sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Controle do EUA sobre a África


O governo da Espanha está negociando com os Estados Unidos para que seja fechado um convênio que estabeleça a base de Morón, na cidade de Cadiz, como uma sede permanente das forças armadas estadunidenses visando o controle sobre a África. Essa negociação começou em dezembro quando o secretário de defesa dos EUA, Chuck Hagel pediu permissão para a movimentação de uma unidade da Marinha na base e também para o aumento do efetivo, que passaria de 850 para 3.000 soldados no local. Conforme informações do jornal El País, caso seja autorizada a função de permanente da base, esse número de soldados subiria mais 60%, passando a abrigar quase oito mil na porta da África.

Os motivos para tal aumento de efetivo seria “manter uma boa reserva para o caso de uma crise”, embora não se saiba sobre que “crise” se estaria falando. Possivelmente a proposta de fazer da base, que já usada pelos estadunidenses desde 2013, uma sede permanente, tem a ver com o que eles chamam de combate ao terrorismo, embora os movimentos sociais denunciem que se trata de ajudar a Europa a coibir a “invasão” de africanos por imigração legal ou ilegal.

Nas notícias divulgadas pelos jornais nenhuma autoridade fala sobre qual seria o papel desse grupo, chamado de Força Especial de Resposta de Crise do Corpo de Marines (SP-MAGTF Crisis Response). Quando ele foi instalado eram apenas 500 militares e havia a proposta de ficar por apenas um ano, com a alegação de que era necessário proteger os cidadãos dos Estados Unidos que estavam na norte da África durante os conflitos na Líbia.

Mas, o tempo passou e a base seguiu, inclusive aumentando o efetivo. Agora os Estados Unidos propõem colocar mais homens e se fazer de polícia da Europa e dos demais países da OTAN, “protegendo-os” se necessário. Nos últimos dias, essa força foi usada para intervenção na Líbia, para evacuação de cidadãos estadunidenses do Sudão do Sul e para algumas missões na Libéria.

A Espanha se diz contente com a base porque pode contar com ela para sua proteção. E sobre sua permanência também há acordo. Segundo a vice-presidente Soraya Sáenz de Santamaría, em entrevista ao El País, a base tem sido de fundamental importância para a cidade de Morón, assegurando, inclusive, muitos empregos. Pelo que se pode ver, os Estados Unidos vão reforçando seu poder em torno da África e do Oriente Médio, com o total apoio dos governos europeus.

O Ebola e sua caminhada pela África




















Apesar de já ter saído dos noticiários, a epidemia do Ebola segue ceifando vidas na região ocidental do continente africano. Ainda que tenha havido uma caída no número de casos nos países mais afetados como a Libéria, Guiné e Serra Leoa, a situação ainda é considerada muito crítica pela Organização Mundial de Saúde, pois a movimentação de pessoas saindo dos países afetados é grande. 

Segundo informações publicadas em jornais africanos, o representante da OMC, Bruce Aylward, afirmou que já foram registrados quase 22 mil casos da doença, com a morte de 668 dos infectados. Só nos últimos dias mais de 400 novos casos foram contabilizados em Serra Leoa, 109 na Guiné e 21 na Libéria. Os números estão reduzindo, mas ainda são considerados críticos. A maior preocupação da OMS é de que as autoridades baixem a guarda e, com isso, aconteça mais demora para chegar ao caso zero.

As dificuldades encontradas, além da falta de pessoal, é a falta de recursos. A organização diz que só para combater o Ebola, nos próximos seis meses, precisaria de um total de 260 milhões de dólares, quando todo o seu orçamento é de 350 milhões. 

Hoje, dia 23 de janeiro, uma empresa da Bélgica, a GlaxoSmithKline (GSK),divulgou que foi enviado à Libéria um lote das primeiras doses de uma vacina experimental contra a doença. Desenvolvida em parceria com o Instituto Nacional de Alergia e Enfermidades Infecciosas e os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos, eles esperam contar com 30 mil voluntários, dos quais apenas 10 mil receberão a vacina. É na verdade um teste clínico, uma vez que não têm comprovada a eficácia. Para os que estão sob a ameaça da doença e acossados pelo desespero, servir de cobaia parece ser a única alternativa.  

sábado, 17 de janeiro de 2015

Teleférico para Florianópolis: um debate

















O professor da Universidade Federal de Santa Catarina, Werner Kraus, que é um estudioso da mobilidade na capital, fala sobre o projeto do teleférico que o prefeito César Souza quer implementar em Florianópolis.

Ouça a entrevista clicando link abaixo.

https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/128153


quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

A riqueza da Nigéria e os ataques fundamentalistas



Por elaine tavares*

A riqueza que se esconde sob o solo da Nigéria é sua desdita. Ali está uma das maiores reservas de minério fóssil do mundo, cerca de um milhão de quilômetros quadrados de puro petróleo. Há jazidas de outros minérios, mas o principal é o óleo negro, que representa 20% do Produto Interno Bruto do país, 95% das exportações e 80% da receita nacional. Não é sem razão que a guerra esteja corroendo seu território e matando sua gente. A lógica da terra arrasada para melhor dominação ainda segue em vigência naquelas paragens e nesse caldo de guerra à morte pelas riquezas, é a religião que vem sendo usada para “justificar” a barbárie. Em nome de “deus” grupos de várias cores se digladiam para tomar conta do petróleo.

Nos últimos meses o chamado “grupo radical islâmico” Boko Haram tem protagonizado uma série de ataques, de requintado terror com o objetivo de, segundo pregam, estabelecer a Sharia (lei islâmica) nos 36 estados que conformam o país. A Nigéria tem hoje 174 milhões de habitantes, sendo o país mais populoso do continente e o sétimo país mais populoso do mundo. Convivem no seu território mais de 500 grupos étnicos, mas os mais expressivos são os hauçás, os igbos e os iorubás. Do ponto de vista religioso o país é praticamente dividido entre os que professam a fé cristã (mais centrados no sul) e os muçulmanos (ao norte), mas também há os que praticam as religiões tradicionais como as igbo e iorubá.

Apesar de ser um país laico é justamente a religião que vem sendo usada para dar vazão aos desejos de apropriação da riqueza. Nascido no norte, onde predominam os muçulmanos o grupo Boko Haram foi fundado em 2002, na cidade de Maiduguri, no Estado de Borno, por Ustaz Mohammed Yusuf, que o liderou até 2009. Hoje o comando está nas mãos de Abubakar Shekau e a sede foi levada para a cidade de Kanamma, onde fica o que chamam de central operativa "Afghanistan". Desde ali, o grupo vem realizando sequestros e atentados contra as forças policiais nigerianas e contra a população civil. 

Desde o final de 2001 que o norte do país vive em estado de alerta e o governo chegou a declarar estado de emergência em função da sequência de atentados e ações violentas, inclusive contra centros educacionais, já que eles acreditam ser a educação laica um grande mal. Até o ano passado, essa luta era considerada uma questão interna e não havia muita informação sobre o grupo. Mas, no início de 2014, o ataque a uma escola cristã, no qual os integrantes do Boko Haram queimaram vivas 60 crianças, colocou o problema em evidência nos jornais europeus. Pouco depois o grupo invadiria a cidade de Bama, num ataque violento deixando milhares de vítimas e famílias desalojadas.  

O mês de abril trouxe mais uma notícia envolvendo o Boko Haram. Militantes invadiram outra escola, desta vem em Jibik, seguindo com a campanha contra a educação ocidental e sequestraram mais de 200 meninas, as quais o líder prometeu colocar à venda depois de convertê-las ao islã. Relatos de meninas que conseguiram escapar – divulgados nos jornais europeus - dão conta de violações sexuais e outras torturas, além da degola quando se recusavam a conversão. 

Conheça o país

A Nigéria congrega atualmente quase um quarto da população do Oeste Africano. Embora menos de 25% estejam vivendo na zona urbana, existem cerca de 24 cidades com população de mais de 100.000 habitantes. O país tem uma grande taxa de fecundidade e um exponencial crescimento populacional. O Departamento de Recenseamento dos Estados Unidos, que está de olho no país, estima que a população da Nigéria atingirá 356 milhões em 2050 e 602 milhões em 2100, ultrapassando os próprios Estados Unidos como o terceiro país mais populoso do mundo.

A Nigéria está de frente para o oceano atlântico, na parte oeste do continente africano, bem na voltinha que se encaixaria no nordeste brasileiro na mítica Gaia. Faz divisa com Camarões, Benim, Níger e Chade. No seu território está parte do maciço de Adamawa, ou as Montanhas Gotel, com 2419 metros, em Chappal Waddi, o ponto mais elevado do país. Seu tamanho é um pouco maior do que o estado brasileiro do Mato Grosso e língua oficial  é o inglês.

Antes da dominação portuguesa e britânica o território era espaço do império Kanem-Bornu, que dominou a parte norte da Nigéria por mais de 600 anos. Era uma próspera rota de comércio entre os norte-africanos e o povo da floresta. Ao longo de sua história o povo daquele lugar constituiu sistemas de organização política muito bem elaborados, tanto que em 1471 quando os portugueses desceram pelo litoral africano encontraram uma corte próspera com a qual estabeleceram, em princípio, laços comerciais até o fim do século XVI, quando começou com mais intensidade o trafico de escravos.  

Durante os séculos que se seguiram os portugueses e os britânicos dominaram a região estabelecendo entrepostos para a realização do melhor negócio daqueles tempos, que era o tráfico humano. No ano de 1886 foi criada a Companhia Real do Níger, sob o comando da Inglaterra e em 1900 esse país europeu já fincava suas garras no lugar, criando os protetorados. Em 1914 formaram a colônia da Nigéria, cujo nome surgiu da fusão entre as palavras Niger (do rio Níger) e area (palavra inglesa para "área"), e foi dado pela mulher do Barão Lugard, que administrava o território naqueles dias. 

A independência veio no ano de 1960, no rastro de todo o processo de libertação que tomou conta do continente. Mas, de qualquer forma, a ascendência inglesa continuou, pois havia riqueza demais para ser deixada para trás. Internamente o país seguiu em convulsão e em 1966 grupos militares se enfrentam na disputa pelo poder. A etnia mais expressiva, a dos igbos, chegou a declarar independência em 1967, criando, a partir de uma sangrenta guerra civil, a República de Biafra. Mas, ao final foram derrotados. Desde aí o país vem passando por sucessivos golpes e alguns momentos de governo civil. Atualmente, o presidente é Goodluck Jonathan que, sendo vice, assumiu o cargo em função da morte de Umaru Yar´Adua, escolhido em eleições livres na chamada Quarta República iniciada em 1999, quando retomou-se democracia, o que no caso da Nigéria foi a retomada das eleições e o fim do segundo regime militar.  

Nas análises recolhidas dos periódicos europeus – que dão maior cobertura à política dos países africanos – há uma generalizada crença de que o presidente Goodluck tem sido bastante fraco na ação contra o chamado “grupo radical”. E há que se levar em conta também a sistemática intervenção das potências ocidentais na região. Os britânicos seguem por lá. Os Estados Unidos tem uma base militar justamente na fronteira norte do país, a qual rastreia com seus drones. Há quem defenda que o Boko Haram tenha sido – tal qual o Al Kaeda – criado pela inteligência estadunidense para desestabilizar o país tornando-o alvo seguro para uma ocupação. Não nos esqueçamos que ali estão grandes reservas petrolíferas. Além disso, a Nigéria vem se destacando como uma grande potência regional. O seu PIB, em 2013, foi o maior do continente, 500 bilhões de dólares. O pequeno país é uma mina de ouro, enquanto a sua população vive entre a pobreza extrema e a ameaça de extermínio. O país tem os piores índices de qualidade de vida. Uma contradição só explicada pela voracidade da classe dirigente, sempre aliada aos interesses estrangeiros. Hoje, o rentismo petroleiro é prioritário. A economia tradicional, baseada no cultivo do cacau, café, banana e azeite de dendê está entregue às moscas e o país importa alimentos. 

Recrudesce a ação do Boko Haram

Nas últimas semanas as ações do grupo islâmico fundamentalista voltaram a tomar conta das manchetes. Além de seguir com o rapto de crianças, o grupo as utiliza como bombas vivas nos ataques que realiza pelo norte e noroeste do país. Poucos jornais arriscam dizer o número seguro de vítimas provocadas pelo grupo, mas já passam de milhares. As técnicas são justamente o assassínio em massa, as ações suicidas, violações e o uso dos prisioneiros  - maioria meninas  - como escravos. 

Os jornais europeus dão conta de que no último dia de 2014 mais 40 crianças foram raptadas no estado de Borno. E, na semana em que ocorria o atentado na França, o Boko Haram atacou a cidade de Baga, deixando mais de dois mil mortos. Conforme relato de testemunhas ouvidas pelo jornal português “O Público”, eles chegaram atirando a esmo, matando quem encontravam pela frente, e quem se escondeu dentro de casa foi queimado vivo. O Ministério da Defesa nigeriano nega que tenham sido duas mil pessoas mortas, diz que foram “apenas” 150. As Nações Unidas não confirmam o número de mortos, mas diz que existem mais de 150 mil pessoas desalojadas e em êxodo na região norte.

O fato é que os ataques do Boko Haram podem esconder interesses bem mais profanos do que a vontade de implantar o islã. Com o fim do bloco socialista e a impossibilidade de criar o inimigo “comunista”, agora as nações ricas já consolidaram um outro inimigo comum: o “terrorista”, que, inclusive, tem cara e nome árabe. É inegável que os grupos extremistas existem e atuam de maneira ultra violenta. Mas, também é preciso considerar que muitos deles são incentivados e financiados pelos países centrais para criar o caos. Isso já aconteceu no Afeganistão, no Iraque, na Síria. Depois, eles servem de argumento para missões de ocupação estrangeiras e toda a riqueza dos países invadidos escoa para fora. 

A Nigéria está em processo eleitoral, o novo presidente será escolhido agora, em 14 de fevereiro. Assim, as ações, cada dia mais violentas, do Boko Haram estão mergulhadas nesse contexto. Na segunda-feira (12/01), o grupo atacou uma base militar no vizinho país, Camarões, o que o torna ainda mais perigoso. Segundo informações de jornais europeus, a batalha durou cinco horas e 150 pessoas morreram. Também se sabe que a França tem sido um país bastante atuante na Nigéria chegando inclusive a organizar uma conferência com os presidentes da Nigéria, Camarões e Benin para constituir um plano de defesa. Como convidados especiais da reunião compareceram também a Inglaterra e os Estados Unidos. Os argumentos para a presença dessas potências e o interesse da França são de que o Boko Haram teria ligações com a Al Kaeda e poderia ser um perigo para a Europa. 

Então. Tudo está ligado. Há mais coisas aí do que pode sonhar nossa capacidade de conspiração. Enquanto isso, milhares de pessoas estão em fuga. 


*Com informações dos jornais O Público, El País, Euronews

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Governo do Equador recua diante da mobilização indígena



Ministra do Interior diz que vai analisar o recurso da Conaie para permanecer na casa

Enquanto o presidente Rafael Correa falava de sua "revolução cidadã" em Pequim, buscando parcerias econômicas e comerciais com a China, no Equador, o dia era de luta para os indígenas ameaçados de expulsão da sede da CONAIE, a Confederação das Nacionalidades Indígenas do Equador. Extinguia-se nesse seis de janeiro o prazo dado pelo governo para que a histórica entidade, uma das mais importantes do mundo, deixasse o prédio que ocupa em comodato desde há décadas.

Desde domingo várias entidades indígenas, de diversos lugares do país tinham iniciado uma marcha até a capital visando o cerco ao prédio e a resistência, caso a polícia tentasse desalojar a entidade pela força. Quando o dia amanheceu milhares de pessoas já marchavam em direção a sede da CONAI, na Avenida de los Granados,  dispostos a não arredar pé. Já no início da manhã foi instalada uma Assembleia Extraordinária, a qual virou espaço de manifestações. O presidente da entidade, Jorge Herrera, deixou claro a importância da CONAIE: "A partir dessa casa temos discutido e aprofundado as propostas para a construção de uma sociedade mais justa. Por isso decidimos que se pretendem nos tirar daqui, hão de nos tirar mortos, porque essa casa é do povo".

Também fez uso da palavra o presidente da CONFENIAE, Franco Viteri, que igualmente reiterou: "essa casa é território das nacionalidades e dos povos, aqui aprendeu o mesmo presidente Correa, portanto não vamos abandoná-la. Se o presidente pretende nos tirar daqui, estará contradizendo todo o princípio de plurinacionalidade e indo contra seu próprio discurso.  Outra liderança indígena, Carlos Pérez, assinalou que a casa da CONAIE agora se constituía um símbolo da resistência indígena. "Esse edifício é fruto da luta do movimento indígena, do levantamento dos anos 90 e por isso vamos defender a memória histórica de nosso povo".

E assim foram se sucedendo as falas e o compromisso de lideranças populares de tantas organizações equatorianas na defesa da CONAI e do seu direito de permanecer na casa que foi conquistada ao longo de décadas de luta. Não faltaram também as manifestações cerimoniais de proteção da casa e da luta indígena, como a realizada por um grupo de chasquis que caminhou pelo país desde o dia 29 de dezembro. Eles entregaram oferendas ao presidente da CONAIE e desejaram os melhores augúrios ao seu Conselho de Governo. Foi um momento de profunda emoção.

Durante o desenrolar do encontro e das manifestações foi divulgado que a ministra do Interior, Betty Tola, havia suspendido o desalojo e que iria analisar o recurso interposto pela entidade. Segundo ela, nova decisão deverá sair em dois meses.

O informe saído do ministério do interior foi saudado como um importante ganho ocasionado pela intensa mobilização. Ao se encerrar a assembleia, a resolução final foi a decisão de permanecer na sede da entidade e começar a partir daquele momento mais uma processo de fortalecimento das entidades de base, que sustentam esse gigante que é a CONAIE. O objetivo é manter toda a gente em movimento durante esse dois meses nos quais o governo deverá discutir o recurso.

Depois de encerrada a assembleia, em meio a cerimônias e cantorias, os delegados e apoiadores realizaram uma caminhada pelas ruas de Quito até o Palácio da República, mostrando que as nacionalidades indígenas do Equador está de pé, em luta e não desistirão de manter sua sede histórica.  

Foi mais um dia de batalha pela consolidação daquilo que está na Constituição, mas que segue sendo esquecido pelo mandatário equatoriano: a plurinacionalidade e o bem viver. Nos cartazes e nas falas dos indígenas, a consigna que deverá seguir ecoando pelos meses afora que se configurarão em novas lutas: "Por nossa história, por nossa luta, da nossa casa, ninguém nos tira".


Com informações da CONAIE Comunicación.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

A vala de Melilla



É sempre muito comum a alusão à queda do Muro de Berlin, como um episódio chave para a fim do chamado "regime comunista". Sua derrubada foi saudada como um símbolo da liberdade de ir e vir das pessoas, já que os alemães que viviam na parte oriental não podiam atravessá-lo. Mas, se a sua queda abriu caminhos aos alemães orientais outros muros seguiram se erguendo, impedindo o movimento das pessoas, em pleno sistema da "liberdade", como é saudado o capitalismo. A "terra das oportunidades s" tem, igualmente, seus impedimentos aos seres humanos. E quem grita contra isso? Quem se insurge? Poucos. Os velhos ativistas dos direitos humanos. Os que entendem que nem o comunismo, nem o capitalismo podem levantar muros às gentes.

Ainda assim, vimos surgir na Palestina ocupada o aviltante muro que separa famílias, que oprime pessoas, que torna os palestinos prisioneiros em sua própria terra. Quilômetros e quilômetros de barreira, oito metros de alturas, revistas vexatórias, violências. E, na mídia comercial, muito pouco se fala das vidas ceifadas em nome do abjeto "direito" que Israel se deu de impedir as pessoas de circular por seu território.

Também no México, cresceu e se consolidou o muro que separa o país dos Estados Unidos. De lá para o México, os estadunidenses podem passar tranquilos. Já do México para os EUA, nem pensar. E as gentes se arriscam no muro, morrendo como moscas, impedidos de participar do grande banquete do capitalismo da liberdade, alardeado pelos estadunidenses. Uma liberdade que só vale para quem eles querem. Os pobres que ousam também sentar à mesa da fartura capitalista, esses são impedidos com balas e cães. 

Outra barreira pouco conhecida é a chamada "Vala de Melilla", uma cerca gigante que separa Melilla, uma cidade autônoma, mas de domínio espanhol, que fica em território africano, às margens do Mediterrâneo, fronteira com o Marrocos. Passar a linha de fronteira desde ali é estar com o pé na Europa, por isso foram criados os mecanismos para impedir o fluxo de imigrantes. Assim, a vala começou a ser construída em 1998, completamente invisível para as mídias comerciais. Era apenas uma vala que foi se aprofundando até virar um imenso fosso de três metros de altura. No ano de 2005, ficou mais funda, com seis metros e nela ainda foi fincada uma cerca tridimensional, em 2007, com três metros de altura. Tem 12 quilômetros e é vigiada por tropas policiais. Seu singelo objetivo é impedir a entrada de negros na Europa.

Apesar de sua tecnologia apurada - tem malhas metálicas que impedem a escalada, sensores de movimentos e câmaras automáticas - dezenas de pessoas se arriscam todos os dias, enfrentando a morte, a prisão e a mutilação, para vivenciar a passagem até o mundo das "oportunidades". Mas, os negros pobres não têm vez. A eles, o caminho está fechado.

E assim vai seguindo esse planeta, cada dia mais fechado para os que nada têm, enquanto os que vivem na opulência se calam, cheios de medo de serem "assaltados" pelas hordas dos desgraçados. O fato é que de todos aqueles que tentam ultrapassar as barreiras da "liberdade", a maioria morre ou é capturada. Ainda assim, alguns conseguem, em 2014 foram mais de dois mil... E estão por aí, no mundo dos opulentos, tentando encontrar o caminho para a vida digna.