terça-feira, 27 de setembro de 2022

A tecnologia e o tele trabalho


Trabalhadores querem outras regras para o tele trabalho - Foto: Rubens Lopes

Como já bem pontuou o filósofo Álvaro Vieira Pinto a tecnologia sempre vem para ajudar o ser humano na sua relação com o trabalho. Desde o começo dos tempos quando o humano inventa é para ter mais qualidade de vida. Assim, a descoberta do fogo, da roda, do alfabeto, as máquinas e por aí. Daí que o debate sobre o tele trabalho na UFSC deve levar isso em consideração. A internet, os novos instrumentos de trabalho e tudo mais chegaram para melhorar a nossa vida. Isso, em tese. 

E por que dizemos assim, em tese? Porque se a tecnologia sempre vem para melhorar a vida, quem a domina e impõe seu uso pode mudar a ótica da coisa. Um exemplo claro é a internet. Quando chegou anunciou a democracia, a possibilidade de cada pessoa poder produzir sua informação, dizer sua palavra. O reino da liberdade. Mas, na prática, como funciona? Para ter a internet é preciso pagar e as grandes corporações são as que decidem como e o quê tu vais dizer. Quem nunca foi bloqueado no facebook? Quem tem liberdade de escolha? Quem pode dizer o que quer? Não é bem assim, né? Quem domina as redes não é a pessoa. São umas poucas pessoas que concentram as informações e dados. Ou seja, ela tem dono, e não és tu. Logo, não há democracia nem liberdade. É tudo uma ilusão. Segue a ditadura do capital.

A proposta do governo para o tele trabalho segue a lógica do capital. O professor Vitor Filgueiras, da UFBA, escreveu um livro mostrando o quanto as chamadas “novidades” do mundo do trabalho são as mesmas velhas armadilhas que superexploram trabalhadores e atuam para sua desagregação enquanto classe. Trabalhar remotamente pode ser bom para algumas pessoas, mas é preciso estar atento às regras impostas pelo governo para que isso aconteça. Pela norma aprovada ontem no Senado, a IN65, é o trabalhador quem deve ficar responsável pela sua estrutura de trabalho, ou seja, caminho seguro para o gasto e a precarização, assim como já funciona no Uber e com entregadores de comida. Há que cuidar do carro e da bicicleta e há que seguir as regras da empresa, mantendo-as como a empresa quer. O cara se acha empreendedor ou autônomo, mas, na verdade está atrelado às normas da empresa. Ela define e ele gasta.

No caso do tele trabalho proposto pelo governo a coisa vai por aí. E tem mais. O trabalhador terá de ser responsável pela segurança dos dados públicos. Ora, como dar segurança para os dados senão investindo em bons antivírus e coisa e tal? E esse investimento quem terá de fazer é o trabalhador e se os dados forem roubados, ele será responsabilizado. Pesado isso, heim? Sem contar o tanto de direitos que somem da relação e trabalho. Haverá metas a cumprir e índices de produtividade e quem vai definir isso é o chefe imediato. Ou seja, o cara não precisará bater ponto, mas deverá seguir uma proposta de produção. E o que é mesmo que os trabalhadores técnico-administrativos produzem? Temos uma longa luta contra essa lógica da fábrica de salsicha. Não é assim que banda toca. O trabalho na universidade e no serviço público não pode ser medido pelo número de e-mails respondidos ou atendimentos realizados. Isso não diz do trabalho feito pelo trabalhador da educação. Aceitar isso é dar tiro no pé.

O governo que aí está não pretende fazer com que a tecnologia facilite a vida do trabalhador. Pelo contrário. Quer preparar a cama e a mesa para os empresários da educação na medida em que o sonho dessa turma é privatizar a universidade precarizando o trabalho. Aceitar essa regra tal qual o governo criou é colocar tijolo nessa obra. 

Por isso que o sindicato dos trabalhadores da UFSC está discutindo uma outra legislação, que não penalize os trabalhadores, que de fato use a tecnologia a nosso favor, que não signifique perda de direitos, que não ajeite o campo para a privatização. Mas, há quem seja contra isso e peça a implantação já da IN65. Nada mais equivocado. Na sanha de resolver questões pessoais e urgentes, colega há que estão atropelando o debate. A regra do governo é ruim. Nós podemos melhorar isso. Mas, é preciso que estejamos juntos nessa luta. Dividir os trabalhadores é trabalho dos quinta coluna, dos que não se importam com os destinos da universidade e do serviço público. Olho vivo com isso pessoal. O tele trabalho pode ser bom, mas tem de ser dentro das nossas regras. 


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