Quando eu saí de casa e fui para a vida, foi duro deixar a
mãe. Ela sempre foi o pilar da casa, sustentando tudo. Leoa, guerreira, pura
fortaleza. Nos tempos de aflição, ela nos acolhia sob os braços e dizia: tudo
vai ficar bem. A gente acreditava. E as tormentas passavam. Era como se fosse
por conta da sua magia. Nunca foi de discursos. Era de práticas. E seus
exemplos ficaram encravados em nós. O cuidado com os filhos, com a casa, com a
vida mesma. A certeza de que era preciso enfrentar todos os terrores com
galhardia, apesar do medo. Não esqueço seu olhar no dia em que fui embora para
bem longe, desmamada, desgarrada. Havia tristeza, mas havia orgulho. Seu
passarinho voava e isso era bom.
Nos caminhos da vida, sempre que a dor vinha forte demais,
bastava apenas ligar para casa. Não precisava contar nada do que estava
passando, nem esperar conselhos. Só a sua voz, atendendo ao telefone, dizendo:
"filha", de um jeito só seu, e tudo clareava, o arco-íris abria suas
cores. Falávamos de bordados, de tricô, de ponto cruz. Falávamos das lutas, das
coisas do país. Então, tudo voltava a ficar bem.
Hoje ela não está. Encantou há tempos. Então, nesses dias em
que todos os apelos comerciais insistem na compra de presentes, eu coloco um disco
da Ângela Maria, do Miguel Aceves Mejía, do Carlos Galhardo, e canto. Já
ensinou meu amigo Jesus: “não se procura entre os mortos aquele que vive”. Faço
panquecas ou pastel, cevo um bom chimarrão e a imagino nadando no Rio Ibicuí,
como quando era bem jovenzinha. Minha “madrecita” está livre, na corredeira. Vez
ou outra posso vê-la, com o riso tímido, sentada sobre a perna num gesto só
seu, tecendo suas mantas. E, quando não, sinto seus dedos tocando meus cabelos,
e aquela voz cheia de ternura a dizer: filha...
Misturada na grande energia cósmica, minha Helena passeia
pelo jardim da vida. Assim, nesse dia de mãe, celebro essa vida, que me deu a
alegria de estar aqui...