Alzheimer/Velhice

sábado, 29 de abril de 2017

Sobre ser trabalhador em mais um dia de trabalhador

Foto: Rubens Lopes

Imagine a seguinte situação. Tu fazes um contrato com teu patrão. Tu trabalhas 30 dias e ele te paga até o quinto dia útil. Assim diz a lei. Qualquer um que trabalha sabe que tudo o que dá nas oito horas que fica no emprego é muito mais do que o valor que recebe no salário. A riqueza que o trabalhador gera é infinitamente maior do que o salário que o patrão paga. A isso chamamos mais-valia. Mas, tudo bem, nem vamos falar nisso.

Vamos só pensar como um contrato comum, sem considerar o roubo de trabalho. A pessoa trabalha os 30 dias e tem o direito de receber no dia combinado.

Pois bem, em vários estados do país isso não está acontecendo. O estado do Rio de Janeiro é um deles. Desde o ano passado que o governo vem atrasando o dia do pagamento. No último mês de março, o salário dos trabalhadores públicos estaduais saiu apenas no dia 18. Mas, as contas não esperam. E os trabalhadores além de receber com atraso precisam pagar multas de todas as contas que estão pendentes. Isso parece certo? Quem de nós viveria isso sem se indignar, sem se revoltar? Afinal, a pessoa está cumprindo a sua parte no trato. Mas o patrão decidiu burlar a lei. E pronto. Nada acontece. É por isso que no Rio de Janeiro os protestos são duros. Esse inferno já passa de um ano. E os próprios policiais que atacam e ferem os trabalhadores vivem o mesmo drama. Loucura pensar que eles mesmos não se revoltem.

No estado de Minas Gerais os trabalhadores estão recebendo o salário em três partes ao longo do mês, e a regra do quinto dia útil tampouco é respeitada desde o ano passado. Nesse mês de abril os trabalhadores receberam a primeira parte apenas no dia 14. E lá se vai o salário nos juros das contas de água, luz, telefone e tudo mais. Já não é mais possível planejar a vida, porque ninguém mais tem certeza se vai ou não receber o salário. No Rio Grande do Sul isso também acontece.

E isso está acontecendo agora, antes mesmo da reforma trabalhista do Temer que prevê o negociado valer mais do que a lei. Agora imaginem como será a vida dos trabalhadores se não houver uma lei que os ampare no mais mínimo? O patrão vai decidir o que fazer, como fazer e quando fazer. Não há negociação entre quem tem os meios de produção e os que têm apenas a força de trabalho para vender. O que vai acontecer é que o patrão vai tirar muito mais do trabalhador do que já tira agora.

E não me venham com esse mimimi que trabalhador público não trabalha. Ora, se o país está funcionando é porque os trabalhadores estão trabalhando. Não fosse assim, estaria tudo parado. Estradas estão sendo feitas e mantidas, hospitais, postos de saúde, escolas, serviços administrativos, coleta de lixo. Tudo.  Pode não ser o melhor serviço público, mas não é culpa do trabalhador. Se forem a fundo verão que o que falta mesmo é investimento nos setores públicos e que é a mão de obra (os trabalhadores) a que garante o mínimo que ainda temos. Certo, tem um que outro que é vagabundo, mas isso tu vais encontrar no mundo privado também. Então me poupem.

O que se viu no Rio de Janeiro foi o ensaio da barbárie que vai ser tornar o país com a desregulamentação das leis trabalhistas. E isso não foi só agora na Greve Geral, desde que os trabalhadores públicos estaduais começaram a ter seus salários atrasados eles têm lutado e enfrentado a fúria da repressão. E vejam, eles querem apenas ter os salários pagos em dia.

O governo diz que o estado está quebrado e que não pode pagar o salário no prazo. Mas a culpa do estar quebrado não é do trabalhador. O que quebra o estado são os empresários – no geral, amigos dos governantes – que não pagam os impostos ou então as dívidas ilegais e ilegítimas contraídas sem  o conhecimento dos contribuintes. Isso é público e notório.

Por que cortar na carne do trabalhador e não cobrar os empresários? Quem tem mais condição de aguentar um baque financeiro? Os responsáveis pelas dívidas do estado são os que têm de pagar.

Mas, no sistema capitalista de produção, não há compaixão para com o trabalhador. Ele existe apenas para gerar a riqueza que aquecerá o rico. Com o trabalho do trabalhador ele seguirá mais e mais rico. Não importa que massas de gente pereçam. Sempre haverá corpos se oferecendo para a exploração. Os capitalistas não se emocionam com famílias inteiras sendo despejadas para que um terreno seja limpo para a construção de um xópin. Não. Não se emocionam com gente se matando porque não consegue pagar o aluguel ou dar comida aos filhos. Não.

Então, aos trabalhadores só restam duas opções. Ou se mantém como escravos desse sistema que não lhes leva em conta, e que mais dia menos dia vai lhes descartar, ou se rebelam e procuram construir outro modo de organizar a vida.

Essa é a parada, amigos. Temos de escolher.

Que esse dia primeiro de maior sirva para a gente pensar sobre isso.

Tu, que vive de salário, para e pensa. O que aconteceu no Rio de Janeiro, com a polícia atacando os trabalhadores até mesmo no palco onde falavam sobre seus problemas não é uma coisa isolada. É o que está posto para cada um de nós. Bordoadas na cabeça, como a que feriu o jovem em Goiás, bombas e gás na cara, quando não, tiros. Para que aceitemos a escravidão e a morte sem rebeldia.

Há os que lutam. Pelo menos, respeita. Porque esses, quando conquistarem o direito de bem viver, o garantirão também para ti. 

sexta-feira, 28 de abril de 2017

A greve foi um sucesso


Foto: Rubens Lopes - Em Florianópolis a greve reuniu mais de 20 mil pessoas

Digam o que disserem os meios de comunicação comercial, a greve geral desse dia 28 foi um sucesso. Desde a madrugada os trabalhadores começaram a se mobilizar em cada canto do país. Das grandes cidades até os recantos mais escondidos saltaram as vozes e as bandeiras de luta. Os trabalhadores sabem muito bem o que está em jogo: fim da aposentadoria, fim dos direitos. É simples.

Agora o desafio é manter a mobilização acesa. A reforma trabalhista já passou na Câmara dos Deputados e deve passar pelo Senado, possivelmente com a mesma velocidade. Isso significa que em uma semana tudo poderá estar decidido. Como os atos dessa sexta foram na maioria pacíficos, talvez não sejam suficientes para tocar os senadores. E ainda que o presidente da casa tenha se manifestado, aparentemente contra a retirada dos direitos, quem pode saber? Quantos jantares no palácio não rolarão e quantas notas verdinhas não passarão por baixo do pano? Vai-se saber... Por isso não dá para baixar a guarda.

A movimentação desse dia 28, que a televisão golpista insistiu de chamar de “confusão” mostrou que a população está atendendo ao chamado da luta. Por alto, mais de 35 milhões de pessoas foram às ruas, fora aquelas que não chegaram aos atos, mas que, mesmo em casa, estavam apoiando. Gente demais para ser ignorada.

Apesar de a ideologia dominante ainda manter cativas algumas pessoas  na ideia de quem estava na rua era “vagabundo”, uma mirada cuidadosa na realidade já mostra que não foi bem assim. Vieram para as ruas os padres, as freiras, os trabalhadores do metrô, os motoristas, os funcionários públicos, as faxineiras, os estudantes, o pessoal do escritório e até os comerciários. As grandes cidades ficaram com seus centros vazios, as lojas não abriram, aeroportos não funcionaram. E bueno, se as coisas não funcionaram é sinal de que precisa ter alguém para fazê-las funcionar. Logo, os que pararam não são vagabundos, são os trabalhadores, os que verdadeiramente geram a riqueza de qualquer país.

O tamanho do inimigo finalmente juntou toda a esquerda e os atos aconteceram de forma unificada. A força da mobilização foi tão grande que quebrou a empáfia de alguns governantes que anunciaram antes que iriam fazer e acontecer. Tiveram que se curvar ao povo em luta. Foi o caso do prefeito de São Paulo.

No Rio de Janeiro a batalha foi feroz. E não é para menos, os trabalhadores estaduais vem enfrentando sistematicamente os atrasos nos pagamentos de salário. No mês de março, o dinheiro saiu só no dia 18, enquanto todas as contas são cobradas até o quinto dia útil. Era certo que lá haveria grande disposição. E, como sempre, também grande disposição da polícia em criar o tumulto. Tem sido assim desde o ano passado quando começou o atraso nos salários. Em vez de resolver o problema dos trabalhadores, o governo manda a polícia bater naqueles que protestam, indignados. E ainda há gente que acuse os cariocas de “vandalismo”. Ficar sem o salário para pagar as contas não seria um vandalismo maior?

Certamente nos meios de comunicação esse será o tema principal. Os “vândalos” do Rio. 

Nas mídias, que seguem paternalmente amparadas pelo dinheiro público da publicidade governamental, o discurso reproduzido à exaustão será de que o movimento só causou transtorno, que as pessoas “de bem” foram impedidas de trabalhar por conta da ação de vagabundos, e que a reforma trabalhista é boa e vai aumentar as chances de emprego. Mentiras que não poderão se sustentar diante da realidade. Quem teve acesso a outras informações pelas redes sociais, ou mesmo aqueles que viram passar as gigantescas manifestações em todos os lugares saberão que nesse dia 28 as gentes se levantaram e que estão contra as reformas de Temer e do “bonde” do Congresso.

Agora, é fazer esse bolo crescer e transbordar, para que os políticos sintam que estão esticando demais a corda. Ou para a reforma ou os trabalhadores saberão o que fazer. O ensaio foi bonito.  


segunda-feira, 24 de abril de 2017

Bartolina Sisa



Foi embora de mansinho... como lhe era típico. Amanheceu no domingo, dentro da casinha do cachorro. Parecia dormir, mas já estava encantada. Não gostava de pegação. Nada de colo, de nhumi nhumi, carinhos. Qualquer tentativa era brindada com boas unhadas. “Deixem-me só”, miava gretagarbodianamente. E partia, caminhando levinha, aboletando-se em alguma cadeira, refestelada. Era a mãe de todos os gatos. Ao todo deve ter dado umas 18 crias, todos sapequeando no meu quintal. Amarelinhos, branquinhos, pretos, cinzentos. Cada um deles com seu jeito amoroso e independente. Sobreviveu a quase todos. Agora ficaram apenas quatro, também seus filhos. Plantei-a no jardim, como todos, em meio a miados de tristeza e lágrimas de dor. Foram 13 anos de amor e parceria. Foi bom demais. Gracias, Bartolina...Nos veremos no céu dos gatos, pois certamente eu pularei pra lá...

O papel do Estado nas garantias sociais e o significado da desaparição desse Estado



Comentário no Informativo Paralelo, uma produção da Cooperativa Desacato Sobre o desmonte do estado é preciso deixar bem claro aos ouvintes. Vivemos num estado capitalista. E o que é um estado capitalista? Marx foi o que melhor o descreveu: é nada mais, nada menos do que um comitê de negócios da burguesia, que é a classe dominante. O estado existe para servir aos poderosos. Tudo é para eles. O estado se organiza para tornar a vida dos que já são grandes, melhor. E nesse estado capitalista, o que é oferecido aos trabalhadores, aos desempregados, aos sem-terra, sem-teto, os sem-nada? Pouca coisa. Na verdade, migalhas. E elas só aparecem quando o estado está em algum pico de crescimento e bonança. Quando acontece qualquer coisa que pode diminuir o lucro dos ricos, o próprio estado começa a gritar: é a crise, é a crise. Na verdade, não há crise, pelos menos não para os ricos. A crise sempre é para aqueles que já são empobrecidos pelo capital. Se os lucros diminuem, a saída que os governantes encontram é espremer os trabalhadores, já que são esses os únicos que criam riqueza. É do trabalho que nasce o lucro. Assim, os serviços que o estado oferece aos empobrecidos durante os tempos gordos, vão desaparecendo. É assim com a saúde, com a educação, a moradia, a segurança. Hoje estamos vivendo um tempo assim. Por conta de mais uma crise do sistema capitalista,que já não tem mais para onde se expandir, os lucros diminuem e aí, para que os ricos permaneçam ricos é necessário cortar na carne dos trabalhadores. Por isso vem a reforma da previdência, que estende o tempo de contribuição e praticamente impede os trabalhadores de se aposentar. E também por isso vem a reforma trabalhista que é para tirar dos trabalhadores direitos já conquistados. O estado assim vai retirando benefícios dos empobrecidos para garantir a boa vida dos que já são ricos. Basta olhar os noticiários para ver a verdade. As declarações dos donos da Odebrecht são muito claras. São as grandes empresas as que dirigem de verdade os destinos de um país. O estado – e seus governantes – apenas gerenciam os interesses dos empresários. Então, deputados, vereadores, governadores e até presidentes são subornados, comprados, muito bem pagos para garantirem que nada toque no lucro das empresas. É por isso que Marx falou da necessidade do fim do estado. E isso só pode acontecer depois que os trabalhadores assumirem o controle dele a partir de uma revolução. Aí quem vai mandar são os trabalhadores. Nesse primeiro momento depois da luta será necessário ainda manter o estado, mas controlado pelos trabalhadores. É socialismo. Porque nessa fase é preciso alfabetizar as gentes sobre como viver num outro modo de produção. Depois que todos já souberam como é, passa-se ao comunismo, que é momento em que acabam as classes, e aí já não precisaremos de um estado, assim como hoje. Os trabalhadores encontrarão uma maneira de coordenar a vida, sem que precise haver um estado opressor. Essa é a utopia pela qual caminhamos. Mas, hoje, dentro do estado capitalista, é preciso que os trabalhadores estejam unidos e possam apertar e enfrentar o estado – que é dos ricos - para que sejam garantidos os direitos mínimos, como hospitais de qualidade, postos de saúde, remédios, moradia, segurança, direitos trabalhistas.
Já os direitos máximos, que é a garantia de uma vida digna para todos, só virão com a revolução e é por aí que temos de avançar.