terça-feira, 29 de junho de 2010

Estados Unidos prendem 10 supostos espiões russos, entre eles, uma jornalista


Por Eva Golinder - EUA

Na semana passada o presidente Barack Obama compartilhava uma típica comida "americana" com o presidente da Federação Russa, Dmitri Medvédev. Entre hambúrgueres e cocas-cola, os dois chefes de Estado sorriem e proclamam sua relação "estável" e "melhor do que nunca". Medvédev até enviou pelo Twitter as fotos de seu agradável almoço com o seu par estadunidense. Não esperava que, dias depois, a Guerra fria ressuscitasse.

O Departamento de Justiça dos Estados Unidos anunciou a prisão de 10 supostos “espiões russos”, a maioria deles estadunidenses acusados de receberem financiamento do governo russo para executar operações de “inteligência”. Segundo o governo eles teria violado a lei FARA (Foreign Agent Registration Act–Ley, de Registro de Agentes Estrangeiros), que regula e monitora todos os cidadãos ou residentes estadunidenses que recebem financiamento de um governo estrangeiro para fins políticos ou propagandístico no país.

Até este momento, os dez prisioneiros não foram acusados de espionagem, mas sim de haver “conspirado para atuar como agentes estrangeiros sem estarem registrados sob a lei FARA".

Entre os detidos está uma jornalista de Nova Iorque, de origem peruana. Vicky Peláez escrevia para o jornal El Diario/La Prensa, periódico em idioma espanhol mais lido na Grande Maçã. Ela era uma das poucas jornalistas hispânicas que criticava a política de Washington para a América Latina, e buscava uma visão equilibrada nas suas reportagens sobre a Venezuela e outros países da região que normalmente são muito criticados pela imprensa estadunidense.

Até agora nenhuma organização internacional que defende jornalistas e a liberdade de expressão, como, por exemplo, o Comitê para Proteger os Jornalistas (CPJ), a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), ou os Repórteres Sem Fronteira (RSF) fizeram declarações sobre a prisão.

Peláez foi levada para a cadeia junto com o seu marido, Juan Lázaro, nativo do Uruguai, no último domingo em sua casa no bairro de Yonkers, arredores de Nova Iorque. Segundo o Departamento de Justiça, Peláez é acusada de ter recebido dinheiro de um representante do governo russo no dia 14 de janeiro de 2000, enquanto visitava um país da América do Sul. Supostamente, segundo a denúncia, o seu marido também recebeu um pacote de dinheiro de um agente russo no dia 25 de agosto de 2007. Segundo o expediente, "apenas dias depois de regressar a Nova Iorque, pagou quase 8 mil dólares em impostos que devia ao governo estadunidense”.

Então, recebeu ela dinheiro da Rússia para pagar seus impostos nos Estados Unidos?

O expediente entregue pelo Departamento de Justiça revela que a sede de inteligência russa em Moscou havia enviado uma mensagem a dois dos detidos. A mensagem dizia que sua missão principal era "buscar e desenvolver vínculos com os círculos políticos nos Estados Unidos”, e logo, enviar informes. Alta espionagem?

Agentes do FBI detiveram a Richard Murphy e Cynthia Murphy na residência do casal em Montclair, Nova Jersey, no domingo passado. Também foram presos Anna Chapman, em Manhattan; Michael Zottoli e Patricia Mills, em Arlington, Virginia; Mikhail Semenko, em Alexandria, Virginia; e Donald Howard Heathfield e Tracey Lee Ann Foley na sua casa em Boston. Estão ainda buscando um suspeito adicional, Christopher R. Metsos, que parece ter escapado.

Nove dos 10 detidos também foram imputados por “lavagem de dinheiro”.

Na semana passada, um documento publicado sobre uma agência estadunidense, National Endowment for Democracy (NED), revelou que entre 40 e 50 milhões de dólares foram entregues a grupos políticos na Venezuela, gente que se opõe ao governo de Hugo Chávez. Segundo informes divulgados desde 2002, distintas agências estadunidenses e europeias, como a USAID, NED, Freedom House, Departamento de Estado, Comisão Europeia e outras, financiaram partidos e grupos políticos na Venezuela para "acabar com o governo de Chávez", incluindo aí o golpe de estado em abril 2002.

Não obstante, quando o governo venezuelano acusou (mas não levou para a cadeia) grupos e indivíduos que recebiam estes fundos, de serem agentes estrangeiros, o governo estadunidense e as "defensoras" internacionais dos direitos humanos o acusaram de ser "ditatorial", "repressor" e "violador" dos direitos básicos dessas pessoas que recebem dinheiro de potências estrangeiras.

Na semana passada, o presidente Evo Morales, da Bolívia, também acusou a USAID de financiar atividades de desestabilização em seu país, alertando a Washington que sua agência estatal poderia ser expulsa do país andino.

Em Cuba, Alan Gross, um empregado de uma contratada da USAID, Development Alternatives Inc (DAI), foi detido em dezembro de 2009 e acusado de espionagem e subversão. Trazia equipamentos de satélite e de alta tecnologia ao país caribenho para entregar a grupos de contrarrevolução.

Na Venezuela, as agências internacionais parecem estar envolvidas em grandes redes de lavagem de dinheiro, junto com seus "sócios" venezuelanos. Entram com milhões de dólares em efetivo no país, sem fiscalização, para assim, fugirem do controle de câmbio de moeda estrangeira que existe na Venezuela, a fim de evitar atos ilícitos e fuga de capitais.

As leis eleitorais na Venezuela proíbem o financiamento externo de campanhas políticas no país. Não obstante, Washington viola as mesmas leis que procura respeitar no seu território.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Lindo Elvis...

Encontrei no You Tube essa beleza de canção do velho Elvis...
In the Ghetto
Aí vai a tradução:
Enquanto a neve cai
Em uma fria e cinza manhã de Chicago
Um pobre pequeno bebê de uma criança nasce no gueto
E sua mãe chora
Porque se existe uma coisa de que ela não precisa
É de outra boca faminta para alimentar no gueto
Então pessoas, vocês não entendem que a criança precisa de uma mão solidária?
Ou ela crescerá para ser um jovem homem faminto um dia
Dê uma olhada em você e em mim, nós estamos tão cegos para enxergar?
Nós simplesmente viramos nossas caras e olhamos o outro lado?
Bem, o mundo gira
E um pobre pequeno garoto com um nariz escorrendo
Toca na rua enquanto o vento frio sopra no gueto
E sua fome apertaEntão ele começa a vagar nas ruas à noite
E ele aprende como roubar e ele aprende como lutar no gueto
Então uma noite em desespero um jovem homem desaparece
Ele compra uma arma, rouba um carro, tenta fugir mas ele não chega longe
E sua mãe chora
Enquanto uma multidão se amontoa em volta de um irritado jovem homem
Caído na rua com uma arma em suas mãos no gueto
E enquanto seu jovem homem morre
Em uma fria e cinza manhã de Chicago
Outro pobre pequeno bebê de criança nasce no Gueto
No gueto, no gueto


terça-feira, 22 de junho de 2010

Valor de uso, quê?...



Ali estava eu, enredada nos livros, tentando entender a diferença entre valor de uso e valor de troca. Marx, Engels, Ludovico Silva, Lenin, Rosa... A cabeça fervilhando em idéias. Então, do nada, ela foi escalando pelas minhas pernas. Nenhum respeito para com aqueles velhos parceiros que tentavam melhorar a minha compreensão sobre o mundo capitalista, predador.

Sem medida, ela foi mordendo meus dedos, arranhando o casaco, fincando as unhas na minha cara. Qualquer tentativa de deixá-la quietinha no colo era logo rechaçada com um movimento brusco, um pulo, uma desenfreada alegria. Era a gata que me tem, a Bartolina Sisa, bebezinho de pouco mais de dois meses. Pedaço de vida insuportavelmente alegre. Criança ainda, ela só quer brincar.

Então eu fiquei a pensar sobre o valor de um gato. Será valor de uso ou de troca? Terá alguma utilidade? “Esses bichos não servem pra nada”, me diz um amigo. Logo, não tem valor? Ela, alheia às elucubrações filosóficas que giravam na minha cabeça, só me olhava com seus olhos graúdos e me convidava à brincadeira. Nada de Lenin, nem de Marx. Só aquele saltitar inconsequente, infantil, alucinado. Corre aqui e ali, esconde-se sob a cadeira, pula no colo, sobe nos ombros, salta pela mesa, come os óculos, mastiga o cabelo e sai correndo. Mais um minuto e volta, e tudo de novo.

Impossível seguir estudando. Alguém ali exigia um tempo. Queria essa delícia do nada fazer, da risada cristalina, da inefável doçura, do tempo parado na alegria. As patinhas vez ou outra se transformando em afiadas garras ao estilo Wolverine. E esse jeito gato de ser, tão majestoso, tão cheio de si, tão imponderável.

Assim, em nome da Bartolina, dei um tempo ao velho Marx. Gato não tem valor, nem de uso, nem de troca. Gato é isso, pura graça. E graça no sentido teológico, como momento de absoluto encontro com o sagrado.


quarta-feira, 16 de junho de 2010

Estudantes de Porto Rico em luta pela universidade pública



Nestes tempos de Copa do Mundo, quando o planeta inteiro vira uma bola e as emissoras de televisão dão destaque aos mínimos fazeres dos craques do futebol, um pequeno país do Caribe, a menor das ilhas das Antilhas Maiores, vive um movimento de luta que já dura quase dois meses, mas permanece no silêncio da mídia. E não é para menos, Porto Rico é um pedaço de terra agregado dos Estados Unidos, um país dominado e subjugado, sem direito a gritar por liberdade, apesar de oficialmente chamar-se “estado livre associado”. Conquistado pela Espanha em 1493, o pequeno país foi ocupado militarmente pelos Estados Unidos em 1898, trocando de dono desde então. Porto Rico foi colônia até 1952, quando passou a ser considerado um estado autônomo, tendo direito inclusive a eleição de seus dirigentes. Essa “concessão” por parte dos Estados Unidos não aconteceu por bondade. Ela foi alavancada pela luta do povo que se levantou em rebelião no chamado “grito de Jayuya”. Por conta desta luta veio autonomia, mas ela existe só na aparência, uma vez que a moeda, a defesa, e as políticas de relações exteriores e comerciais de Porto Rico são totalmente comandadas pelos Estados Unidos.

A luta da gente de Porto Rico por independência nunca cessou. Vem desde os Tainos, povos originários que foram dizimados pelos espanhóis, e segue até hoje. Muitas foram as revoltas e revoluções, todas abafadas militarmente pela metrópole colonial. Os Estados Unidos realizaram vários plebiscitos para que a população escolhesse entre ser livre, permanecer como estado autônomo ou se integrar à nação estadunidense, sendo o último deles no ano de 1998. A maioria decidiu por permanecer como está, mas este resultado é contestado pelas gentes que lutam por libertação. “É preciso que se compreenda como se forma essa maioria, o poder financeiro que está por trás, a despolitização causada pela própria condição de colônia”. A velha Borinquen (nome originário que significa ilha do senhor valente), de 176 quilômetros de comprimento por 56 de largura, que foi uma das primeiras ilhas vistas por Cristóvão Colombo, volta e meia assoma em meio ao domínio estadunidense e as gentes se lembram quem são. Então ressurgem as lutas de libertação.

Os estudantes
Em todo o mundo os estudantes são quase sempre a ponta de lança nas revoltas e revoluções. Por estarem num ambiente de conhecimento e por possuírem a deliciosa rebeldia juvenil, eles abrem janelas nos muros escuros da opressão e saltam por elas, com suas bandeiras e utopias. Assim tem sido em Porto Rico desde que o país foi entregue aos Estados Unidos como despojo de guerra. Ocupado militarmente, Porto Rico precisou se levantar em muitas batalhas para defender sua cultura e sua história. E, quando os Estados Unidos tentaram imputar uma nova língua ao povo local em 1902, os estudantes disseram não. E resistiram no que ficou conhecido como “guerra da língua”. Até hoje o país mantém o espanhol como língua oficial por se entender mais para a América Latina do que para o norte. Hoje, são os estudantes universitários, outra vez, que escrevem mais uma página da história do pequeno país, numa greve memorável na qual reivindicam a autonomia para a universidade e lutam contra a privatização do ensino público.

No dia 21 de abril de 2010 os estudantes da Universidade de Porto Rico iniciaram uma greve contra uma nova lei que prepara a privatização da instituição, privando a universidade de recursos, assim como também a saúde, a cultura e a assistência social. Em pouco tempo, o que era só um movimento estudantil passou a ser uma luta nacional. Como se um grande dique de sonhos e esperanças estivesse se rompido as gentes começaram a identificar na luta particularista dos estudantes um projeto de nação. No grito contra a privatização e pela autonomia da universidade, também os estudantes foram percebendo que a questão era muito mais profunda e assomou, de novo, o desejo de liberdade popular.

A lei que levou os estudantes às ruas acabou por provocar o congelamento de salários dos trabalhadores públicos e também eles, mais de 15 mil, foram para as ruas defender seus direitos e os serviços públicos em geral. Como a população mais pobre depende dos serviços públicos no que diz respeito à educação, saúde e assistência social, o apoio às lutas dos trabalhadores e estudantes foi imediato. Já em 2005 os estudantes universitários tinham realizado greves, uma vez que o processo de privatização vem se fazendo devagar, como em quase toda América Latina, mas, este ano, as medidas do governo, reduzindo o orçamento e aumentando o valor das matrículas foram decisivas para outra explosão que, com a parceria dos trabalhadores, se transformou numa tormenta.

Já se vão quase dois meses e a luta segue firme em Porto Rico. E, como sempre acontece, a repressão tem sido violenta. Os estudantes fizeram greve de ocupação e o governo colocou a universidade sob sítio impedindo a entrada de água e alimentos. Mas, o povo, solidário, tem encontrado maneiras de fazer chegar a comida e a água. A medida de força levou o país a se levantar e sindicalistas, artistas, trabalhadores de todos os tipos realizam marchas, atos políticos, colocam o país em efervescência.

No mês de maio o governo ameaçou suspender o ano acadêmico e declarou que a UPR iria perder sua condição de universidade pública. Alegava que a greve era abusiva, ilegal e, por isso, endurecia na repressão e na criminalização dos estudantes. Como se pode notar, tudo muito igual, receita da cartilha neoliberal e entreguista bem comum aos governantes desta nossa América Latina. Mas, os estudantes não se intimidaram. Exigiam negociações e mantinham a greve. A mobilização popular tomava dimensões gigantescas e o governo teve de recuar, abrindo negociações. De qualquer forma há uma guerra midiática em curso. Na televisão porto-riquenha o governo e entidades empresariais gastam fortunas tentando convencer a população de que a greve na universidade é ruim para o país. Por outro lado, os estudantes, através da “Rádio Huelga” (http://radiohuelga.com/wordpress) buscam o diálogo com o povo, mostrando que quando as gentes estão unidas, podem vencer, como já aconteceu no final dos anos 90, quando mobilizações como essa tiraram as tropas estadunidenses da região de Vieques.

Hoje, na metade do mês de junho, a luta no campus de Río Piedras continua. Os estudantes que seguem acampados na UPR realizam atos, fazem formaturas simbólicas, criam hortas comunitárias, fazem limpeza, promovem teatro, chamam a população para visitar o campus, para que possa ver como é possível existir uma universidade autossustentada, autônoma, e livre para pensar a realidade nacional. As negociações seguem de maneira lenta, a universidade continua sitiada, a repressão recrudesce.

Os estudantes estão esperançosos com um novo mediador do conflito, o ex-juiz Pedro Lopez Oliver, que parece estar conseguido fazer avançar as conversas e pode até ser que nos próximos dias as coisas se resolvam, com o governo voltando atrás no aumento das taxas de matrícula e na retirada de orçamento da universidade e garantindo que nada será privatizado. Os grevistas também querem garantias de não punição uma vez que há ameaças de expulsão das lideranças. Só assim o movimento encerra.

Veja a fala dos estudantes numa mensagem ao país!

http://www.youtube.com/watch?v=ED03HiVzRd0





terça-feira, 15 de junho de 2010

O final de Lost


Eu gosto das coisas do mistério. Desde pequena. Enquanto minha mãe se enredava com os enigmas da fé cristã eu adentrava pelo fascinante mundo da ficção. Aprendi a ler muito cedo e com seis anos já devorava os livros que meu pai comprava por sentir pena dos vendedores que batiam à porta, naquele cantão perdido de mundo. Mal sabia ele que fazia bem a dois, ao vendedor e a mim, pois, com isso, descobri o mundo das letras. Os primeiros mistérios que minhas retinas abarcaram me pareciam incognoscíveis. Eram os mitos gregos. Não conseguia apreender a totalidade de toda aquela trama de homens e deuses, mas gostava. E, nas tardes quentes do verão gaucho, eu me escondia por trás dos móveis, nas viagens imaginárias aos portões de Hades (guardião do inferno grego).

Por conta disso, ficção e mistério sempre me atraíram. Discos voadores, mitos, seres de outro planeta, gênios, magos, feiticeiros, duendes, enfim, essa fileira de coisas encantadas e mágicas. Assim, não foi à toa que segui, capítulo a capítulo, a série Lost (perdidos), independentemente de reconhecer que era só mais um produto da indústria cultural. É que amo televisão, e tudo neste veículo me encanta, seja o que for. Quanto mais os mistérios...

Dia desses, depois de seis anos inteiros, a série chegou ao final. E eu, como todos os fãs, lá estava esperando a revelação de todos os mistérios da ilha maluca. Um final estranho, incrivelmente teológico. Os autores, querendo ou não, acabaram por oferecer ao público fiel, uma visão do paraíso. E eu, no dia seguinte, andava feito louca, querendo encontrar alguém com quem compartilhar aquela beleza toda que havia fruído na terça-feira final. Não encontrei. Ninguém do meu convívio havia acompanhado a trama. Restou ler os comentários na internet. Fiquei surpresa, poucos gostaram do final.

Eu, por meu lado, amei. A proposta dos autores foi reunir os personagens mais significativos num momento de pós-morte. Depois de viverem todas as aventuras mais doidas numa ilha que se movia loucamente no mar, depois de verem alguns deles morrer e outros se entregar a coisas igualmente malucas como vigiar uma fonte de luz, eles se reencontram todos numa espécie de festa. Aí descobrem que estão mortos. E que, por isso mesmo, estão juntos e felizes.

A cena final, que me levou às lágrimas, mostra um deles, Benjamin, o que havia sido o personagem mais complexo na sua paixão pela ilha, chegando ao ponto de matar até aos que amava, sentado num banco, sozinho, do lado de fora da festa. Os demais personagens vão chegando, de vários pontos da cidade, e vão entrando. Cada um deles, na sala festiva, encontra seu par, seu amor, seus amigos. É a revelação teológica de que, na morte, num determinado lugar – o céu? - nos reunimos com aqueles que amamos. Não importa o que aconteça, o tempo que passe, ao cruzar o umbral da vida, lá estarão os seres que só nos fazem bem.

Mas, o sofrido e complexo Benjamin, não quis entrar. Ele seguiu sozinho, observando a grande festa que principiava dentro da casa. Com os olhos fixos num ponto distante, ele se deixou ficar, representando, talvez, a opção pelo inferno. Nada de fogo, diabos ou gritos. Apenas a escolha deliberada pelo vazio das presenças amadas. Coisa triste demais.

O final de Lost deixou muitas dúvidas, não explicou dezenas de mistérios, mas, para mim, foi o suficiente. O maior dos enigmas se expressou... Morrer nunca é o fim, só se a gente quer!...

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Povos originários

Quem quiser dar uma espiada no material que venho produzindo sobre os povos originários é só dar uma visitada no blog do projeto: www.povosoriginarios.blogspot.com
Dá uma passada lá e veja a beleza destas lutas que caminham por Abya Yala.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Congresso da Classe Trabalhadora: derrotas e desafios

O Congresso da Classe Trabalhadora terminou de maneira melancólica, o que de certa forma espelha a conjuntura pela qual passa o sindicalismo brasileiro e a esquerda de modo geral. Foi frustrante, triste, mas não significa que não possa ser superado. Depois de uma abertura emocionante, com a presença de mais de 800 delegados internacionais, representando 25 países e 3.200 delegados, as horas finais foram de perplexidade e abatimento, afinal, a tão esperada “unificação” entre Conlutas e Intersindical não aconteceu na prática.

O sábado começou frio em Santos, mas dentro do Centro de Convenções onde teria lugar o Conclat havia uma quenturinha boa, dessas que só a esperança traz. Apesar das grandes polêmicas que teriam curso, havia uma certa expectativa de que a conjuntura desfavorável ao ascenso das lutas fosse unir os trabalhadores, afinal, em algum lugar as propostas da esquerda teriam de se expressar e perdurar. É certo que algumas divergências pareciam inconciliáveis, mas se o que estava em jogo era manter vivo o sonho do socialismo e construir um espaço de luta unificada contra o processo social-democrata que hegemoniza o sindicalismo brasileiro, parecia óbvio que era hora de buscar uma pauta mínima unificadora.

A abertura do Conclat foi recheada de emoções. Trabalhadores japoneses, gregos, chilenos, bolivianos, venezuelanos, argentinos, enfim, de tantos lugares, estudantes, povo do movimento popular, gente da luta contra as opressões. Os discursos inflamados, os chamados à unidade e, por fim, a Internacional, cantada de pé, a plenos pulmões e com lágrimas nos olhos. “Bem unidos façamos, esta luta final, uma terra sem amos, a internacional”... Tudo parecia caminhar para o sucesso da unificação. Mas, apesar do otimismo e da festa, três grandes polêmicas se anunciavam: a discussão das eleições presidenciais, o caráter da nova central e o nome.
Como sempre acontece nestes encontros, os grupos foram se juntando por afinidade de propostas e assim, à direita do plenário ficaram os grupos ligados à Intersindical, MAS (Movimento Avançando Sindical) e o Unidos para Lutar, sobrando a esquerda para os militantes da Conlutas. Espalhados aqui e ali ficavam os independentes. Por isso, na hora das votações, o contraste dos crachás ficava bem visível.

As votações
O primeiro ponto polêmico a ser votado na plenária final foi o das eleições presidenciais. Havia três propostas. Uma encaminhava para uma Frente de Esquerda, com um único candidato expressando o programa que seria tirado ali. Outra defendia que a central deveria indicar a votação nos três candidatos da esquerda, PSTU, PCB e PSOL. E a terceira que defendia não ser ali na central o espaço para discutir candidaturas, e que só se deveria informar sobre as diferenças entre as candidaturas de direita e de esquerda. Crachá na mão, o povo foi para a primeira votação. A vitória da tese da Conlutas foi majoritária, sinalizando que ali já estava conformada uma maioria bastante expressiva.

O segundo ponto foi o caráter da central. Três eram as propostas. Uma defendia que a nova central fosse unicamente sindical. A segunda acolhia o movimento sindical e o popular. A terceira estendia a filiação para os estudantes e para os movimentos de luta contra a opressão. Neste ponto, a principal divergência era a inclusão dos estudantes e do movimento de luta contra a opressão que, no entender de alguns grupos, não garantia o caráter de classe, uma vez que tanto os estudantes como os que lutam contra a opressão (negros, mulheres, homossexuais etc...) são policlassistas. Na defesa destas duas frentes estava a idéia de que incluir estudantes e movimentos contra a opressão inauguraria uma novidade no processo da luta do povo brasileiro, extrapolando a forma clássica de fazer política, reconhecendo que tantos os estudantes quanto os que lutam contra a opressão, se tivessem oportunidade de militar numa central como essa, certamente seriam aliados importantes dos trabalhadores na construção do socialismo. Já os contrários defendiam que os estudantes eram passageiros e não poderiam dirigir a luta dos trabalhadores. Esqueciam estes que passageiras seriam as pessoas e não a condição de ser estudante, historicamente um agrupamento fundamental nas lutas populares. Feito o debate, nova votação. Outra vez a tese da Conlutas foi vencedora. A nova central incorporaria movimentos populares, estudantes e movimentos contra a opressão.

As coisas começavam a esquentar no plenário. Guerras de palavras de ordem, algumas provocações. Foi apresentada a proposta de conformação da direção. Seguiria o modelo da Conlutas na qual o dirigente não é uma pessoa e sim a entidade. A composição seria de 27 entidades e oito suplentes. Esse não foi um ponto polêmico e a votação foi tranqüila.

Chegou então a vez de votar o nome da nova central. Desde a apresentação das teses, passando pelos grupos, essa era uma questão que aparecia de forma muito contundente. Estava em jogo a própria concepção do novo que se expressava nas teses e que deveria também aparecer na concretude do cotidiano da central, inclusive no nome. Uma questão preliminar se impunha: a central uniria de maneira automática e formal as duas grandes entidades Conlutas/Intersindical ou definitivamente daria um passo adiante, dialeticamente, apresentando uma síntese deste belo movimento de resistência que teve seu início na luta contra a Reforma da Previdência?

O rompimento
Não foram poucas as defesas para que a Conlutas desistisse de sua proposta de superposição formal. Apelos e mais apelos foram feitos para que os dirigentes reconsiderassem, pois se não aparecesse uma nomeclatura nova, o novo estaria nascendo morto. Era preciso dar um passo dialético, sair da lógica formal, absolutamente atrasada e imobilizante. Estava claro para todos naquele plenário que a maioria estava dada pelos militantes da Conlutas, então haveria de ter sensibilidade para fazer aquilo que já ensinara Lenin no seu clássico “Um passo a frente, dois atrás”, ou seja, em nome da unidade, e já tendo garantido três das propostas mais polêmicas, a Conlutas poderia aceitar a tese de um nome novo. Até porque as próprias entidades que compunham a Intersindical não queriam a inclusão do seu nome. Entendiam que havia cumprido o seu papel numa determinada conjuntura e que agora estavam abertos verdadeiramente para o novo.

Foi nesse momento que Zé Maria, da Conlutas, pegou o microfone. Naquela hora, muitos dos que ali estavam, tiveram a certeza de que o dirigente haveria de agir de forma magnânima, abrindo mão da proposta de nome que uma expressiva parte do plenário não queria, em nome da unidade. Seria uma saída política que mostraria a maturidade da força política que ele representava, pois é claro que a questão do nome não era o nome em si. Era toda uma concepção da nova entidade que se expressava no nome. Aceitar o nome proposto pela ala minoritária daria lugar para a expressão da grande política. A Conlutas estava em maioria e dar um passo atrás nas suas propostas significaria dois passos a frente na construção da Central Unificada. Mas, Zé Maria não é Lenin. E seu discurso se perdeu nos argumentos redutores que insistiam em manter o nome de um projeto que se acabava ali. Juntar Conlutas e Intersindical era não considerar o novo que principiava a nascer. Segundo ele era preciso manter a história que havia sido construída pelas duas entidades, Conlutas e Intersindical. Não compreendia o dirigente que, o passado, ao ser superado, não morre, apenas se transforma em outra coisa, nova. A irracionalidade da proposta, exigindo manter o nome das duas entidades quando uma delas não queria foi a gota de água que faltava para inviabilizar a unificação. Assim, as propostas foram ao voto e, como estava em maioria, a Conlutas venceu. Nesta hora, os militantes da Intersindical, Unidos para Lutar e MAS saíram do plenário para discutir a situação. Não voltaram mais. Ao final, declararam que não estariam na nova Central.

A razão eleitoreira
O dia seguinte ao congresso ainda foi de perplexidade. Todo o trabalho de centenas de pessoas que saíram de várias partes do país rumo a Santos estava no chão. A nova central nascia, mas não tinha conseguido unificar. Pouco a pouco foram aparecendo os textos de análise do congresso, com acusações de todos os lados. Era hora de encontrar culpados pela frustrada tentativa de criar uma central realmente nova, que unisse as forças de esquerda do país que estão, cada dia, mais frágeis e esfaceladas.

Ainda no congresso, as declarações dos grupos que se retiraram do processo já apontavam para onde iria a culpa: ao PSTU. Os que estavam em minoria reclamavam de que não tinha havido a democracia operária, que a Conlutas havia patrolado as votações. Mas este é um bordão que não se justifica. A Conlutas pode ser acusada de muitas coisas, mas é preciso considerar que seus militantes fizeram um longo trabalho de construção deste congresso, conseguindo assim a maioria dos delegados. E também é preciso reconhecer que, independentemente dos problemas que se possa encontrar nesse agrupamento, este debate não foi oportunista, visto que vem sendo feito desde a criação da Conlutas.

O grupo do MAS (Movimento Avançando Sindical), na sua declaração de retirada, ainda reforçou sua inconformidade com o resultados das demais votações, insistindo que os estudantes agora iriam dirigir a classe trabalhadora, e que isso era inadmissível. Este tampouco é um argumento que se sustenta, pois na conformação da direção da Central os estudantes terão um percentual de 5%, logo, jamais alcançarão condições de dirigir a classe trabalhadora. Para este grupo, tanto estudantes como movimentos de opressão deveriam se articular fora da central, em fóruns nacionais autônomos.

O Unidos para Lutar, que reunia em seu interior boa parte dos militantes do PSOL, tampouco aceitou a democracia operária, porque, naturalmente ela não estava a seu favor. No movimento sindical isso é muito comum. Quando a democracia está a favor, é democracia, quando a maioria é do grupo adversário é patrola, manipulação e falta de democracia. Coisa bastante difícil de se continuar aceitando. Durante as votações ficava muito claro que o pano de fundo de tudo eram as eleições presidenciais, visto que tanto o PSTU quanto o PSOL e PCB tem candidaturas próprias. E, como o movimento sindical é uma espécie de correia de transmissão das propostas partidárias, elas passaram a ser mais importantes que o motivo real pelo qual estavam todos ali: a unificação da esquerda brasileira num tempo de completa desarticulação das lutas.

Assim, na compreensão de quem estava no congresso de forma independente, sem ligações partidárias, a inviabilidade da unificação não teve um único culpado. É certo que houve uma grande inabilidade política por parte da direção da Conlutas, que poderia ter passado por cima da questão do nome. Mas, também é certo que os grupos ligados ao PSOL, PCB e à corrente Luis Carlos Prestes tampouco pareciam dispostas a abrir mão de seus propósitos. Assim, a tão falada “classe trabalhadora” ficou desbotada, perdida entre tantas vontades particularistas, quase como um pano de fundo.

De qualquer sorte, no campo da política brasileira, e de uma esquerda que se pauta pelo pragmatismo e pela falta de qualificação teórica, o resultado não poderia ser outro. As chances de que os agrupamentos, que historicamente travam embates cotidianos entre si, chegassem a um acordo, em nome da unidade da luta, era praticamente remota, mas, sempre há esperança. Não se cumpriu. O que imperou foi o “mais do mesmo”. Divergências partidárias, incapacidade de ceder um passo, intransigência e algum fundamentalismo. Grupos ainda mais reduzidos que defendiam uma central apenas sindical faziam festa, às gargalhadas, diante da destruição da proposta de unidade, o que mostra também a imaturidade política de algumas correntes. Festar diante da desgraça da classe trabalhadora é tão absurdo quanto não ceder num nome.

Enquanto isso, no Pacaembu
Dias antes do Congresso da Classe Trabalhadora, um encontro nominado de Conferência Nacional dos Trabalhadores/Assembléia Nacional juntou a CUT, a CTB, a Força Sindical e a Nova Central em um encontro gigante no Pacaembu, São Paulo, que reuniu mais de 28 mil pessoas. Mas, as resoluções não chegaram ao mesmo nível de gigantismo, ficando mais no campo do apoio ao projeto de desenvolvimento proposto pelo atual governo, conforme se pode notar no documento divulgado ao final do encontro.

A proposta contém um manifesto político e uma agenda na qual estão explicitadas as idéias que estas centrais querem ver implementadas pelo governo federal no que diz respeito à vida do país. No manifesto está bem clara a adesão da maior central de trabalhadores da América Latina e suas congêneres à idéia do desenvolvimento sustentável, coisa absolutamente questionável no sistema capitalista. Como em nenhuma parte do documento está escrita a palavra “socialismo”, a conclusão a que se chega é a de que as centrais reunidas no Pacaembu acreditam no mito de que é possível um país periférico se desenvolver aos moldes dos países centrais e ainda respeitar a natureza. Conspiram ainda da certeza de que com muito “sacrifício” da classe trabalhadora o Brasil poderá chegar ao primeiro mundo.

O apoio ao governo de Luis Inácio se manifesta na afirmação de que “os avanços registrados nos indicadores sociais e econômicos dos últimos anos revelam que é possível combinar crescimento econômico com desenvolvimento social”. Afirmam ainda que o neoliberalismo vem sendo derrotado e se colocam como desafio a construção de um projeto nacional baseado na democracia, na soberania e na valorização do trabalho. Este, em especial, ganha um novo conceito, o de “trabalho decente”, que a depreender do documento parece significar um trabalho no qual o trabalhador não é “muito” explorado. Em particular, esse conceito de trabalho decente, soa como uma coisa muito estranha se considerarmos que em todo o documento não há qualquer alusão ao socialismo. Mas, nas propostas apresentadas a partir de seis eixos, o que fica claro é que a CUT e as demais centrais alinhadas ao governo estão enfeitiçadas pela proposta de humanizar o capitalismo. Isso mostra o completo despreparo teórico desta fração da classe trabalhadora que parece insistir na lógica de conciliação de classe.

Apesar de nos variados pontos elencados estarem algumas bandeiras históricas dos trabalhadores, muitas das propostas de transformação se perdem em idéias como a do desenvolvimento sustentável (colada no liberalismo), a aposta na qualificação do trabalhador para melhor ser explorado pelo capital, no pedido de ampliação de crédito para que aumente a exploração dos bancos sobre os trabalhadores, na idéia de revisão e controle social das Parcerias Público-Privadas e não a sua revogação, e no fortalecimento de idéias como os fundos de pensão, entre outras.

A mudança vem do povo
Assim, diante da aposta na social-democracia que fazem as grandes centrais, e a fragmentação da esquerda mais radical, o que resta aos trabalhadores comprometidos com a mudança social é, neste momento, fazer o que fez Marx diante da conjuntura do seu tempo: estudar, estudar e estudar. Buscar na vida real os elementos para a construção de uma teoria que dê conta da explicação do nosso tempo e que nos permita avançar na luta de classe.

É certo que no Brasil atual, com uma economia em expansão, crescendo 9% por trimestre - a maior marca registrada pelo IBGE desde 1995, podendo alcançar o incrível dígito de 12% ao ano, mais que a China, portanto – torna bastante difícil o trabalho de conscientização de classe. Os trabalhadores, com uma boa parte tendo ganhos consideráveis nos salários, preferem acreditar nesse “capitalismo humanizado”, que é todos os dias incensado pela imprensa. A classe média, com a vida renovada, não está disposta a apostar na construção do socialismo que, segundo o senso comum, pode lhes tirar mais do que dar. Prefere erguer muros e cercas elétricas para se proteger da “ralé”. Resta então às gentes oprimidas essa bandeira. São os desempregados, os que estão à margem do sistema, os que não conseguem nem vender sua força de trabalho, os que estão entregues às drogas, à violência, à barbárie. Mas, paradoxalmente, estes são os que menos estão em condições de refletir sobre sua realidade, porque precisam garantir o pão do dia.
Nesse sentido, uma central, aos moldes da que estava proposta no Conclat poderia ser um rico instrumento de luta e de organização da classe trabalhadora oprimida e marginalizada do processo do capital.

Mas, a razão eleitoreira foi preponderante, assim como a intransigência de muitas correntes de pensamento e agrupamentos políticos. Ninguém parecia estar disposto a abrir mão do “seu programa”, da “sua verdade”. O resultado foi a derrota de todos. A central está criada, é certo, mas seu sentido de unidade se perdeu. Deverá ser outra central dominada por um partido como a CUT é pelo PT e a CTB pelo PC do B.

O que ainda sobra de esperança é a certeza de que a classe trabalhadora saberá fazer o que precisa ser feito quando as condições de opressão ficarem insustentáveis, como acontece, neste momento, na Grécia. As gentes se levantam e obrigam, no chão da luta, estas organizações divididas em suas verdades particulares, a se integrarem na grande e universalizante onda revolucionária que só o povo sabe provocar. Há que estudar, cuidar e permanecer na luta.