o processo de distribuição é difícil, os preços cobrados pelos produtos saudáveis são altos e a maioria das gentes não tem como pagar. Também é bom que se diga que mesmo comendo alguns produtos orgânicos, ainda sobra muito produto contaminado na nossa alimentação.

O agrotóxico, e isso já foi cientificamente provado, provoca uma série de doenças nas pessoas, sendo o câncer a que tem tido maior incidência. No Brasil, ingerimos, no mínimo, nove litros de veneno por ano. Que corpo pode resistir a isso?  Todos nós estamos morrendo envenenados, e da pior maneira possível, com doenças malucas que nos exigem o uso de uma infinidade de remédios.

A lógica perversa é a lógica da produção de mercadorias, para que se alimente a roda da indústria e do comércio. Cria-se a ideia da agricultura ultra-produtiva, que precisa de muito agrotóxico, e esse agrotóxico produz centenas de doenças, que movimentam os laboratórios farmacêuticos. E assim, vamos, presos à roda de um consumo induzido e criminoso. E não há escapatória. Quem pode manter uma alimentação orgânica? Quem pode fugir dos transgênicos?

A maioria da população, que passa o dia na dura faina de garantir o pão daquele dia, como pode se proteger? Não pode! Esse é o ponto. Apesar de todas as pesquisas e alertas sobre os males dos transgênicos e dos venenos na agricultura esses produtos seguem sendo produzidos e vendidos. Até bem pouco tempo ainda havia a rotulagem, que pelo menos nos informava o que estávamos comendo. Agora, por conta dos lobistas do “agrotóxinegócio” – Kátia Abreu, atual ministra da agricultura à frente - até isso nos é negado. Não há o que fazer.

O leite que chega na caixinha, tem de tudo, menos leite, e abundam as pessoas com reação à lactose, coisa que nem acredito, pois lactose deve ser o que menos tem na caixa. Certamente deve ser algum veneno. O trigo que comemos em profusão, nos pães, bolos e biscoitos típicos da nossa cultura, estão modificados e refinados e “quimicalizados” de tal forma que passam a nos fazer mal. Polenta é coisa que nunca mais podemos pensar em comer, uma vez que a farinha de milho que nos vendem é sabe-se lá que monstruosidade genética. Carnes e comidas enlatadas, embutidas, ensacadas. Mas, ainda assim, lá vai a procissão ao supermercado pagar por veneno. E é porque não tem jeito. Vamos fazer o quê? Nossa única chance é estarmos também nós tão profundamente modificados geneticamente que possamos resistir a essas drogas e venenos que nos empurram diuturnamente. Mas, mesmo assim, ainda estaremos alimentando a indústria dos remédios, tomando pílulas para dor de estômago, náuseas, dor de cabeça, mal estar. O festival dos horrores.

A ministra da Agricultura do Brasil, Kátia Abreu, que é representante dos grandes fazendeiros nacionais, declarou há pouco tempo que essa gritaria sobre os males do agrotóxico é puro preconceito e que o Brasil não usa produtos que causam câncer. O que explica então, o fato de latifundiários estarem jogando agrotóxico nas fontes de água dos indígenas – para exterminá-los - em algumas regiões do país? O que explica o índice elevado de doenças nas áreas rurais? Se é preconceito, o que explica instituições idôneas como a Fiocruz e o Instituto Nacional do Câncer insistirem para que se elimine o agrotóxico das plantações? Ou seja, o cinismo é moeda corrente entre aqueles que nos empurram veneno goela abaixo.


Bueno, mas se tudo é assim, então não há mesmo saída? Sim, saída há. Mas ela não é individual. Precisa ser coletiva e massiva. Uma nova organização da vida, as gentes mobilizadas contra o massacre cotidiano que envolve não apenas a comida que comemos, mas todo o resto. A saída não pode ser encontrada isolada na questão alimentar. Ela diz respeito a grande política, aos desafios estruturais. Vamos caminhando e, enquanto não alcançamos o grande meio-dia, bradamos e lutamos!

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Vitor, presente!





















Na imensidão da Biblioteca Universitária, se destacam, bem à entrada, duas mesas de exposição. São como uma ferida aberta no grande saguão ainda um pouco vazio, por conta das férias escolares. Ali, gritam figurinhas de animais, flechas, arcos, cestos e livros que falam da cultura indígena do estado de Santa Catarina. Os bichinhos, entalhados em madeira, representam a meninice e a brincadeira das crianças Guarani, Kaingang e Xokleng Laklãnõ, as três etnias que sobrevivem no estado.

No trabalho de tecer as ramas para o cesto, entalhar a madeira ou fabricar as flechas fica muito claro a relação que os povos originários, desde a mais tenra infância, mantêm com a natureza. A cultura brota da mata, num intercâmbio respeitoso e cúmplice com a natureza. São essas peças que representam de maneira muito profunda cada etnia e que os indígenas procuram vender para garantir o sustento das famílias, uma vez que, muitas vezes, sequer têm suas terras demarcadas, o que dificulta tremendamente qualquer possibilidade de subsistência dentro das aldeias. É, então, o artesanato que eles levam para as cidades, na tentativa de garantir o bem-viver.

Foi numa viagem assim que Vitor Pinto perdeu a vida. A família saiu de Chapecó (no oeste do estado) para o litoral, para aproveitar a presença dos turistas. E, como sempre acontece, não há qualquer estrutura para receber essas famílias. Elas vêm por conta e acabam se abrigando onde é possível. Naquele dezembro de 2015, a família de Vitor ficou na rodoviária e foi ali, na calçada, enquanto comia no colo da mãe, que o garotinho foi assassinado. Um crime tão vil que ainda não cabe na compreensão.  

O assassino é um jovem de 23 anos, com uma triste história de abandono e exclusão, que já está preso. Mas, a prisão não traz Vitor de volta e muito menos abranda a dor causada pela perplexidade de uma morte sem razão. Assim, passados 30 dias daquele terror (o assassinato foi no dia 30 de dezembro), a singela homenagem desse grupo de Florianópolis à memória do pequeno  kaingang procura marcar a necessidade do reconhecimento das terras indígenas para que as gentes originárias possam viver na dignidade. 

A exposição foi montada pelo Museu do Brinquedo da Ilha, que funciona na Biblioteca da UFSC, a partir de uma articulação envolvendo pessoas e movimentos que atuam na causa indígena. A organização do acervo ficou a cargo de Viviane Vasconcelos, Telma Piacentini e Gleide Bitencourt Ordováz. O material pode ser visitado até o final de fevereiro.  

Venha visitar e render homenagem Vitor .

* Horário da Exposição

Horário de Verão da BU/UFSC

Das 07:30 às 13:30 h de segunda à sexta até 26/02/16
Sábado e domingo fechado

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

América Latina e seus dilemas



Já vai longe o tempo em que as notícias chegadas dos países irmãos da América Latina enchiam a vida de esperanças. Cooperação, soberania, equidade, mudanças, os ventos cambiantes soprando desde a Venezuela e se espalhando pelo continente. Nada muito revolucionário, mas pequenas e significativas transformações que começavam a cimentar um caminho diferente para uma população sempre subjugada dentro de um capitalismo dependente, no qual só sobrevivem os que mais roubam e exploram.  

Com Chávez à frente foram criados novos espaços de integração latino-americana como a Unasul, a Celac, o Caricom, bem como um Banco do Sul e uma emissora de televisão que buscava igualmente integrar o continente pela cultura: a Telesul. Durante mais de uma década, esse lugar geográfico denominado América Latina finalmente conseguiu olhar-se e descobrir-se parte de uma mesma proposta, a mesma com a qual um dia sonharam Petión, Bolívar e Artigas, uma América unida, grande e soberana.

Mas, apesar desses avanços, os Estados Unidos, que acredita ter como destino manifesto a posse sobre a riqueza e a vida de todos os que vivem abaixo do rio Bravo nunca desistiu de barrar esse sonho. Por isso, em 2002, o governo de Washington jogou pesado no apoio ao golpe contra Chávez. Mas, a bravata do empresariado local aliada aos EUA acabou debelada pelo povo nas ruas e pelo exército bolivariano. Foi uma derrota fragorosa que obrigou o governo estadunidense a pensar formas alternativas de destruição do chavismo e da ideia de integração. E, de qualquer forma, mostrava claramente que o tempo dos "golpes" não se acabara. Eles sempre poderiam voltar, se fosse do desejo do governo imperial.

Assim, dois anos depois, em 2004, Os Estados Unidos desestabilizavam a região do Caribe com a deposição do presidente eleito do Haiti, Jean-Bertrand Aristide. A partir desse golpe, o país foi invadido pelas tropas da ONU, incluindo aí soldados de países como o Brasil e a Bolívia, que, em tese, deveriam estar alinhados com a Pátria Grande e não com o Império. Já foi mais uma jogada de mestre dos Estados Unidos, pois além de tirar o Haiti da rota da esquerda, criou desconforto e desconfiança entre os governos latino-americanos. 

Depois, também no combate contra o avanço das ideias bolivarianas no Caribe, os Estados Unidos fomentaram o golpe em Honduras, no qual os militares locais sequestraram o presidente Manuel Zelaya, deportando-o para Costa Rica. Foi o retorno explícito de uma prática que a América Latina pensava já ter sido vencida. E, apesar de toda a gritaria da comunidade internacional Zelaya não voltou ao cargo e a constituição do país foi rasgada. Os militares golpistas realizaram eleições que foram consideradas ilegais, mas o presidente eleito no pleito imoral acabou sendo reconhecido e a vida seguiu. 

É que apesar dos percalços e das perdas a corrente bolivariana seguia arrastando dirigentes governamentais, movimentos e sindicatos. Transformações na saúde, na educação, nas matrizes energéticas, tudo tomava novo ritmo. Países como a Venezuela, Brasil, Bolívia, Equador, Paraguai, Uruguai, Argentina, Nicarágua, com governos considerados progressistas, iam - cada um no seu ritmo e com suas especificidades - mudando leis, nacionalizando riquezas, distribuindo renda. 
É claro que tudo isso não se deu sem contradições. A Venezuela não conseguia sair da matriz petrolífera, o Brasil se rendia ao agronegócio, o Equador excluía os indígenas e se aproximava das multinacionais do petróleo e da mineração, o Uruguai cedia aos transgênicos, a Argentina não atendia os trabalhadores. A batalha se dava também internamente em cada país. 

Então, em 2012, a fábrica de golpes apresenta um novo formato. E ele aparece no Paraguai, onde o presidente Fernando Lugo tentava - ainda que timidamente - dar combate ao latifúndio. Por conta de um conflito entre policiais e camponeses na região de Curuguaty, o qual terminou com 22 mortes, o legislativo nacional apresenta um pedido de impedimento de Lugo, acusando de omisso, e num processo relâmpago, eivado de ilegalidades, no dia 22 de junho,  o presidente constitucional é deposto pelo Senado paraguaio, numa votação que contou 39 votos a favor e 04 contra. De novo, a gritaria geral dos países latino-americanos e de outras partes do mundo não mudou a realidade. O golpe foi respaldado. Caia mais um governo articulado na ala dos progressistas.

No ano seguinte, em março de 2013, a onda bolivariana que embalara mais de uma década de transformações na América Latina, sofre mais um golpe. Morre o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que era o principal condutor desse processo. Com ele, desaparece muito da força carismática que carregava multidões e encantava governos. E, a partir daí, abre-se um flanco para que - tal e qual nas guerras de independência  - os governos até então alinhados aos sonhos de integração passem a atuar de forma mais individualizada. Chávez, o que puxava as orelhas, o que chamava para a boa direção, já não estava, e cada um tratou de cuidar de si. Mais um ponto para a águia, os EUA, que seguia não apenas à espreita, pronta para o bote, como ajudando no processo - inclusive financeiramente - de revitalização das entidades e organizações conservadoras nos países latino-americanos.

Em 2014, os ataques se concentraram na Venezuela, onde tentaram de todas as formas derrubar o governo de Nicolás Maduro. Ajudada pelos erros do novo presidente, a elite local - aliada dos EUA - produziu uma poderosa guerra econômica na qual os venezuelanos se viram sem produtos para consumir, com uma inflação galopante e com o dinheiro desvalorizado. O contexto de caos e carestias levou ao crescimento das forças conservadoras que acabaram vencendo as eleições legislativas em 2015, tirando a maioria do governo. 

Em 2015 também o Brasil foi sacudido por forte crise política que já se manifestava desde 2013, e que foi crescendo ao ponto de se tornar uma espécie de cruzada contra o PT. Apesar de o governo de Dilma Roussef jamais ter sido um obstáculo para os conservadores e para a elite local, essas forças atuaram fortemente no sentido de derrubá-la do poder. E, como numa ópera bufa, as tentativas de golpe legislativo - a exemplo do Paraguai - contaram com a participação desastrada do próprio vice de Dilma, Michel Temer. Até agora ainda caminha no Congresso Nacional o processo de impedimento da presidenta. E tudo isso num quadro que nunca se aproximou de qualquer mudança estrutural significativa. Um pouco de distribuição de renda, com o Bolsa Família, mais acesso à educação superior pelos pobres e um forte apelo ao consumo, com facilitação de crédito. Ou seja, nenhum risco para o capital.

Também em 2015 a Argentina deu o passo mais significativo, já que foi com a decisão popular: uma guinada para a direita, a partir da escolha de Maurício Macri para a presidência da nação. O jovem milionário, representante do atraso,  entrou chutando todos os baldes, com uma sede de mais de uma década. No primeiro dia depois da eleição, levantou as forças mais bizarras, que, num editorial de jornal, saudavam os velhos militares do tempo da ditadura. E, depois da posse, o próprio Macri tratou de mostrar sua inspiração, uma vez que nos primeiros dias nomeou ministros da justiça por decreto - o que é contra a lei - demitiu trabalhadores públicos, fechou veículos de comunicação, suspendeu programas nas TV públicas, fechou a TV Senado e tentou acabar com a Lei de Meios, que regula a comunicação. Dias depois, numa reunião do Mercosul, interpelou a representante venezuelana exigindo a liberdade de Leopoldo López, que ele chama de "preso político" e que a Venezuela entende ser um assassino. Na ocasião levou um cala-boca por parte da chanceler Delcy Rodriguez, que repudiou a ingerência, mostrou fotos da violência provocada por López e acrescentou: "Não nos surpreende que isso venha de uma pessoa cujo primeiro ato como presidente foi liberar torturadores". 

Agora, nos albores do ano de 2016, Macri assoma como o queridinho da direita latino-americana e terá como companhia os deputados venezuelanos da oposição, que também assumiram seus cargos provocando o governo, retirando quadros de Bolívar e de Chávez, mandando-os para o lixo. Sem contar o gesto absurdo do presidente da Assembleia Nacional, Henry Allup, que, durante o discurso de posse, se referiu ao governo passando a mão pelo pescoço, no gesto de degola. Cenas explícitas de violência e terror que são saudadas por todos os que querem de volta a explícita bota estadunidense. 

Esse é o cenário no qual se desenrola a velha luta de classe, a queda de braço entre um pequeno grupo que detém a riqueza e os meios de produção, e a maioria despossuída. Nesse embate, surpreendentemente, temos muita gente que faz parte do grupo dos despossuídos apoiando e saudando os representantes da nova/velha direita. Marx diria que é porque eles não sabem, estão com os olhos velados pela alienação, pela falta de conhecimento. Eu, modestamente, arriscaria dizer que hoje dificilmente seria possível não saber. Creio que estão mais para a servidão voluntária, como descreveu o então jovem Etienne de La Boétie, por volta do ano 1550, aqueles que, podendo ser livres, escolhem servir a um tirano apenas por algumas migalhas.

Grandes desafios se configuram no horizonte. Grandes desafios. Os adversários e os inimigos continuam os mesmos, mas os novos tempos exigem dos latino-americanos aquilo que exortava o grande mestre Simón Rodríguez: ou inventamos, ou erramos!