terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Lula cria empresa para administrar Hospitais – a lógica do lucro chega à saúde pública


Enquanto era carregado nos braços do povo brasileiro em emocionante despedida, o presidente Lula deixava sobre a mesa de trabalho uma medida provisória que terá conseqüências dramáticas para a maioria da população empobrecida do país. Nesta medida, que tem força de lei com implantação imediata, Lula golpeia de morte uma luta que foi travada ao longo de todo seu mandato contra a privatização dos Hospitais Universitários, responsáveis hoje pela pesquisa de ponta na saúde e pelo atendimento gratuito à população. A medida provisória autoriza a criação de uma empresa pública, de direito privado, chamada de Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A. - EBSERH, que, vinculada ao Ministério da Educação, poderá prestar atendimento à saúde e servir de apoio administrativo aos hospitais universitários.

Numa primeira mirada isso pode parecer ótimo e muitos perguntarão como alguém pode ser contra uma idéia como essa. Mas, observando as letras pequenas da lei, pode-se perceber o grau de perversidade que está contido nesta MP. Em primeiro lugar é bom contextualizar o problema. Desde há alguns anos que o Tribunal de Contas da União vem observando algumas ilegalidades nos HUs. Uma delas é a contratação indiscriminada de trabalhadores através de Fundações. Mas, esta foi a forma encontrada pelas administrações para dar atendimento nos HUs, uma vez que não havia concurso público para novas contratações e muito menos vontade política dos reitores em enfrentar o problema de frente. O movimento de trabalhadores sempre se colocou contra essa forma de contrato porque acabava criando duas categorias dentro dos hospitais, a dos servidores públicos, com todos os direitos garantidos e a dos contratados, sempre na berlinda por conta de serem celetistas. Não bastasse essa discriminação funcional, ainda havia intensa rotatividade prejudicando o bom andamento dos trabalhos.

A solução imediatamente apontada pelo governo Lula foi a regularização das fundações privadas dentro das universidades, o que provocou um grande movimento contrário nas Instituições Federais de Ensino Superior. Isso porque, ao longo destes anos, foram divulgados inúmeros escândalos envolvendo as fundações em várias IFES, mostrando o quão funesto era esse sistema de burlagem da lei, no qual as fundações captavam recursos privados para serem aplicados nas universidades, em operações muitas vezes envoltas em irregularidades que beneficiavam pessoas em vez das instituições.

Batendo de frente com o movimento docente e técnico-administrativo o governo do presidente Luis Inácio recuou e, mais tarde, lançou nova ofensiva com a proposta de uma Fundação Pública de Direito Privado que assumiria o papel de todas as fundações já existentes, com possibilidade, inclusive, de administrar as instituições de Educação, Saúde e Cultura. Isso, na prática, era privatizar o sistema público de atendimento à população. Mais uma vez os movimentos de trabalhadores dentro das instituições se mobilizaram e empreenderam longa luta contra esse projeto.

Mas, agora, no apagar das luzes do seu governo, em pleno final do ano, quando os trabalhadores públicos, na sua maioria, estão em férias, Lula cria uma empresa, de administração privada, para administrar os hospitais universitários. A estatal será uma sociedade anônima e terá seu capital oriundo do orçamento da União, portanto pertence à nação. Mas, como é de direito privado, toda a lógica administrativa se prestará a busca do lucro e da produtividade. Coisa que sempre foi combatida pelos trabalhadores, pois, na saúde, não há como trabalhar com produtividade. O que pode ser produtivo num hospital? A doença...

No corpo da medida provisória que cria a estatal de direito privado, o governo promete a prestação de serviços gratuitos de assistência médico-hospitalar e laboratorial à comunidade, assim como a prestação, às instituições federais de ensino ou instituições congêneres, de serviços de apoio ao ensino e à pesquisa, ao ensino-aprendizagem e à formação de pessoas no campo da saúde pública. De novo, isso parece muito bom. Mas, como é uma empresa de direito privado, sua meta é o lucro e aí se inserem as armadilhas.

Como seu papel será o de administrar unidades hospitalares, abre-se o caminho já apontado pelo governo de separação dos hospitais-escola do Ministério da Educação, passando ao campo da Saúde. Pode parecer lógico, mas não é. Os hospitais universitários estão hoje visceralmente ligados à universidade. Têm como função servir de espaço de ensino para os estudantes das mais variadas áreas médicas. Todos os trabalhadores ali lotados estão igualmente ligados à universidade. Com a nova empresa e sua lógica administrativa privada, isso muda. Os trabalhadores poderão ser contratados pela CLT, sem acarretar qualquer vínculo com o Estado e estarão submetidos a metas e produtividade. Isso igualmente cria uma profunda divisão na categoria, com a presença de dois tipos de trabalhadores, os públicos e os privados, ocasionando conflitos e freando as lutas. Segundo a medida, os trabalhadores especializados, ainda que CLT, passarão por concurso, mas o pessoal de nível técnico-administrativo poderá ser contratado sem qualquer concurso e por tempo determinado com contratos temporários. Esta era uma vontade muito antiga do governo, pois, com isso, consegue superar qualquer movimento grevista que venha a ser construído.

Na medida provisória está bem claro que a nova empresa poderá incorporar os trabalhadores que já estão nos quadros dos hospitais assim como os bens móveis e imóveis necessários para o início das atividades. Também diz a MP que a nova estatal estará autorizada a patrocinar entidade fechada de previdência privada, nos termos da legislação vigente, o que significa a abertura para o atendimento aos planos de saúde, também um antigo desejo do agora ex-presidente.

Para os reitores e provavelmente para a maioria dos trabalhadores que ainda estavam vinculados às Fundações, esta medida vem como uma luva para seus interesses. Os reitores poderão seguir contratando trabalhadores sem concurso, resolvendo a questão da terceirização. Além disso, também poderão captar recursos privados de forma mais tranqüila, sem precisar usar subterfúgios ou ilegalidade. Também poderão cobrar uma administração mais enxuta, aos moldes da privada, estabelecendo metas de produtividade. Em suma, tratando a saúde da população como mais uma mercadoria. Os trabalhadores terceirizados, que hoje estão sob a ameaça de perder o emprego, ficam mais tranqüilos e tudo segue dentro da “ordem”. Com isso não haverá mais a necessidade de lutar pelo concurso público.

Para quem faz a luta nas universidades este foi um duro golpe. A criação da nova empresa pública estilhaça uma luta de anos pela manutenção dos Hospitais Universitários 100% SUS. Com o artigo que permite a contratação de previdência privada, os HUs poderão, enfim, criar as famosas duas portas de entrada: uma para os que dependem da saúde pública e outra para os que têm plano de saúde. Pode parecer que isso está bem, que não vai mudar em nada a vida daqueles que hoje dependem do SUS e que sempre encontraram guarida nos HUs, mas, quando um hospital passa a se mover dentro da lógica privada, tudo muda. É certo que as pessoas vão sentir o peso desta medida bem mais na frente, inclusive, esquecendo como isso aconteceu. Mas, para quem está na luta pela universidade e pela saúde pública é hora de mostrar os funestos efeitos que virão.

É sempre difícil para os lutadores sociais serem os “arautos da desgraça”, aqueles que estão sempre a ver problemas e apontando as críticas. Mas, é o compromisso com a vida digna para todos que leva a essa prática. Nosso papel é mostrar as graves consequências que advirão desta medida e preparar o terreno para as lutas que se farão necessárias quando a privatização da saúde tomar conta de um dos últimos bastiões do atendimento público: os hospitais universitários.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Para o ano...


E eis que vem um ano novo, embora nada de novo venha... Nos tempos antigos, os povos celebravam a cada estação. Havia o tempo de plantar, de colher, de descansar e de amar. Em cada equinócio e solstício se dançava e festejava, cantando com os deuses, sempre muitos...


Então vieram outras crenças, outros modos de vida, veio a dominação da igreja, um deus único, as festas piedosas... As gentes esqueceram da alegria, a simples e doida alegria de se estar vivo.


Neste primeiro de ano eu desejo que todos possam recuperar essa antiga tradição, de se celebrar em cada momento da vida, de se cantar aos deuses, aos tantos deuses que por aí circulam no coração das gentes. Essas nossas divindades inventadas pelo nosso medo e pela angústia de se saber mortal...


No calendário romano é o deus Jano que abre a fieira de deuses, o deus com duas faces, o guardião dos portões. O deus que é sombra e luz, verdade e mentira, amor e ódio, início e fim, um deus dialético, mesclado de tudo o que é humano.


Aqui na nossa Abya Yala celebra-se com Inti, o deus sol, e outros tantos das mais variadas culturas. E aqui, como nos tempos antigos, ainda se baila nos equinócios e solstícios em grandes festas populares. É só uma celebração, uma orgiástica celebração desta vida que temos, para a qual somos chamados a plantar, colher, descansar e amar.


Em 2011 nada vai mudar se não nos pusermos a caminho, porque a estrada se faz assim, ao andar... Então, eu os convido ao borbulhar da champanhe, ao doce da cana, ao perfume do vinho ou ao simples gosto da água pura. Eu os conclamo para o ritualístico momento do primeiro momento dos restos de nossas vidas, neste primeiro de janeiro e em cada amanhecer.


Que venham todas as dádivas e todos os obstáculos... Nós os enfrentaremos com riso, prazer e luta!

Uma rua perdida em Florianópolis


Gosto da minha rua de areia, na qual afundo meus pés. Gosto do cheiro doce de dama da noite que se esparrama quando o dia vai embora. Encantam-me os risos de criança que se fazem ouvir a toda hora. Há sempre algum menino a brincar, jogando bola, empurrando carrinho, saltando de bicicleta. Há sempre uma guriazinha a saltitar, pulando corda, gargalhando, jogando taco. Estão sempre pela rua, em liberdade, com os pés no chão e cabelos ao vento.

Pela rua também circulam, soltos e livres, os cachorros. Vez ou outra algum deles encrespa e ataca, com os dentes arreganhados, mas uma voz de comando os aquieta. São inofensivos. No geral andam por ali sem maiores alardes. Alguns nos seguem até o mercado, como se fossem velhos companheiros. Também passeiam pela areia as galinhas, crias do Luis, e entram pelas casas sem causar qualquer turbação. Todo mundo as respeita e algumas até já têm nome. Duvido que o Luis possa matá-las um dia para comer.

Pelos muros igualmente voejam as grandes corujas, sempre alertas para o caso de algum gato pular e transformá-las em almoço ou jantar. Nos fios de luz posicionam-se os passarinhos, de vários tipos, com seus cantos inebriantes. E pela diversidade de árvores outros tantos oferecem seus trinados nestes dias quentes de verão.

Minha rua tem essa aura de rua de cidade pequena, na qual os vizinhos se conhecem, se cumprimentam com sorrisos, frases de cortesia e pedem arroz ou linha branca. Tem também muitos buracos por onde as bicicletas saltitam, malucas. E, quando chove, formam-se pequenos lagos em alguns pontos, nos quais alguns carros velhos acabam ficando. Quando a noite vem pode-se ficar admirandos os vagalumes e seu bailado, enquanto a gurizada se junta na frente de alguma casa para conversar e dar altas risadas.

A minha rua é assim, ainda não contaminada pelo ideia do progresso. Contam alguns que já vem vindo o calçamento e quando penso nisso, entristeço demais. Com o calçamento lá se vão os jogos de bola e os pés afundados na areia. Tomara que demore... tomara que demore....


segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

A Música e A Noite

O ouvido, o órgão do medo, pôde desenvolver-se tanto como se desenvolveu apenas na noite e na penumbra de cavernas e bosques sombrios, consoante o modo de viver da época do medo, isto é, a mais longa época da humanidade: no claro, o ouvido não é tão necessário. Daí o caráter da música, uma arte da noite e da penumbra. (Nietzsche)

A propósito....

Entre as coisas que podem levar um pensador ao desespero está o conhecimento de que o ilógico é necessário para o homem e de que do ilógico nasce muito de bom. Ele está tão firmemente implantado nas paixões, na linguagem, na religião e em geral em tudo aquilo que empresta valor à vida, que não se pode extraí-lo sem com isso danificar irremediavelmente essas belas coisas. São somente os homens demasiado ingênuos que podem acreditar que a natureza do homem possa ser transformada em uma natureza puramente lógica; mas se houver graus de aproximação desse alvo, o que não haveria de se perder nesse caminho! Mesmo o homem mais racional precisa outra vez, de tempo em tempo, da natureza, isto é, de sua postura fundamental ilógica diante de todas as coisas.
(Nietzsche)

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Mais lutas na Grécia

As cenas da greve na Grécia mostram o nível de descontentamento da população com relação ao governo que se faz de surdo aos desejos de quem o elegeu. Desde que os primeiros sintomas da crise começaram a aparecer, o governo principiou a colocar em prática o mesmo velho receituário de tirar do povo o valor da conta que servirá para pagar aquilo que uma pequena parcela da sociedade usufruiu. Os movimentos de trabalhadores, as paralisações e as greves gerais não são coisas que brotaram do nada, como faz parecer a mídia comercial brasileira, que se limita a mostrar as cenas de “violência” do povo. Toda essa luta é fruto de uma longa batalha das gentes gregas contra o que ficou configurado como uma nova onda de acumulação capitalista.

Muito dos problemas que o país enfrenta hoje é fruto das escolhas equivocadas do governo desde o final dos anos 90, culminando com os fabulosos empréstimos recebidos para a construção de infra-estrutura para as olimpíadas de 2004. O dinheiro rolou, poucos encheram os bolsos, obras faraônicas foram feitas e muito pouco segue sendo aproveitado. O povo grego agora está sendo chamado para pagar a conta, cobrada com juros astronômicos pelos bancos “amigos”. A solução encontrada pelo governo é fazer novos empréstimos, o que elevará ainda mais a dívida, aliado a uma série de cortes unicamente na carne dos trabalhadores.

A gente grega é uma gente valente. As centrais sindicais, a despeito de todos os problemas e diferenças que historicamente têm, seguem se expressando e têm conseguido juntar as gentes nas lutas de rua. São manifestações impressionantes, que levam milhões de pessoas para as grandes passeatas. São como uma força da natureza, sem medo e sem hesitações. As gigantescas caminhadas são formadas por grupos muito bem preparados para os embates. Sabedores da brutal repressão policial, as pessoas já saem de casa com suas máscaras de gás e uns enormes porretes de madeira. Nas passeatas, avançam de braços enganchados, formando uma corrente humana de difícil desmanche. A grande maioria é formada por jovens. Eles sabem que, ou cuidam do futuro, ou estão fritos. Mas também se pode ver os velhos trabalhadores, gente das periferias que não aceitam mais pagar pelos ricos.

As primeiras medidas do chamado “ajuste” do governo começaram ainda em 2009 e em 2010 as coisas foram se aprofundando. O Congresso Nacional votou leis que permitem o arrocho dos trabalhadores, mudou a previdência, fez reforma trabalhista e tudo isso sob protestos das gentes. A cada sessão, a imensa praça Syntagma, em frente ao Parlamento, se enche de gente a dizer “não”. Mas, lá dentro ninguém ouve. Nem lá dentro, nem nos palácios. As leis seguem sendo aprovadas mesmo que toda a Grécia se levante em imensas manifestações. Não é sem razão que o povo seja obrigado a atuar de forma mais incisiva diante desta incapacidade auditiva crônica dos governantes.

Como bem diz Enrique Dussel, a sede do poder não está em quem está no posto de mando. Ela reside no povo organizado que decide sobre as coisas. E o povo grego já decidiu que não quer pagar essa conta. Por isso toda semana eles enchem as ruas com suas impressionantes e organizadas passeatas. Esta semana um ministro foi ferido. A cena correu o mundo como a dizer da “selvageria” do povo. Mas os atos infames destes ministros não são registrados pelas câmeras ávidas de espetáculo.

Eu andei com o povo grego pelas ruas de Atenas, atenta às vozes e aos reclamos. Eu vi o rosto inflamado de uma juventude valente e, no meio da massa de gente, que irrompe pelas avenidas da capital pode-se perceber, em construção, a figura de tantos Alexandros Panagulis, o inesquecível lutador grego que, em 1968, tentou matar o ditador Georgios Papadopoulos. “Eu não queria matar um homem, e sim um tirano”, disse Alekos, depois de ser preso e passar por terríveis torturas. Nascido nas imediações de Atenas, Alekos era um destes meninos inconformados com as injustiças, com a guerra, com a ditadura. Hoje, tal como nos terríveis tempos da ditadura militar na Grécia (de 1967 a 1974), o povo afirma o seu “não” a ouvidos moucos. Mas, tanto naqueles dias como agora, o cerco popular foi apertando e as revoltas devolveram à Grécia ao povo. É nisso que as entidades de trabalhadores apostam. Na capacidade do povo grego de superar todos os entraves e, mesmo sob a mira das armas e da repressão, caminhar na direção da soberania.

O governo socialista da Grécia atual vai nadando contra a corrente popular, cada dia mais afastado dos desejos de sua gente. Aplicou reformas, diminuiu direitos e agora prepara-se para votar o orçamento do ano de 2011, com mais cortes nos serviços públicos e arrocho salarial. Os parlamentares insistem em dizer que isso é necessário, porque se não for assim, a Grécia não recebe o último lote do empréstimo de mais de 100 bilhões de euros. Mas as gentes sabem muito bem o que significam mais dívidas. A conta fica sobre suas mesas. O grito na Grécia, desde 2009 é: Que os ricos paguem! Ninguém do poder parece ouvir, mas chega um dia em que a casa cai...

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Só jornalista!


Outro dia, numa dessas atividades acadêmicas fui confrontada com uma situação da qual quase não me lembro, mas que outras pessoas fazem questão de lembrar. Não sou professora. Convidada que fui para dialogar com um aluno sobre seu projeto de mestrado que trata do povo boliviano, lá fui toda serelepe, porque gosto de saber que na academia ainda tem gente que se preocupa em estudar coisas que verdadeiramente interessam, como neste caso, a retomada da identidade do povo aymara e a proposta do Sumac Qamaña (o bem viver).

Então, foi a vez de me apresentarem. Como sempre eu abrevio a apresentação. Elaine Tavares, jornalista. Ao que a professora responsável pela atividade redargüiu, torcendo o nariz: “- só jornalista?” Pois é. Sou isso. Só jornalista. Nem doutora, nem professora, nem coisa nenhuma mais que jornalista. Talvez, para a academia, coisa menor. Mas, para mim, coisa maiúscula. Sou jornalista, destas que pensa o mundo, que narra, que contextualiza, que estuda a história, que busca nexos, que caminha com os empobrecidos, que rastreia a vida das gentes, que opina, que interpreta, que se emociona, que sente raiva, que investiga.

Sou jornalista. E é bom repetir isso. Porque, afinal, esse fazer humano anda tão desgastado. Sou jornalista e me compraz esse comprometimento com a vida mesma, essa coisa sublime que é decodificar os discursos prolixos e compartilhar o conhecimento com as pessoas, doutoras ou não. Encanta-me encontrar alguém na rua que, sabendo da minha condição de jornalista diz: “gostei daquele texto teu. Tão `simplinho´ que eu entendi tudo”. Esse é meu prêmio, minha estatueta de ouro. Quando as palavras que eu faço nascer caminham nas gentes. 

Dentro da universidade parece que não importa muito o que a gente faz, e sim os títulos que temos. Isso às vezes incomoda, mas é só um segundo, porque nos faz lembrar a eterna rixa entre professores e técnicos, que não acaba nunca e que é tão burra. Mas, enfim, para aqueles que realmente importam, que são os estudantes que auscultam a vida real, pessoas como eu ainda têm valor. Não sou professora, nem doutora, e isso não me dói. São as escolhas. Sou jornalista, só jornalista, e isso é muito bom!