quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Muppets comunistas...

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Lá se foi o seu Chico



A tarde era de sol e abafada. Um dia triste. Encantava aquele que acordou o Campeche nos anos 80, para a alegria, para a política, para vida. Seu Chico. A praia era raiz, tinha pouco rauli e o que era um rancho de pesca virou um bar. Lugar de acolhimento, de sombra, de água fresca e de histórias. Quando ninguém na cidade abrigava o povo da esquerda era ali que se faziam reuniões e festas. Ali se conspirava e sonhava. A figura simples e direta do Seu Chico atuava como um regaço, onde as gentes que faziam a luta podiam descansar.

Chico era homem do mar, lançava o barco, puxava a rede, trazia o peixe. Foi assim que, junto com Eva, criou 16 filhos. E os criou gente de bem, de responsabilidade, de valentia. Um bom exemplo é o Lázaro, que até vereador foi, e como incomodou os poderosos. Deles vieram netos, bisnetos e tataranetos. Chico amava o mar do Campeche, as dunas, a restinga. Era deles seu primeiro sorriso, a cada manhã, quando vinha tomar o banho gelado que lhe dava vigor e saúde. Chico era doce como mel e seu sorriso derretia qualquer coração. Não tinham maiores ambições que a de criar os filhos, encaminhá-los e ficar ali, na beira do mar, vendo a vida passar.

Não foi sem razão que o pequeno cemitério do Campeche ficou repleto para a despedida. Chico encantou na tarde do dia 20 de dezembro depois de alguns dias lutando no hospital. O velho pescador tinha um câncer, mas, com certeza, a tristeza de ver o seu bar derrubado pelas máquinas da prefeitura lhe entristeceu demais os últimos dias. O bar era o seu mirante para o mar, lugar que não mais dominava no remo e na rede. O bar era seu refúgio. Não era dinheiro o que buscava ali. Tanto que a construção era simples, de madeira velha, bem raiz, como cabia ao Campeche. Não era um projeto capitalista. Era um espaço de aconchego e partilha. Ali se festejavam os carnavais, o natal, o ano-novo, os aniversários, qualquer coisa que alguém quisesse. Ainda assim as máquinas vieram...

As máquinas que nunca derrubaram a casa do Guga, nas dunas, nem o Costão do Santinho, onde veraneiam os ricos, ou os hotéis de luxo nas restingas. Não, apenas o bar do Chico era “ilegal”. Espaço histórico da comunidade: ilegal. Veio abaixo. Por birra, por vingança. No seu lugar tentaram erguer o deck de um condomínio. O povo revoltou: botou abaixo. Ainda assim, o bar do Chico não voltou e ele ficou mais triste.

Hoje, o dia abafado deu lugar à brisa suave, que começou a soprar na hora em que o frágil corpo do Chico descansava na beira do mar. Havia um cheiro de maresia, grito de pássaros e aquela aragem boa. A natureza oferecia o que de melhor tem para receber o amigo de tantos anos. O padre Vilson fez a missa, amarrou as palavras. A família se despediu, sem desespero, porque aquela era uma vida que tinha se cumprido em plenitude. Chico fez sua história, virou história. Morto que não morre, figura imortal. Como bem lembrou o Ataíde, surfista das antigas, em cada entardecer ainda se ouvirão as palavras do velho pescador a dizer: “ rapaze, rapaze, sai da água”.

Com o encantamento do seu Chico, o Campeche também encerra um ciclo. Hoje, o lugar bucólico onde ele fincou o seu bar já está invadido por condomínios, asfalto, grandes empreendimentos. Há luta, mas as máquinas parecem mais fortes. Resta aos novos moradores - nativos ou não – decidirem o que querem para suas vidas. Um lugar sem alma, sem identidade, poluído e intransitável ou um bairro jardim, de casas baixas, com cachorros, gatos e passarinhos, onde as pessoas se conhecem e se amparam? Muito já foi destruído, mas ainda há tempo de parar.

No silêncio da noite que se aproximava, parada na beira do mar, eu pedi ao meu deusinho que recebesse o seu Chico nos braços e que olhasse por nós aqui embaixo, no meio de tantos vilões, pelos quais, como ensinava Cruz e Souza, temos de ter ódio, ódio são, ódio que move. Na imensidão do céu do Campeche se foi o seu Chico, remando a canoa invisível. Vai em paz. companheiro, que aqui a gente continua. Tu cumpriste teu destino e o fizestes bem.

Bolívia vence o Mac Donalds

Veja por que a rede de restaurantes Mac Donalds faliu na Bolívia. É diferença de um povo que reverencia a Pachamama.

Governo catarinense fecha escolas em Florianópolis

Menino no Mont Serrat - foto de cizaniafilmes.blogspot.com


Uda Gonzaga tem 73 anos e sempre foi educadora. Formou-se no ano de 1963 e logo iniciou o trabalho de ensinar a criançada na sua comunidade, o Mont Serrat, no maciço do Morro da Cruz, em Florianópolis. As poucas famílias que então lá viviam construíram, elas mesmas, duas pequenas salas, onde a gurizada aprendia as primeiras letras. O tempo passou, a comunidade cresceu e o governo acabou construindo mais duas salas na área da caixa d´água. Mais famílias chegaram e foi preciso alugar três casas para transformá-las em escola, até que as aulas passaram a ser dentro da Copa Lord, a escola de samba da comunidade. De novo as famílias se mobilizaram e o governo alugou outras casas, maiores, para abrigar os alunos. “Tudo sempre foi na luta, tudo sempre teve de ser arrancado”, diz Uda.

Mais tarde, a escola foi para a creche, que era um espaço maior, e logo em seguida para o terreno em frente à igreja. Havia aulas da primeira a quarta série e eram mais de 500 alunos, tudo registrado nos livros da escola. Foi só em 1978 que se construiu o prédio da que hoje é a Escola Lúcia do Livramento Mayvorne e ali as demais crianças do morro aprenderam a ler e escrever, sempre perto de casa e com o acompanhamento das famílias. São 49 anos de história e de muita batalha para que esse direito pudesse ser vivido.

Pois neste dia 20 de dezembro, alguns dias antes do Natal, o governo do Estado, comandado por Raimundo Colombo (PSD, ex-DEM), desativa a escola (com mais de 200 alunos) e repassa o prédio para uma congregação religiosa, a dos Maristas. A comunidade do Mont Serrat está chocada. Ninguém jamais poderia esperar algo assim. “A notícia chegou no dia 24 de novembro. O diretor estava na escola e recebeu um telefonema dizendo assim: já tens lugar para ficar? E ele ficou sem saber o que dizer. Não sabia de nada. Ninguém sequer avisou, ninguém veio falar com os professores, com os alunos, com a comunidade. Foi um choque”, conta dona Uda.

“Tiraram o nosso chão” diz a mais conhecida professora da comunidade. Ela já perdeu a conta de quantas vezes desceu o morro atrás das autoridades para que o Mont Serrat pudesse educar seus filhos. E toda a gente sabe que essa não é uma comunidade qualquer. É a mais tradicional de toda a ilha, berço do samba, espaço de incontáveis lutas. “Não é justo o governo fazer isso com a educação, leiloar, fazer um quem dá mais. Nós seguramos essa escola essas décadas todas, sem ajuda, sem apoio. E agora, eles entregam para a iniciativa privada. Quem não gostaria de ganhar um prédio daqueles? Estamos muito tristes. No próximo ano a escola completaria 50 anos. Não há palavras para descrever a dor”.

Mas não foi só no morro

A dor da dona Uda não é solitária na cidade. Desde o ano de 2007, o governo estadual fechou mais quatro escolas. A primeira foi a Antonieta de Barros, no centro da cidade, que tinha problemas estruturais, não foi consertada e jamais se devolveu à cidade, virou um almoxarifado da secretaria de educação. Abrigava mais de 252 alunos, a maioria oriunda dos morros da capital. Depois foi a Silveira de Souza, fundada em 1913, a segunda escola pública do estado de Santa Catarina, que funcionava num prédio belíssimo no centro. Ela foi municipalizada em 2009 sob a alegação de que tinha poucos alunos (224) e entregue à prefeitura que fez parceria com a iniciativa privada e transformou o lugar em espaço cultural. Em seguida fechou a Celso Ramos, no pé do Morro do Mocotó, outra comunidade tradicional da ilha. O prédio seria doado para a Assembleia Legislativa e só acabou se transformando em creche porque a comunidade empreendeu uma luta gigantesca para isso. E depois atacou a não menos tradicional comunidade da Coloninha, na área continental, fechando a história escola Otília Cruz, com o projeto de construir ali uma cadeia. E agora, isso, mais uma cartada, entregando a escola do Mont Serrat para os padres maristas.

Todos esses fatos não aconteceram sem luta. Entre os professores que levaram uma greve histórica esse ano, essa era uma denúncia recorrente, e a reabertura das escolas pauta de reivindicação. Mesmo assim, o governo permaneceu surdo. Os argumentos usados pelo governador são os mais absurdos possíveis. Segundo ele, as escolas foram fechadas porque havia muita evasão. Ora, mas por que acontece a evasão nas escolas das periferias? Qual estudo foi empreendido pelo estado para saber por que os jovens empobrecidos deixam a escola? Por que a secretaria de educação não realizou uma campanha de matrículas? Por que não foi conversar com os pais, com a comunidade? Não. Em vez de se preocupar em trazer de volta para a escola os jovens que evadem prefere fechá-las. Ou ainda melhor, entrega-las para as mãos privadas, repassando assim, sem maiores custos um patrimônio histórico, muitas vezes construído com as mãos, o sangue e o suor da comunidade.


O mais incrível nessa história de terror da educação catarinense é que o mesmo governo aprovou na Assembleia Legislativa uma verba de 360 milhões de reais para uso em propaganda em 2012. Isso significa o gasto de um milhão por dia para falar das belezas do governo, enquanto para a educação não há recursos. Também se sabe que dos 7% do PIB que deveriam ser investidos na educação, apenas 2,9% recebem esse destino, conforme lembra a dirigente do Sindicato dos Professores – regional de Florianópolis - Rosane de Souza. Segundo ela, o governo provocou a precarização das escolas e agora entrega aos privados, sem se importar com a juventude que fica ao deus dará. Ela acredita que a proposta de municipalização das escolas básicas deve piorar ainda mais a situação nas comunidades empobrecidas. “Se hoje apenas 18% das crianças da educação infantil são atendidas pelo município, e isso é um dado nacional, do IBGE, como vamos acreditar que o município vai dar conta da escola básica? Sabe-se que nas comunidades de baixa renda esse número cai ainda mais, fica em 11%. Então, qual será o futuro da educação”? Alguém tem alguma dúvida?

Segundo Rosane o fechamento da escola do Mont Serrat é mais um golpe na população catarinense. E mais ainda, um tremendo golpe nos professores. Imaginem um professor que atua há 20 anos numa escola, como é o caso de alguns na do Mont Serrat, ser, de repente enviado para outra escola, sem qualquer conversa, sem diálogo, sem preparação? “Todos os efetivos serão distribuídos pela rede e os contratados em caráter temporário, demitidos. E assim vai agindo o governo. Primeiro ele abandona as escolas, depois deixa às baratas e por fim, entrega para a inciativa privada”. Nessa lógica, que se danem os professores e que se danem as crianças.

Mas, o Sinte, sindicato dos professores, promete que essa não é uma guerra perdida. A luta vai continuar. Nesse final de ano a categoria ainda segue lambendo as feridas de uma longa greve travada para que o governador cumprisse a lei e pagasse o piso nacional. O movimento durou dois meses, foi desgastante e terminou sem maiores vitórias. Mas, com a retomada do ano letivo as privatizações de escolas estarão na pauta de luta. “Não estamos vencidos. Se o governo tem dinheiro para aplicar em propaganda e para financiar escolas privadas, haverá de ter dinheiro para recuperar as escolas e voltar a atender as comunidades que agora estão arrasadas com os fechamentos”.

Esse também é o sentimento das famílias do Mont Serrat, a quem está tocando agora esse momento de estupor. “Estamos no chão”, repete dona Uda. Mas, talvez, seja hora de levantar e lutar. A história da escola Lúcia do Livramento Mayvorne, que completaria 50 anos em 2012, não é coisa para ser derrubada assim, numa canetada. Ela é fruto da caminhada de toda uma comunidade e precisa ser respeitada.

Também é hora de a sociedade catarinense saber o que se passa, já que esses fechamentos saem na imprensa como drops informativos, sem contexto, sem histórias, sem humanidade. E assumir essa luta junto com as comunidades. Juventude precisa de educação, e educação de qualidade. Deixá-los fugir da escola, sem saber o que se passa, sem compreender esse movimento de evasão, fechando as escolas, é quase criminoso.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Resistindo à mais-valia ideológica

Diz o teórico venezuelano Ludovico Silva que a televisão é o lugar onde as pessoas entregam a sua mais valia-ideológica. Sentadas diante da tela, as pessoas, acreditando estar descansando ou fruindo, na verdade, seguem trabalhando para o capital, que os obriga a consumir e consumir. Como bem mostra essa propaganda do Itaú. Uma maravilha que usa a imagem de um rapper crítico (?) emociona e toca o coração da juventudo. Ao final, tudo o que ela quer é que a pessoa seja cliente de um banco, empresas que mais lucram no mundo.




O legal é que jovens há que entendem o papel da televisão, que percebem a manipulação, a violência da propaganda que se apropria do que há de mais belo em nós para nos fazer "sonhar", desde que o nosso sonho engorde suas contas bancárias. E jovens há que, em vez de pensar sobre os sonhos possíveis, começam a andar e abrir caminhos para que o sonho de emancipação e vida livre possa realmente ser real, sem Itaú e sem exploração. Foi o que fizeram os jvones do Levante Popular. Veja o vídeo resposta.



segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Reafirmando a luta

Desejos de bom natal!


E então é natal. Aniversário do meu deusinho. Digo deusinho porque não lhe arrogo poderes sobrenaturais. O vejo assim, homem, cheio de dúvidas sobre seu destino, a clamar pelo pai na cruz. O vejo menino, a questionar as leis juntos aos velhos encarquilhados em certezas ultrapassadas e aprisionantes. O vejo jovem, a arrancar os outros de seu conforto, propondo a ilegalidade e a rebeldia. Gosto demais desse Jesus arrogante, a expulsar vendilhões do templo, denunciando-os e apontando-lhes o dedo. Encanto-me com o Jesus que se coloca diante do poder e, arriscando morrer, levanta a cara e diz: “assim o dissestes”. E se entrega ao juízo do povo, mesmo sabendo que esse mesmo povo que ele tanto amou, o vai abandonar, preferindo Barrabás. É esse guri que eu espero nas noites de natal. Aguardo, cheia de esperança, que ele renasça nos jovens que vejo andar por aí a fazer a luta, a questionar as leis, a apontar os vendilhões.

Sei que o natal é esse tempo ancestral, celebrado desde os tempos imemoriais por todas as culturas. O solstício de verão, o começo de nova estação. Sei que era nesse dezembro que as gentes de outros tempos dançavam sob o fogo, cantavam e esperavam que a vida revivesse e a roda do mundo seguisse seu curso no rumo do bem-virá. Gosto de me perder nessa esperança do povo andino, o Qhapac Rayme, e oferecer alimento a mãe-terra, Pachamama, confiando em suas bênçãos e na vida que brota. É alimento, e faz com que eu veja que as coisas sempre nascem, do nada, da dor, da desesperança, da desilusão. Há sempre um reviver.

Então, quando chega esses dias de natal, gosto de celebrar. Um pouco como as culturas antigas, um pouco como as da minha gente ancestral, mas, nascida e criada na herança cristã, também me apetece compartilhar com meu deusinho o dia do seu nascimento. Porque Jesus, como tantas outras divindades de tantas outras religiões, nasce no dezembro, perto do solstício, essa noite curta que promete vida, e nada mais.

Assim, este ano, no natal, vou adentrar a noite, farejando a vida. Que ela venha, pelas mãos dos velhos amigos, e na caminhada dos novos, que chegam agora e já se comprometem com tanta força. Espero-te meu deusinho, assim como espero todas as divinas criaturas capazes de brotar fogueiras em mim e em todos os que amo!