sábado, 11 de agosto de 2018

Pátria Grande, sempre.


Hoje se falou muito sobre a “Ursal”, uma suposta conspiração socialista para tornar toda a América Latina um só bloco de poder, acabando com todos os países, aos moldes do que aconteceu na União Soviética. O candidato chamado Cabo Dalciolo usou essa sigla para se referir a ideia generosa e integracionista de Simón Bolívar: a Pátria Grande.

Em primeiro lugar é preciso entender o que é a proposta de Pátria Grande. Durante as guerras de independência, quando as províncias, todas submetidas ao governo das metrópoles de Espanha e Portugal, estavam se libertando do jugo colonial, apresentaram-se dois caminhos. Ou cada pedacinho formava um estado isolado, com governo próprio, ou formava-se uma pátria grande, com o que hoje são países sendo províncias. A ideia era a formação de uma grande nação, capaz de unificada e livre dar novo rumo para toda a gente que aqui vivia.

Não se pode dizer que naquele então seria uma pátria socialista porque Bolívar não tinha o socialismo em mente. Era um liberal, ainda aprendendo sobre seu próprio povo. Seu sonho era ver toda a gente unificada numa pátria soberana e capaz de conduzir seu destino sem a interferência de nenhum outro país. Aquilo que hoje conhecemos como países seriam as “pátrias chicas”. Pode até ser que chegasse a pensar no socialismo, mas não teve tempo.

Bolívar foi traído pelos seus generais, os quais só queriam saber de criar cada um deles seu próprio país. Assim, destruíram Bolívar, levaram-no a morte e balcanizaram a América do Sul, recortando-a em países, alimentando velhas rixas e inimizades.

O resultado é o que vemos. Países isolados, cada qual com seu projeto de poder, alguns ajoelhados diante do império estadunidense, outros tentando caminhar com as próprias pernas, outros ainda buscando tornar real o sonho de Bolívar.

Assim que o sonho da Pátria Grande não é uma conspiração, nem um delírio e muito menos uma alucinação. Está, inclusive, consolidado na Constituição brasileira, no parágrafo único, do artigo 4: “A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações”.

Então, por caminhos tortos, o Cabo candidato acertou em parte. Pelo menos na ideia de uma Pátria Grande. Errou ao tentar imputar a Ciro Gomes uma liderança nessa empreitada. Nada menos provável. A grande nação bolivariana é obra para revolucionários. E será socialista, é claro. Com esse povo, vamos!


quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Preconceitos úteis


Para desqualificar os indígenas criou-se a ideia de que são "indolentes". Não são, e nunca foram. Apenas o conceito de trabalho para as populações originárias é totalmente outro, diferente do que foi instituído pelo capitalismo. Nos impérios que aqui existiam (inca, asteca e maia) o trabalho era comunitário e seguia o ritmo das estações, da natureza. Não havia a proposta de gerar excedentes para vender. Era outra forma de viver e organizar a vida. As comunidades que viviam nos trópicos tinham tanta abundância que o trabalho - aos moldes do capital - era totalmente dispensável.

Para desqualificar os negros e sua resistência à escravidão, criou-se a ideia de que são "malandros". Não são, e nunca foram. Mas, os senhores de escravos precisavam desse mito, porque nos tempos da escravidão os negros eles usavam da capoeira para se manterem forte e ágeis, porque criavam formas de resistência para enfrentar a dura realidade de não ser livre. Assim, era preciso esterilizar suas lutas, tornando-os "marginais.

Esses preconceitos perduram até hoje, porque os indígenas estão aí a reivindicar terra. porque os negros estão aí a reivindicar reparação e vida digna. Então, é preciso seguir desqualificando essa gente, a tal ponto de seus próprios descendentes reproduzirem esse preconceito.

Na verdade, se tu pensares bem, verás que indolentes e malandros são aqueles que vivem do trabalho alheio. O que equivale a 1% da população mundial, os que exploram os trabalhadores e vivem das riquezas que não produzem. E isso não é criação nossa. É a realidade material.

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

O Brasil, as eleições e as opções dos trabalhadores

Lutas ainda são pontuais, mas tendem a crescer

Vivo na política desde bem pequena. A ditadura militar foi vivida na pele. Meu pai era trabalhador na rádio do João Goulart em São Borja. A política, então, sempre correu no sangue. A grande política. O debate dos projetos. A certeza de que tinha de ficar sempre do lado dos trabalhadores. A consciência de classe. Tudo isso fui construindo ao longo dos anos dessa vida louca. Sei de onde venho, sei quem sou e sei onde quero chegar. Sou trabalhadora e quero um mundo de justiça, de riquezas repartidas, na prática do comum. Essas são minhas certezas.

É por isso que me entristeço quando preciso responder sobre a conjuntura política aos amigos que me perguntam: o que está acontecendo? Quem afinal é a esquerda hoje no Brasil? Podemos confiar no PT? Vejo nos olhos deles o desconserto, a confusão, o embaralhamento das ideias. Como votar no PT se eles estão se aliando aos inimigos em vários estados do Brasil? Como entender um povo que foi às ruas chamando determinados políticos de golpistas, e agora estão aí, abraçados? Como votar no PSOL se o candidato é só uma cópia mal acabada do Lula? E o PSTU que não entende a conjuntura internacional e ataca as propostas progressistas na América Latina? E PCB que se aliou ao PSOL? O que fazer? O que fazer? 

Sim, a conjuntura é confusa demais. Os fatos se sucedem e nos confundem. Ou não.

O professor Nildo Ouriques, que foi pré-candidato à presidência pelo PSOL, desde há muito tempo vem falando de um “consórcio petucano” na política brasileira. E o que seria isso? Ele quer dizer que tanto o PT quanto o PSDB tem projetos de poder bem parecidos, que se juntam nas questões estratégicas como a questão agrária, o agronegócio, a energia, as leis trabalhistas e só divergem em questões muito pontuais. Funcionam assim como os dois grandes partidos dos Estados Unidos: republicanos e democratas. No fundo, são a mesma coisa, com diferenças muito sutis. No caso do PT, esse tem mais sensibilidade social que o PSDB. Coisa pouca, mas que num país continental pode fazer a diferença, como fez o bolsa-família, fome zero e outros políticas sociais que, de fato, tiraram milhões da pobreza extrema.

Mas, o fato é que nas questões estruturais, nada de novo apareceu com os governos petistas. A aliança com o capital estrangeiro, com alguns grupos da burguesia nacional, com o agronegócio, com os bancos, tudo isso aconteceu sem percalços. Da mesma forma, o tacão sob a cabeça dos trabalhadores, com a reforma da previdência dos servidores públicos, com a abertura do crédito que engordou os bancos e endividou grande parte dos trabalhadores, e a lei antiterrorismo que hoje pesa sobre os lutadores sociais. Ou seja: nada de novo sob o sol.

Agora, na corrida eleitoral, tudo se repete. Os projetos de governo mal se diferenciam e o sonho petista é voltar a ser como no primeiro mandato do Lula. Bom, não será. Porque qualquer pessoa que entenda minimamente o movimento da vida sabe que a conjuntura é outra. Que as coisas se transformam, mudam. Nada será como antes. A conjuntura mundial mudou, o Brasil é outro, cindido pela onda de ódio e do preconceito contra os trabalhadores, os que lutam por outro modo de produção. Não que esse ódio não existisse antes, mas agora ele se expressa mais livremente e encontra representantes viáveis. 

Diante desse quadro de horrores, que fazer? A resposta já está dada pelos próprios trabalhadores, pelas gentes oprimidas que vivem o cotidiano da morte, do desemprego, do ódio, da falta de saúde e de educação. Eles querem uma proposta radical de mudança. E mostram isso quando pendem para propostas radicais, de direita. Querem mudanças de fato, e não o mesmo velho discursos que conhecem e sabem onde vai dar. Podem até não compreender que as mudanças radicais apontadas pela direita são contra eles, mas sabem muito bem que o que aí está e as promessas de mais do mesmo, tampouco levarão a um bom lugar. Então, que mude. Depois se vê. Foi assim no golpe: “primeiro, a gente tira a Dilma...” E ainda não tiveram o tempo histórico largo para compreender o desastre que se aprofundou com o governo Temer. 

A proposta de um radicalismo político de esquerda tem sido o caminho apontado pelo grupo liderado por Nildo Ouriques, no movimento pela revolução brasileira. Um outro/novo radicalismo político, que mostre claramente as propostas, que ataque de fato a corrupção, a pequena e a grande, esse câncer que toma conta do corpo do estado e das instituições, já que é intrínseco ao capitalismo. Uma proposta que avance para mudanças estruturais concretas e factíveis. A revisão dos contratos da dívida que certamente apontarão as irregularidades e ilegalidades, desafogando o orçamento brasileiro e garantindo investimentos maiores na educação e na saúde, provocando mudanças reais na vida das pessoas. 

Os brasileiros estão fartos de mi-mi-mi e de enganações. Aprenderam muito com esse processo de golpes e contragolpes. Mas, infelizmente, no cenário eleitoral do momento, não encontram nos quadros da esquerda uma opção segura, que aponte com competência mudanças concretas e radicais. 
Assim, o embate que travaremos nas urnas será a trágica escolha entre o radicalismo de direita contra o consórcio petucano. Os que forem às urnas não terão outra escolha. 

O que há de bom nessa conjuntura que mais parece um conto fantástico de terror é que a vida mesma não se resolve nas urnas. Ela é definida na luta diária dos trabalhadores organizados que atuam em consequência quando são exigidos. Isso tem acontecido desde sempre, mesmo na ditadura. Então, sabemos que as lutas seguirão e que a vida política continuará a acontecer no duro embate contra o capital. O desafio que se coloca é a reconstrução da unidade dos trabalhadores sob a bandeira da revolução brasileira, a transformação de verdade, desde baixo, e que garanta as mudanças estruturais necessárias. Um longo caminho, é certo, mas numa estrada que não está vazia. Por aí vamos! E temos companhia!