quarta-feira, 21 de agosto de 2024

O assédio moral é um projeto



Foto: Patrícia Krieger

O Sintufsc trouxe o professor e educador popular Emílio Genari para conversar com a categoria sobre o assédio moral, uma vez que o final da greve acabou por expor essa terrível chaga que atualmente dilacera os trabalhadores. Foi um momento bastante importante de reflexão para que os trabalhadores possam compreender qual o papel do assédio neste momento específico do modo capitalista de produção. 

Genari deixou claro que até pouco tempo o assédio moral era algo bastante pontual. Acontecia aqui e ali. O mais comum era a figura de um chefe autoritário capaz de cometer alguma violência verbal. Mas, com o passar do tempo, o que era uma violência ocasional passou a se conformar num projeto de controle dos trabalhadores. Segundo ele, o assédio moral é hoje parte da lógica do capital. É preciso pegar um trabalhador “para Cristo”, uma vítima em potencial, para desmontar e desestimular qualquer ação reivindicatória ou de protesto. “Hoje, os chefes são treinados para assediar moralmente, para desintegrar o trabalhador”. Assim, o trabalhador assediado vira um exemplo e faz com que os demais busquem distância daquela “morte em vida”. Um jeito bastante eficaz para evitar qualquer rugosidade no ambiente. 

Genari mostrou que os tempos atuais são geridos por um individualismo exacerbado. O sentido de comunidade e de pertencimento a um grupo foi esmigalhado. O sistema precisa que o trabalhador atue na solidão, sem criar laços. “Até pouco tempo, se um trabalhador era agredido ou assediado, logo os demais colegas se levantavam em protesto. Hoje não. A pessoa sofre sozinha e o colega finge que não vê. Isso destrói a pessoa completamente”. Ele deixou claro que a única saída é definitivamente desmontar essa prática na ação coletiva. Daí a importância do sindicato. Ressaltou que a batalha contra o assédio não passa por cartilhas nem por discursos, mas sim pela construção de uma resposta efetiva contra esse projeto do capital. 

O que ficou bastante claro é a necessidade de se compreender a trama urdida pelo capital para melhor controlar o trabalhador e recusar, de maneira prática, essa receita. Para isso há que se recuperar o sentido de coletivo, de comunidade, de solidariedade. Um trabalhador assediado precisa ser imediatamente protegido pela ação dos demais colegas. Daí também o cuidado que é preciso tomar com relação aos projetos de organização do trabalho que vão sendo apresentados pelo sistema e assumidos sem crítica. Um bom exemplo é a lógica do trabalho remoto. Sozinho, em casa, sem o olhar do colega, o trabalhador é uma presa em potencial do assédio moral. 

Agora, mais do que nunca, mais do que a denúncia sistemática desta violência cotidiana é preciso reordenar o sentido de comunidade. Um desafio e tanto que passa por compreender nos seus mais recônditos espaços, o sistema capitalista que domina e explora o mundo. 


domingo, 18 de agosto de 2024

O cabaré e as eleições


O brasileiro ama o futebol. Somos a pátria de chuteiras. E os donos do cabaré da bola ficaram mais fortes com a televisão. A bola tem mais audiência que as novelas. E esse povo precisa da TV para aumentar a bancada da bola no campo da política. Observem onde está o dinheiro e onde  estão os donos do cabaré na vida do esporte em Santa Catarina. E quem são os candidatos do cabaré nestas eleições de 2024? Liguem-se! Comentário do professor Nilso Ouriques no Programa Campo de Peixe, na Rádio Comunitária Campeche. 

Eleições em Florianópolis

Marquito e Cláudia


A sexta-feira passada deu a largada para a campanha política. É o tempo de eleger prefeitos e vereadores. Abre-se assim a caixa de Pandora, com as campanhas mais bizarras que se pode ter. Nenhuma novidade, sempre foi assim, mas, agora, com as tais das redes sociais, o alcance das propostas é bem maior. De certa forma, não muda nada, porque a maioria das pessoas está obnubilada pela sensação. Pouco importa o teor das propostas, a viabilidade delas, a verdade ou a mentira que escondem. O que vale é a melhor “performance”. O candidato tem de dançar, cantar, sapatear, escalar montanhas, atravessar canais, ter a postagem mais produzida no instagram, o vídeo mais descolado no tiktok. E aquilo que deveria ser um importante momento da democracia acaba sendo a explicitação da ditadura do capital. Afinal, quem tem mais recursos fatalmente terá o melhor desempenho nas redes. Também é bom lembrar que nem tudo é definido pelas novas tecnologias de comunicação, a boa e velha técnica da compra do voto igualmente faz seu estrago. Assim que a tal da “festa democrática” perde sua cor.

Em Florianópolis as pesquisas corroboram isso. Nunca uma prefeitura esteve tão envolvida em escândalos de corrupção com a polícia batendo quase todos os dias na porta de vereadores e secretários. Ainda assim, o atual prefeito lidera a intenção de voto. É que ele é bom de tiktok, dizem Pouco importa que o posto de saúde não atenda, que as escolas caiam aos pedaços, que o transporte coletivo seja uma droga e que não haja moradia popular. O bonde do cimento segue erguendo prédios e a turma acha isso bem legal.

No campo da esquerda não foi possível construir uma Frente. PSTU sai com chapa pura, com Carlos Müller. O PT decidiu sair em cabeça de chapa, com Lela, buscando, com alguns aliados, crescer à sombra do Lula. É incrível que acreditem nisso. A impressão que dá é que não estão preocupados com a cidade, mas apenas com o partido e sua performance. O PSOL, que tem o candidato com maior alcance eleitoral perdeu apoios que se colaram ao PT e teve de encontrar saídas dentro de sua própria bolha. Marquito tem um perfil bem marcado junto a questões ambientais - o que é importante para uma cidade como Florianópolis - e sua vice, Cláudia Barbosa, é ligada ao campo da cultura. Resta agora saber se conseguirão abrir-se às pautas que encarnam as demandas mais urgentes da população. Caso permaneçam no circuito das pautas pequeno-burguesas, não terão chance.

O grande desafio é conseguir trazer à tona - com propostas viáveis - os desejos da maioria, que se expressam na necessidade de uma saúde pública que não cause tanto sofrimento ao usuário, num transporte coletivo rápido, eficiente e à serviço da população, na possibilidade de morar com dignidade, numa educação de qualidade.

No que me diz respeito, ainda que reconheça os limites e as debilidades, assumo a campanha do Marquito e da Cláudia, do PSOL. Marquito foi vereador, conhece a cidade. Cláudia foi trabalhadora da prefeitura por décadas, conhece as entranhas da máquina. Torço para que a campanha cresça, abraçando as demandas factíveis da cidade, sem o papo liberal de desenvolvimento sustentável. Não há sustentabilidade no capital. É claro que um prefeito de uma cidade carcomida pelo cimento terá grandes desafios e precisará negociar com a classe dominante, mas é possível inverter prioridades como um dia fez a Frente Popular, com Grando e Afrânio.

Sei que as eleições não mudam a vida, mas elas são um momento rico de debate sobre a cidade e trazem alguma esperança.



sexta-feira, 16 de agosto de 2024

Não há limites para o capital


Foto: Ricardo Bufolin/CBG

No Cabaré da Bola os que mandam e exportam pé-de-bola deram uma parada no furdunço para ficarem de olho nas Olimpíadas e se surpreenderam com as vitórias dos atletas negros. Ah, deve ser dom, deus ou sorte! Será?  Encerradas as Olimpíadas os olhos se voltam para a mansão do Messi, que foi pichada por ambientalistas. Pois até os presidentes dos países (Argentina e Espanha) se envolveram na coisa. Bueno, não há limites para o capital. Ouçam o novo episódio do Cabaré da Bola, com Nilso Ouriques, no Programa Campo de Peixe, da Rádio Comunitária Campeche. (10.08.2024)


segunda-feira, 5 de agosto de 2024

Torcedor, um consumidor de ilusão


Enquanto tu sonhas com o amor ideal, o cabaré da bola está lotado de amores vãos. Ainda assim, o amor sem medidas ao futebol gera o maior tesão, um tesão popular. Na vida, as pessoas vibram por seus ídolos que, por sua vez, vivem à larga no cabaré. É corrupção, é traição, é o assalto ao estado, e também uma espécie de trampolim para a política, espaço dos ricos. Os pobres só espiam pelas frestas, esperando ser como seu ídolo. Ouça mais um episódio do cabaré da Bola, com Nilso Ouriques.




Os tempos atuais



Está difícil entender o mundo. E, paradoxalmente isso acontece num tempo em que o que mais circula é a informação. O advento das redes sociais permite que qualquer pessoa munida de um celular possa disseminar informações em fração de segundo e para milhões de pessoas. O que menos importa nesse caso é a verdade dos fatos. O que vale é a versão. E, no geral, o que mais sucesso faz são as mentiras, armações, falsificações e sensações desprovidas de contexto. Vale tudo por um joínha, o dedo em positivo, o coraçãozinho.

Essa desvairada caçada de seguidores ou cliques tornou o mundo um lugar difícil de ser compreendido já que a leitura apurada, a análise complexa, o texto totalizante são coisas que perdem de goleada diante da informação ligeira que tem como base coisa nenhuma além do “é o que eu acredito” dos escreventes. Não bastasse isso a dissociação cognitiva causada pelo excesso de rolagem de inutilidades no celular leva as pessoas a não entender o que está dito, fazendo com que misturem alhos com bugalhos. 

Nesse universo turbulento quem ganha a guerra do discurso é o nosso velho conhecido sistema capitalista de exploração do mundo e das gentes. Quanto mais despreparadas estiverem as cabeças, mais fácil dominar.  Não é sem razão que impera no mundo a lógica liberal, mesmo na chamada esquerda. Tenho visto, estupefata, gente conhecida, lutadores sociais, jornalistas, políticos, assumirem posturas inimagináveis como, por exemplo, acreditar que a atual vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, possa ser um grande avanço para a democracia no mundo visto que é mulher, negra e pode tornar-se presidente do império. É aterrador, porque, inclusive, não se pode alegar desconhecimento. 

O Partido Democrata é uma máquina de guerra e atualmente apoia e financia um genocídio. Como Kamala pode ser um avanço para a democracia? De que democracia fala essa gente, por deus? O fato de ser negra e mulher é suficiente para que aceitemos uma dirigente que aplaude e promove o massacre de crianças no Iêmen, na Palestina, na Somália e em tantos outros espaços onde os EUA intervêm? 

Tivemos na Universidade Federal de Santa Catarina uma situação aberrante também quando uma Cátedra que leva o nome da primeira deputada negra do estado, Antonieta de Barros, se manifesta publicamente alegando que quem defende o povo palestino é racista e antissemita. O que é isso, minha gente? E quem assina a nota são pessoas que estudam, que têm conhecimento sobre a realidade. Como explicar isso senão observando que é a defesa de uma ideologia? Ideologia de direita, de defesa do capital. 

Agora a bola da vez é a Venezuela. Num átimo estamos cheios de comentaristas sobre o país irmão, do qual não conhecem nada além do que reproduz a Globo, a Record ou as redes sociais. É uma infinidade de bobagens que nos avermelham a cara, não por comunistas, mas por vergonha. Desconhecem a história, não compreendem a geopolítica, ignoram os fatores locais, surfam unicamente na aparência, e caso sejam confrontados com uma análise mais aprofundada, a reação é não ouvir, não ler, não dar bola. “Vi no instagram, me mandaram no uatizapi” solapam anos e anos de estudo sobre dada realidade. É desesperador. 

Diante deste turbilhão nos resta seguir. Tudo o que temos é a luta contra o capital que tudo esmaga, inclusive a capacidade de raciocinar. E para isso, seguiremos estudando, observando as entranhas do monstro e das vítimas, analisando o que se esconde, sempre numa perspectiva crítica é claro, porque o estudo em si, sozinho, não garante nada também. Uma hora dessas vem um novo pachakuti. É o que me mantém no prumo! P´alante! 



segunda-feira, 29 de julho de 2024

Desvelar o que se esconde


 Mais um episódio do Cabaré da Bola. Há uma necessidade urgente de refletir o futebol brasileiro e latino-americano. E no cabaré da bola acontecem coisas que ninguém pode saber. Há ali uma filosofia clara: o que acontece no cabaré, fica no cabaré. A proposta desta série de áudios é mostrar tudo o que acontece nesse imenso e obscuro edifício. As sombras e as luzes. Comentário de Nilso Ouriques no Programa Campo de Peixe, da Rádio Comunitária Campeche. (27.07.2024)