Trocar o pai de manhã é uma longa novela. Há todo um ritual para ele levantar da cama e depois para a limpeza corporal. Tudo feito com muita calma e muito conversê. É uma maneira de distraí-lo e ir fazendo o que precisa ser feito. Tirar a roupa da noite, dar o banho de gato ou de água, conforme o estado de humor, trocar as meias, passar o óleo de girassol pelo corpo todo para hidratar a pele, fazer o curativo da feridinha que apareceu nas costas, tirar a fralda.
Feito isso, começa a parte de colocar a roupa do dia. Outro processo. Colocar a camiseta, a blusa de lã, a fralda limpa, a calça, as meias, o tênis. Tudo isso eu faço sempre avisando cada passo que vou dar. Agora vamos colocar a camisa. Agora vamos colocar a blusa, agora isso, agora aquilo... Nesse meio tempo, ele vai conversando e dizendo coisas na sua língua de cigano.
Dia desses, lá estávamos nós, eu e a Clau, ajudando ele a se levantar e trocando a roupa. E ele falando, falando, falando. Começou a dizer foice, foice.
E eu:
- Foice, que foice? A única foice que eu conheço é a foice e o martelo do comunismo.
E ele assentindo com a cabeça.
- Por que estás falando isso? Por acaso tu és comunista?
E ele, muito rápido e firmemente:
- Euuuu sou!
Pois é, a fruta não cai longe do pé.