sábado, 19 de agosto de 2017

Casa da América Latina






Fotos: Rubens Lopes

Minha casa, nossa casa: Abya Yala

Florianópolis inaugurou nesse dia 18 de agosto a Casa da América Latina, uma proposta que floresceu a partir da professora da UDESC, Carmem Suzana, e que foi abrindo raízes junto a outras companheiras e companheiros, também latino-americanistas. Essa vontade viva de ter um espaço onde os irmãos e irmãs de Abya Yala pudessem se encontrar e onde pudesse pulsar essa alma mestiça de negro/índio/espanhol/português que nos faz povo.

Pois nessa noite foi assim. Amigos, música da pátria grande, Artigas, lembranças, emoções, alegrias. Tudo junto e misturado nessa paixão que move a vida desde que Bolívar entendeu que sozinhos somos fracos, juntos somos gigantes e saiu por aí a semear. Simón não viu acontecer, Artigas também não. Mas nós a faremos, pátria/mátria nossa.

A inauguração teve sons da américa, batida de tambor, chorinho, poesia, imagens. Teve comida compartilhada, teve criança, velho, moço. Teve argentino, uruguaio, chileno, cubano, brasileiro, caboclo, branco, negro, índio, tudo o que somos. Teve abraço, teve riso, teve até lágrimas. Essas que brotam da pura emoção da vida compartilhada. E teve a presença segura da sempre amada Gina Couto.

Nessas imagens de Rubens Lopes, um pouco da alegria que nos invadiu. A alegria que vem da certeza de somos companheiros e estamos juntos, mesmo que a vida esteja gris, que haja golpe. Porque somos Abya Yala, somos povo latino-americano, somos um só vibrando nesse imenso continente. Caminhamos... Estamos juntos...

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Governo Temer agora ataca os trabalhadores públicos



Depois da destruição dos direitos dos trabalhadores privados, o governo já está anunciando medidas de ajuste para os servidores públicos. Pelo visto não sobrará pedra sobre pedra. E nesse tabuleiro, o aspecto da classe é o que mais se destaca. Para os ricos, chovem benesses. Para os trabalhadores, arrojo. Havia tempo que o sistema capitalista não mostrava sua cara feia tão destemidamente. A maquiagem da concessão de um direito aqui, outro ali não está mais sendo usada. Tudo é feito às claras e só não vê quem não quer. Como num explícito campo de batalha, os grupos em guerra estão bem definidos, e quem avança, sem piedade, é o “exército da noite”, o capital. Já é tempo de os trabalhadores encontrarem um caminho de ataque.

O governo de Michel Temer, que foi escolhido para realizar os ajustes necessários ao capital, vem cumprindo à risca todo o receituário. Para garantir apoio da elite dominante abre os cofres: perdão de dívida dos banqueiros em bilhões de reais, perdão da dívida dos latifundiários, em bilhões de reais, e o enchimento sistemático dos alforjes de deputados e senadores, para que mantenham o congresso alinhado e votando todos os projetos necessários. Dinheiro às pencas. E tudo isso num quadro de “profunda recessão”, como alega o governo. 

O mantra repetido pelos meios de comunicação é de que o Brasil foi quebrado pelos governos de Lula e Dilma e que agora é preciso que os brasileiros apertem o cinto para reconstruir o que o PT destruiu. Mas, se o país foi deixado quebrado, de onde está saindo todo esse dinheiro para comprar parlamentares? E por que o governo está perdoando dívidas bilionárias? Obviamente que os caraminguás que vai tirar dos trabalhadores não se comparam ao valor de benesses oferecido aos ricos. Mas, a resposta é simples. No sistema capitalista de produção, as relações sociais que garantem o domínio de 1% sobre 99% são as que permitem que esse pequeno grupo explore ao máximo a maioria, e que essa maioria sustente seu luxo e seu bem-viver. 

A contrarreforma trabalhista colocou por terra uma série de direitos que tiram vida do trabalhador. Ele precisará trabalhar com mais intensidade, por mais tempo, e terá seus ganhos reduzidos para uma linha ainda mais baixa do que a do necessário para se manter em estado de sobrevivência . Isso significa que ele viverá mais estressado, ficará doente com mais frequência e com muito menos possibilidade de viver feliz.

O governo passou pelas votações olimpicamente. Comprou o apoio dos parlamentares e ignorou a voz das ruas. Agora, quer colocar seu dedo podre na categoria dos servidores públicos, que são aqueles que sustentam todo o edifício dos serviços garantidos à maioria da população que é empobrecida.

Pois o governo Temer anunciou que não vai cumprir com os acordos salarias feitos pelo governo anterior, boa parte deles só garantidos por lutas. Ou seja, vai descumprir a lei, já que os acordos são projetos de lei aprovados. Não vai cumprir, e pronto!  Quem o obrigará? Não há justiça para os trabalhadores, já sabemos.  Com isso, ele também coloca na mesa o fato de que não haverá reajuste salarial para ninguém. Nem os acordados no passado, nem os que venham a ser necessários no presente. 

Anunciou também que vai limitar os salários dos novos trabalhadores a cinco mil reais. Para cumprir ele precisaria criar uma lei, aprovada no congresso, alterando as tabelas de mais de 150 carreiras de trabalhadores públicos. Pois bem, ele deve fazer isso, o Congresso obedece.  Mas isso só vai valer para novos concursados. Portanto é um anúncio bombástico, para enganar os trouxas, fazendo as pessoas acreditarem que ele está botando ordem na “bagunça” que é o serviço público. Vejam que o que se trata é de inventar um consenso sobre as coisas. 

Temer ainda informou que serão extintos 60 mil cargos do Executivo Federal e que não vai haver reposição deles. Ora, isso significa que se um professor se aposentar, outro não será contratado, ou um policial, ou um médico, um trabalhador administrativo, um analista. O que ele planeja? Acabar com o serviço público? Terceirizar ainda mais e tornar mais precário o que existe? Parece que esse é o plano. 

Outra proposta para os servidores é o PDV, Plano de Demissão Voluntária. Mais uma bobagem. Quem vai desistir do serviço público num período que o próprio governo afirma estar em recessão? Quem será tolo o suficiente para deixar o trabalho seguro pela incerteza do mercado? Pode até haver quem seja, mas o impacto será pequeno. Há ainda a proposta de aumentar a contribuição para a previdência de 11 para 14%. 

Tudo isso, diz o presidente de fato, Henrique Meireles, vai gerar uma economia para o Estado de 70 bilhões em 10 anos. Oi? 70 bilhões em 10 anos? Só o perdão ao Itaú foi de 23 bilhões. A dívida dos latifundiários é de quase um trilhão. A não cobrança de impostos no novo REFIS (refinanciamento de dívidas) discutido hoje no Congresso poderá fazer com que mais de 500 bilhões deixem de entrar nos cofres públicos. E a Receita Feral já divulgou que existem pelo menos 30 programas de parcelamento de impostos. Para os ricos e só para os ricos. 

Ou seja, as medidas anunciadas com estardalhaço contra os servidores públicos não têm nada a ver com economizar, visto que não impactarão em praticamente nada. Se a economia será de 70 bilhões em dez anos, significa que a economia anual será de menos de um milhão. Ora, isso é troco. Isso é resultado de uma política muito clara: o Estado dirigido por Temer e sua trupe nega/ tira recursos dos trabalhadores os, e os repassa aos ricos, para que acumulem mais e mais. Nada de novo, só o escancaramento do Estado como instrumento da classe dominante. 

Assim, o que está na pauta nessa cruzada contra os trabalhadores públicos é obvio: a destruição de tudo aquilo que é público, do que serve à maioria. E, de quebra, o governo ainda devasta a capacidade de luta de uma categoria que sempre foi guerreira. Há que destruir, via meios de comunicação, a imagem do trabalhador público. Fortalecer a ideia de que são vagabundos, relapsos, incompetentes e que emperram o progresso nacional. Apenas mais um pacote de mentiras. Quem, senão o trabalhador público é o que carrega o serviço público nas costas, sempre sem as condições necessárias?  Basta ver como vive o professor, o enfermeiro, o trabalhador da educação, o técnico agrícola, o previdenciário? 

Então, agora, virá a enxurrada de reportagens e notícias falando mal do serviço público que é para preparar a população para o consenso, semelhante ao criado pela reforma trabalhista: “as medidas no serviço público melhorarão a vida de todos”. Mais mentiras que assumem o caráter de verdade por conta do bombardeio midiático. 

Aos trabalhadores está colocado o desafio. Sair do estupor. Juntar forças e organizar a luta. Afinal, se são as relações de classe que determinam a existência do capital, é preciso desarticular, desmontar esse edifício construído pela classe dominante. 2018 está muito longe. A destruição da vida está bem aí, na porta. É tempo de reagir, coletivamente, como classe trabalhadora. É nesse movimento que podemos avançar.   


quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Lutar contra a fascistização da vida


 A miséria da política

Lembro como se fosse hoje aquela passeata, em Florianópolis, em 20 de junho de 2013. Era o auge dos protestos contra a corrupção - início da batalha contra o governo petista -  e a capital catarinense viu saírem às ruas pessoas que sempre jogaram pedra nos manifestantes tradicionais. O protesto juntou mais de 30 mil almas, coisa nunca vista. A RBS, rede catarinense filiada a Globo, transmitia ao vivo, e saudava a iniciativa. Estranhamente não chamava ninguém de “baderneiro”, nem se ouvia o estridente mantra da garantia do “ir e vir”. Naqueles dias, a classe dominante dava sua bênção para a ocupação das ruas, a Globo chamava ao civismo e as pessoas acorreram aos borbotões.  

Eu lá estava com os companheiros de sempre. E, aturdida, via as pessoas manifestarem seu ódio contra os militantes de partidos políticos e movimentos sociais. Ou seja, nós. A passeata virou uma batalha, na qual jovens vestindo camiseta – doada por partidos de direita – com inscrições contra a corrupção berravam: “sem partido, sem partido”, e enfrentavam os militantes que se agrupavam com suas bandeiras. Exigiam, de forma violenta, que fossem baixadas as bandeiras partidárias e que a passeata seguisse como uma gosma informe. Uma falsa gosma, pois como disse, os partidos de direita estavam ali, distribuindo camisetas e insuflando a massa contra os partidários da esquerda. Apenas não carregavam bandeiras, porque nunca o fizeram. Eles agem nas sombras.

Aproximei-me de umas jovens “encamisetadas”, que gritavam alucinadas, com olhos em brasa, contra as bandeiras de partidos de esquerda. E perguntei:

- Por que vocês são contra os partidos?

- Hã? É porque é sem partido, ora!

- Sim, mas por quê?

- É sem partido e pronto. Não fazemos política. Tu tem partido? – inquiriram e me encararam, agressivamente.

Naquele dia, uma massa furiosa nos atacou e obrigou que os grupos embandeirados se descolassem da passeata, seguindo na frente. Escancarava-se a luta de classes e o ovo do fascismo que tomou conta do país estava posto.

Lembro que comentei com vários companheiros sobre o que estava começando ali. No dizer de Adorno, o fascismo é um vírus que existe latente, em cada um. Diz ele que dadas as condições, ele brota, forte, e se espalha incontrolavelmente. Eu via aquilo na passeata. Um ódio irracional na massa, mas extremamente racionalizado nas direções políticas da direita. Um processo de construção de um consenso que foi crescendo, se consolidando e acabou no impedimento da presidenta Dilma. Jogada de mestre.

As atitudes fascistas também se consolidaram e estão a todo vapor. Uma delas é a proposta da “Escola sem Partido”, exatamente igual ao esquema das passeatas de junho. Sem partido de esquerda, porque os de direita poderão agir. Não querem que se fale de Marx, mas poderão incensar Hayeck. Então, como assim, sem partido? Mas, a massa desinformada não captura essa sutileza. Para ela, o mal é o socialismo, o comunismo, o velho discurso de volta outra vez.

Voltaremos a viver os terrores do fascismo cotidiano, com os nossos vizinhos denunciando-nos como comunistas, ou então colegas de trabalho, resolvendo questões pessoais com denúncias anônimas sobre nossas atividades de “doutrinação”. E a justiça, que é da classe dominante, agirá, confiscando nossos computadores e acusando de “comunistas”, como se sonhar e lutar por um mundo melhor fosse crime.

Pois essas são coisas que já estão acontecendo em todo o território nacional. Aqui em Santa Catarina vivemos o drama da professora Marlene de Fáveri, acusada por uma aluna de fazer proselitismo de gênero, seja lá o que isso seja.

E ontem na cidade de Abelardo Luz, no oeste do estado, dois trabalhadores do Instituto Federal de Educação, Ricardo Velho e Maicon Fontanive, foram denunciados, sabe-se lá se por um colega ou quem, de serem agentes do Movimento Sem-Terra dentro da escola. Seus computadores e celulares foram apreendidos pela polícia federal, com o beneplácito da justiça local, é claro. Eles foram afastados de suas funções públicas e foi quebrado o sigilo de correspondência eletrônica feita com a reitora Sônia Regina de Souza Fernandes. Ora, o MST é uma organização clandestina, por acaso? Não foi justamente esse movimento social de massa o grande responsável para que fosse criada a escola federal naquela cidade? Não foi a luta dos trabalhadores sem-terra que permitiu que centenas de jovens pudessem ter acesso ao ensino técnico de qualidade na região? Que crime pode haver, então, as ligações que por ventura alguns trabalhadores da escola tenham com o movimento? Pois, então, o que é isso? O acirramento da luta de classes.

Eu vivi a ditadura militar, como criança e adolescente, e lembro muito bem o terror que viviam as famílias que tinham qualquer posição crítica ao regime. Os vizinhos vigiavam e acusavam anonimamente, muitas vezes se aproveitando da denúncia de “comunista” para vinganças pessoais. Era um tempo de vigilância e de medo. Não se podia pensar. Só dizer sim, sim, sim, ao regime. Nas escolas, tínhamos educação moral e cívica, com a doutrina do terror. Isso podia, já falar de algum autor crítico, jamais. Era doutrinação. E é disso que se trata a Escola sem Partido.  

Mas, no covil dos fascistas, são os comunistas, os críticos, os diferentes, e qualquer outro inimigo, mesmo pessoal, os que devem ser perseguidos. Nós já passamos por isso. E não foi bom. Nem para as pessoas, nem para o país. Apenas o pequeno grupo que comanda é que se dá bem, enquanto a vida da maioria fica gris. Há que botar freio a essa fascistização da vida. Ou ela se espalhará como rastilho de pólvora, no fundamentalismo do terror. É hora de juntar forças, mulheres, negros, índios, trans, trabalhadores formais, informais, homossexuais, enfim, todos os oprimidos pelo capital e pelo patriarcado. Essa luta é de todos nós.


segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Quem é o inimigo?




Mulher e soldados têm algo em comum: são trabalhadores, da mesma classe. 

O sistema capitalista de produção é uma máquina de ódio e sobre esse sentimento se sustenta. Sua principal arma – que mantém a maioria das gentes sob seu comando – é a invenção de que o inimigo de cada um é outro. A pobreza, a miséria, a dor, a desgraça, a fragmentação, a doença, nada disso tem a ver com a forma como a sociedade se organiza. Tudo é culpa do outro. O outro passa a ser aquele a quem cada um e cada uma tem de eliminar.

Mas, prestem bem atenção. O outro que tem de ser eliminado não é qualquer outro. É o outro da mesma classe, a classe empobrecida. E essa é a que tem de se digladiar diariamente, para disputar um espaço na sociedade do “mundo livre”. Está consolidada a ideia de que o rico, o “bem nascido”, o criado a toddy é um abençoado por deus e a que ele se deve toda a reverência. A ele nenhuma culpa é imputada, nasceu marcado pela bênção. Se matar alguém dirigindo bêbado, pobrezinho, teve uma má noite. Se estuprar uma menina, coitado, não foi por mal. Se agredir uma mulher, estava exaltado. Se juntar os amigos para matar negros e gays, é porque essa gente não deve prestar mesmo. Essa é a ideia que permanentemente é inoculada nas gentes.

É claro que muitos conseguem escapar dessa lavagem cerebral, mas uma boa parte das pessoas é envolvida por essa ideologia. Então, o que acabamos vendo, perplexos, é pessoas da mesma classe, que sofrem os mesmos dramas, se agredirem em si, disputarem, competirem e até se matarem. Esse é o bom trabalho da ideologia. Tornar real o que não é. Mostrar como verdade o que é mentira. Iludir, enganar, obscurecer. E àqueles que são tomados por essa ideia de que o outro, pobre, negro, gay, comunista, macumbeiro, é o inimigo muito dificilmente conseguimos tocar com o discurso.

É por isso que não adianta muito insistir no facebook para que os paneleiros apareçam quando o Dória joga água nos mendigos em noites de inverno. Os que bateram panela contra o PT, a Dilma ou contra os comunistas, definitivamente acham que está certo “limpar” a cidade dos mendigos, porque a ideologia diz pra eles que os mendigos são ladrões e eles têm medo dos ladrões. Todos temos. Então, como o outro, sujo e desempregado, é o inimigo, que o estado o elimine.

Igualmente é inútil chamar os paneleiros para bater panela contra o Aécio, o Caiado, o Temer, ou o Gilmar Mendes. Eles fazem parte desse grupo de bem nascidos, sobre os quais não recai culpa. Imaginem se o neto do Tancredo vai ser um traficante? Isso só é possível aos pobres e pretos da favela. Rico não comete crime. Rico é abençoado.

Para os que estão sob o comando da ideologia só os pobres podem ser ruins, perversos, criminosos, violentos, inúteis. Vejam a Argentina, onde milhares se levantaram na última semana para exigir a aparição com vida de um artesão que foi levado pela polícia e sumiu. Pois se milhares pedem pela vida do jovem, outros milhares de seres silenciosos estão em casa, concordando com a ação da polícia. Afinal, pensam, o que um hippie, um artesão, representa para a sociedade? Nada. Eles não produzem para o sistema. Devem ser eliminados. E secretamente, essas pessoas assentem a cabeça diante do crime.  

Da mesma forma é possível sentir essa silenciosa aprovação quando os jagunços matam índios no Brasil, ou quando fazendeiros matam ambientalistas e sem-terra. O Datena grita na TV que eles são bandidos, vagabundos, marginais. E as pessoas assentem, crédulas, dando graças aos céus por haver jagunços e fazendeiros tão legais que limpam o mundo dessa ratatuia.

Como entender a simpatia que uma mulher da classe alta venezuelana, como a Lilian Tintori, desperta nas brasileiras. Ela é loira, jovem, rica. Seu marido, Leopoldo Lopez, é o responsável pela morte de mais de 40 pessoas nas guarimbas de 2014, e agora, durante as guarimbas de 2017, incentivou outras tantas. Então porque os brasileiros e brasileiras se doem tanto pelo fato de ele estar preso? Por que não fazem campanha pelos tantos negros e negras que hoje mofam nos cárceres, alguns até sem julgamento? Ou pelos que estão presos porque roubaram um pote de manteiga? Que mistério é esse que leva a tanta simpatia pela riquinha branca? É essa ideologia que promove a divisão entre os empobrecidos, para que permaneçam sempre atados ao poste da escravidão. Matem-se entre si, mas amem seus algozes.

É claro que essa silenciosa massa que odeia seus iguais não é uma gente do mal. Estão aí, pelos séculos e séculos sendo inoculadas nesse ódio aos seus. E não é coisa fácil escapar. Ainda que os empobrecidos sejam 99% da população mundial, não conseguem compreender o seu poder. E o poderoso 1% que domina o mundo tem os meios e as condições para sistematicamente fortalecer essa ideologia de que é o pobre que é ruim. Só ele pode ser capaz de maldades e violência e contra ele há que estar toda a força.

É por isso que gritar pelos paneleiros no facebook não ajuda em nada a mudar esse quadro. A saída é a lenta e esgotante batalha de construção da consciência de classe. Só que isso não acontece com discursos vazios ou cheios. A consciência de classe só desperta quando estamos jogados na luta coletiva. Quando caminhamos em comunhão na direção de um objetivo que transforme nossas vidas. 

E essa construção é algo que precisa de intenso trabalho na vida real, no chão do mundo, no encontro cara-a-cara com esse outro que nos vê como inimigo. Temos de retomar, com urgência, o contato com a vida. As novas tecnologias são boas, são legais, e podem até ser revolucionárias, mas elas sozinhas não mudam a vida. Assim como uma faca não pode sair matando sozinha, a internet também não tem esse poder. São as pessoas por trás da técnica que movem a roda da história.


Temos de voltar ao encontro, ao olho no olho, ao aperto de mão. Com o celular no bolso, porque não, mas tecendo a trama da vida na relação real. Os tempos estão sombrios e estamos perdendo. É hora de parar de resistir e atacar. Mas, para isso, temos de quebrar essa ideologia de que o inimigo são os nossos iguais. Dura batalha, dura batalha... Mas, temos de seguir.