sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Árvore milionária e um Feliz Natal... pra quem?


Já vem chegando o Natal e, nas ruas da cidade, já se pode notar aquele agitar frenético das promoções, dos descontos e das liquidações. Tudo para alavancar as comprar e fazer o comércio aumentar o seu bolo de lucros. As gentes já circulam irrequietas, fazendo cálculos para gastar o décimo terceiro com alguma coisa que o desejo vem consumindo desde há meses e que, com a crise, não conseguiram comprar. Agora, quem sabe em 24 vezes... Há uma pressa louca em consumir, buscar presentes para amigos secretos, nem tão secretos, amores, filhos etc... E a nave capitalista vai, estraçalhando as finanças de gente que já ganha tão pouco. Mas, fazer o quê? A pedagogia da sedução metralha pela televisão todos os sonhos de consumo. Mais-valia ideológica sugando o sangue do povo.

Nestes dias, quase ninguém mais se lembra de que o natal é o dia sagrado do aniversário de Jesus, na crença cristã. Dia de oração, de momentos contemplativos. O Papai Noel só entrou na parada bem depois, em 1931, quando a Coca-Cola decidiu usar uma linda história de um bispo turco que distribuía presentes aos pobres nesta época do ano – São Nicolau – para aquecer as vendas. Colocaram nele uma roupa vermelha, as cores da empresa e difundiram a lenda do bom velhinho. Desde então, a figura do menininho Jesus começou a perder espaço diante da sanha pelos presentes.

A cidade de Florianópolis tem como tradição encher suas ruas de luzes no natal, assim como grande parte das cidades do mundo ocidental/cristão. O povo gosta, fica bonito. Mas as gentes se esquecem que isso custa dinheiro, e muito, um dinheiro que de algum lugar sai. É o caso da proposta da construção de uma árvore de natal gigante, de 60 metros, toda em alumínio, que será “oferecida” ao povo nas festas deste ano. O contrato está no Diário Oficial do Município do dia 16 de novembro. É uma árvore-palco que abrigará as festanças do dia de natal. A bichinha custará a bagatela de três milhões e setecentos mil reais. Uma dinheirama. A pergunta é: vale a pena isso aí?

Esta semana eu fui ao posto de saúde do Morro das Pedras marcar um dentista. A atendente disse: “não tem. Só no ano que vem, talvez... O contrato da dentista acabou e a prefeitura não contratou outro”. A moça da limpeza que trabalha na UFSC e mora na periferia também vai ter de passar o natal com o dente doendo. No posto de saúde aonde vai tampouco tem dentista. “E ainda vou ter de usar o meu décimo - terceiro pra fazer um ultrassom. Espero há um ano, mas a doença não”.

Bom, agora o povo de Florianópolis pelo menos sabe. Não há verba para contratar dentistas, mas há para fazer uma árvore natal gigante que será desmontada dias depois. Três milhões e setecentos mil garantiriam dentistas aos postos de saúde por anos seguidos. Mas não, é Natal. E há que dar circo ao povo. Aprenderam com os romanos que é assim que tem de ser para se manter no poder. Eu, cá na minha insignificância penso que temos de ter circo sim, mas também saúde e educação.

E todos os dias, as gentes ficam nas filas esperando vaga para aliviar a dor. Já naturalizaram a miséria, como outro dia na fila do posto. “Tinham de por um abrigo aqui pra gente não ficar no sol”, disse uma senhora, triste por estar mais de uma hora em pé, no tempo”. E eu a bufar: “Não tinha era que ter fila, minha querida. Isso é um direito da gente”. E ela, perplexa: “Mas... É mesmo!” E assim vamos...!


segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Um ano da tragédia em Blumenau


Em novembro de 2009 completou um ano da grande chuva que fez Blumenau derreter. Uma tragédia anunciada, visto que várias pesquisas e estudos de professores da FURB há muito denunciavam a fragilidade dos terrenos nas partes da cidade em que os morros desabaram. Mas, enfim, a desgraça baixou e mais de cinco mil pessoas ficaram sem suas casas, isso sem contar os que perderam sua vida. Boa parte destas pessoas acabou levada para abrigos e todas esperavam que suas vidas voltassem ao normal, afinal, não foi pequena a ajuda que as gentes brasileiras deram aos desabrigados de Blumenau. Mas, o que aconteceu foi bem diferente e um número muito grande de famílias ainda não tem um lar.

No dia 21 de novembro, um sábado, enquanto o prefeito da cidade, João Paulo Kleinubing, dava entrevista nos meios de comunicação de massa, falando da beleza da obra de reconstrução feita pela sua gestão, a cidade real se manifestava em frente à catedral, tentando mostrar para a população que passava apressada para as compras, que há uma verdade escondida e que não aparece no jornal.

Quem passa pela área dos pavilhões da PROEB vê como a prefeitura foi eficaz na limpeza e na reconstrução. Tudo está bonito. “Na verdade, a grande massa do dinheiro foi para os empresários, donos das cervejarias, para o atendimento aos turistas na Oktoberfest. As pessoas mesmo de Blumenau, as que sofreram com o desastre e não tem renda suficiente para recomeçar ou parentes ricos, estão ainda nos abrigos”, diz uma professora da Furb. “E tem mais, esse povo não vai na Oktober. Esta é uma festa para turistas”.

Uma artéria importantíssima da cidade como a Rua das Missões está há um ano com uma imensa cratera e tudo o que foi feito pela administração foi uma marcação com cones para que os carros não caiam no abismo. “A gente pobre segue como sempre foi. Abandonada”.

Na manifestação do Movimento dos Atingidos pelo Desastre participaram famílias desabrigadas de Blumenau, de Gaspar e Ilhota. E o que se pode notar é o desespero de não ver sua voz expressa com o mesmo destaque que a dos empresários e político. “Por favor, não esquece de falar aí na tua reportagem sobre o pessoal de Gaspar, a gente tá abandonado lá”, pedia um jovem pai, massacrado pela idéia de que nunca mais vai poder ter sua casinha de volta. “Era simples, mas era minha”.

Os representantes do MAD falaram da área de ocupação, em Blumenau, onde estão as famílias que se recusaram a ficar nos abrigos, uma vez que lá, sequer podiam se manifestar sem ser reprimidas pela vigilância da prefeitura. “Nós estamos ali na ocupação, todos os dias, resistindo, denunciando, ajudando as famílias desabrigadas, passando informações, organizando. A gente só pára este movimento quando a última casa for entregue ao último desabrigado”. Segundo os membros do MAD, restam ainda mais de 1500 pessoas sem casa e sem qualquer ajuda da prefeitura. Tudo é muito lento para os pobres. As prioridades são sempre para áreas mais visadas pelo turismo. Os abrigos provisórios vão se eternizando e as pessoas que lá vivem sequer podem fazer reuniões. São proibidas.

Os jornais que circulam em Blumenau como o Santa e o DC, ambos da RBS, deram destaque às obras de reconstrução da cidade, mostrando em infográficos tudo o que já foi refeito. Mas, como é natural em veículos que não praticam o jornalismo e sim a propaganda, as obras que aparecem como realizações da prefeitura são na sua maioria conclusões de obras já orçadas do governo federal. Tudo é computado como reconstrução do desastre, mas muito pouco do que está ali é coisa voltada para os desabrigados. Estes continuam tendo de se organizar coletivamente, com o apoio de sindicatos e alguns poucos políticos. Quem se atreve a andar pela Blumenau real imediatamente vê que o que dizem os jornais é só uma visão do poder. As famílias humildes que se concentraram em frente à catedral naquele sábado de chuva, com suas faixas e suas dores, precisam, além de lutar pelos seus direitos, enfrentar a terrível indiferença que já começa a se sentir por parte dos que voltaram à vida normal.

No geral, aqueles que conseguiram se reerguer seguem com suas vidas e, massacrados pela desinformação dos jornais, acreditam que os que ainda estão nos abrigos é porque não se esforçam o suficiente. Numa cidade onde o conceito de trabalho faz parte da vida como uma segunda pele, esta idéia de que os desabrigados precisam mais é trabalhar, fica visível no rosto dos passantes que, muitas vezes se recusam até de pegar um panfleto.

E assim segue a vida nesta cidade de festas de outubro, chope e bandinha. Mas, nas suas entranhas se move um povo que não pretende desistir. O desastre, com toda a sua dor, trouxe também o germe da luta para o vale. E isso já se espalha, lento, mas seguro!

Veja o vídeo do ato do dia 21. http://www.youtube.com/watch?v=mR-O1mrfgao

domingo, 22 de novembro de 2009

O futuro da espécie


Nestes dias em que as tormentas e os tufões fazem morada pelo nosso Estado tenho lido coisas que me fazem pensar. Primeiro são as que se remetem ao tempo mesmo. Parece até que estas desgraças causadas pelos ventos e chuvas são coisas que brotam do chão. Como se houvesse um deus vingador que, de repente, resolvesse jogar sobre a terra todas as maldições. Ora, as loucuras do tempo são obras humanas. É o domínio sobre a natureza, a destruição, o tal do progresso que não leva em conta o necessário equilíbrio que precisa haver entre as coisas vivas. E, é claro, a hegemônica ação de um sistema no qual para que um viva outro tenha de morrer.

O sistema capitalista que destruiu o feudalismo na Europa e depois se estendeu para o mundo todo tinha uma promessa bonita demais. Com o desenvolvimento das forças produtivas, com o progresso, a humanidade iria chegar a um tempo de fartura e saciedade como nunca tinha sonhado. E grande parte das pessoas entrou nessa onda. Pois bem, a promessa não se cumpriu. A fartura veio apenas para alguns e a multidão dos demais é o bagaço moído que possibilita a saciedade dos poucos. E, neste simulacro de beleza, estes poucos foram destruindo a vida mesma. Daí todas estas mudanças no planeta, resultado visível e “sentível” da sanha acumuladora.

Pois no meio destas tragédias ambientais uma coisa me chamou a atenção. Numa destas passagens de tufão, o Estado ficou dois dias sem luz. Os jornais, como sempre estúpidos e incapazes de narrar os contextos dos fatos, deram destaque ao fato de que a falta de energia deixou muitas famílias sem comida, uma vez que: “tudo que havia nos frízeres e congeladores tinha se estragado”. Fiquei a pensar. É da natureza do sistema capitalista a lógica da acumulação. Daí o uso do frízer ( escrevo assim mesmo, abrasileirado). A pessoa compra muito mais do que vai comer e acumula, acumula e acumula. “Tinha promoção”, “se não comprar agora fica mai caro depois”, estes são os argumentos que aparecem e são mesmo muito válidos. Mas, o que salta aos olhos é isso mesmo: acumulação.

Quando não se tinha geladeira a gente buscava a comida do dia. Nada de acumulações. As coisas eram frescas e saudáveis, e se não houvesse energia ninguém perdia suas provisões. Agora aí está. A natureza anda cobrando as contas. A ganância humana está botando o planeta a perder. Talvez fosse hora de as pessoas pensarem firmemente num outro modo de organizar a vida. Quando o mundo feudal estava em pleno vigor, ninguém imaginava que podia acabar e vir um outro tempo. Agora também é assim. As pessoas pensam que o capitalismo é inevitável, eterno. Bom, não é! E, ou a gente muda a vida, ou nossa raça se extingue. E essa decisão pertence a todos nós.