Foto: Rubens Lopes
Imagine a seguinte situação. Tu fazes um contrato com teu
patrão. Tu trabalhas 30 dias e ele te paga até o quinto dia útil. Assim diz a
lei. Qualquer um que trabalha sabe que tudo o que dá nas oito horas que fica no
emprego é muito mais do que o valor que recebe no salário. A riqueza que o
trabalhador gera é infinitamente maior do que o salário que o patrão paga. A
isso chamamos mais-valia. Mas, tudo bem, nem vamos falar nisso.
Vamos só pensar como um contrato comum, sem considerar o
roubo de trabalho. A pessoa trabalha os 30 dias e tem o direito de receber no
dia combinado.
Pois bem, em vários estados do país isso não está acontecendo.
O estado do Rio de Janeiro é um deles. Desde o ano passado que o governo vem
atrasando o dia do pagamento. No último mês de março, o salário dos
trabalhadores públicos estaduais saiu apenas no dia 18. Mas, as contas não
esperam. E os trabalhadores além de receber com atraso precisam pagar multas de
todas as contas que estão pendentes. Isso parece certo? Quem de nós viveria
isso sem se indignar, sem se revoltar? Afinal, a pessoa está cumprindo a sua
parte no trato. Mas o patrão decidiu burlar a lei. E pronto. Nada acontece. É
por isso que no Rio de Janeiro os protestos são duros. Esse inferno já passa de
um ano. E os próprios policiais que atacam e ferem os trabalhadores vivem o
mesmo drama. Loucura pensar que eles mesmos não se revoltem.
No estado de Minas Gerais os trabalhadores estão recebendo o
salário em três partes ao longo do mês, e a regra do quinto dia útil tampouco é
respeitada desde o ano passado. Nesse mês de abril os trabalhadores receberam a
primeira parte apenas no dia 14. E lá se vai o salário nos juros das contas de
água, luz, telefone e tudo mais. Já não é mais possível planejar a vida, porque
ninguém mais tem certeza se vai ou não receber o salário. No Rio Grande do Sul
isso também acontece.
E isso está acontecendo agora, antes mesmo da reforma
trabalhista do Temer que prevê o negociado valer mais do que a lei. Agora
imaginem como será a vida dos trabalhadores se não houver uma lei que os ampare
no mais mínimo? O patrão vai decidir o que fazer, como fazer e quando fazer.
Não há negociação entre quem tem os meios de produção e os que têm apenas a
força de trabalho para vender. O que vai acontecer é que o patrão vai tirar
muito mais do trabalhador do que já tira agora.
E não me venham com esse mimimi que trabalhador público não
trabalha. Ora, se o país está funcionando é porque os trabalhadores estão
trabalhando. Não fosse assim, estaria tudo parado. Estradas estão sendo feitas
e mantidas, hospitais, postos de saúde, escolas, serviços administrativos, coleta
de lixo. Tudo. Pode não ser o melhor
serviço público, mas não é culpa do trabalhador. Se forem a fundo verão que o
que falta mesmo é investimento nos setores públicos e que é a mão de obra (os
trabalhadores) a que garante o mínimo que ainda temos. Certo, tem um que outro
que é vagabundo, mas isso tu vais encontrar no mundo privado também. Então me
poupem.
O que se viu no Rio de Janeiro foi o ensaio da barbárie que
vai ser tornar o país com a desregulamentação das leis trabalhistas. E isso não
foi só agora na Greve Geral, desde que os trabalhadores públicos estaduais
começaram a ter seus salários atrasados eles têm lutado e enfrentado a fúria da
repressão. E vejam, eles querem apenas ter os salários pagos em dia.
O governo diz que o estado está quebrado e que não pode
pagar o salário no prazo. Mas a culpa do estar quebrado não é do trabalhador. O
que quebra o estado são os empresários – no geral, amigos dos governantes – que
não pagam os impostos ou então as dívidas ilegais e ilegítimas contraídas
sem o conhecimento dos contribuintes.
Isso é público e notório.
Por que cortar na carne do trabalhador e não cobrar os
empresários? Quem tem mais condição de aguentar um baque financeiro? Os
responsáveis pelas dívidas do estado são os que têm de pagar.
Mas, no sistema capitalista de produção, não há compaixão
para com o trabalhador. Ele existe apenas para gerar a riqueza que aquecerá o
rico. Com o trabalho do trabalhador ele seguirá mais e mais rico. Não importa
que massas de gente pereçam. Sempre haverá corpos se oferecendo para a
exploração. Os capitalistas não se emocionam com famílias inteiras sendo
despejadas para que um terreno seja limpo para a construção de um xópin. Não. Não
se emocionam com gente se matando porque não consegue pagar o aluguel ou dar
comida aos filhos. Não.
Então, aos trabalhadores só restam duas opções. Ou se mantém
como escravos desse sistema que não lhes leva em conta, e que mais dia menos
dia vai lhes descartar, ou se rebelam e procuram construir outro modo de
organizar a vida.
Essa é a parada, amigos. Temos de escolher.
Que esse dia primeiro de maior sirva para a gente pensar
sobre isso.
Tu, que vive de salário, para e pensa. O que aconteceu no
Rio de Janeiro, com a polícia atacando os trabalhadores até mesmo no palco onde
falavam sobre seus problemas não é uma coisa isolada. É o que está posto para
cada um de nós. Bordoadas na cabeça, como a que feriu o jovem em Goiás, bombas
e gás na cara, quando não, tiros. Para que aceitemos a escravidão e a morte sem
rebeldia.
Há os que lutam. Pelo menos, respeita. Porque esses, quando
conquistarem o direito de bem viver, o garantirão também para ti.