A Venezuela não é um país socialista, embora Chávez tivesse sonhado com um caminho até esse modo de organizar a vida. Não teve tempo. Mas, por outro lado, não se pode negar que a Venezuela é um país que tem um sistema democrático bastante original e avançado. Para começo de conversa, esse país da ponta norte da América do Sul conseguiu desenvolver um sistema de governo bem diferente dos demais países de corte liberal. Lá, não existem apenas os tradicionais três poderes: executivo, legislativo e judiciário. São cinco os poderes que definem a vida do país, acrescentando-se o judiciário e o popular, sendo que o último é o mais importante. Ou seja, o elemento central de governo é a democracia popular. Na Venezuela manda o povo. Até o presidente pode ser retirado do poder por um referendo popular. Leis definidas pelo legislativo também podem ser revogadas se assim a população entender. É a democracia aprofundada. Nada pode ser menos parecido a um ditadura, como querem fazer crer alguns mandatários dos países centrais alinhados à política dos Estados Unidos. Numa ditadura, o povo não tem vez. E não é assim na Venezuela.
No mês de janeiro, a oposição ao governo de Nicolás Maduro - que faz o quer no país, sem que ninguém a constranja - chamou alguns ex-presidentes para discutir o tema democracia. Andrés Pastrana, da Colômbia, Sebastián Pinera, do Chile e Felipe Calderón, do México, todos eles governos títeres, quando no poder. Aliados dos EUA, escravos sem opinião. E, além disso, nenhum deles podendo servir de modelo para a democracia, nem mesmo a liberal-burguesa. Logo, o tal encontro para discorrer sobre democracia nada mais era do que uma farsa. O motivo central era desgastar o governo de Maduro, que passava por um período de crise, com um criminoso boicote de produtos, que esvaziou os mercados e obrigou as pessoas a viverem momentos de profunda tensão. Ações como essa, da oposição venezuelana, são bem conhecidas, e visam criar focos de violência para desestabilizar governos, abrindo passo para golpes ou intervenções econômicas.
Os três ex-presidentes foram visitar o que ele chamaram de "preso político", mas que a população chama de criminoso, por incitar jovens a atos de violência visando derrubar o governo. Pois eles não conseguiram entrar na penitenciária e alardearam pelo mundo inteiro que foram "impedidos" de ver o preso. Outra bobagem midiática. Não entraram porque não marcaram nem avisaram da visita. Mas, isso não evitou que disparassem suas diatribes contra Maduro, chamando-o de ditador, autoritário e ameaça ao mundo livre.
O presidente dos Estados Unidos, possivelmente o mandante de todo o imbróglio, decidiu dar uma de herói mundial - defensor da democracia - e baixou um decreto considerando o pequeno país do norte da América do Sul, uma ameaça para os EUA. Outra bobagem homérica. Que ameaça pode representar um país como a Venezuela a um império militar e nuclear como os Estados Unidos? Nenhuma.
Mas, os meios de comunicação que dominam o mundo decidiram dar visibilidade a essa estupidez e a Venezuela voltou às manchetes como um lugar obscuro, onde a ditadura vige. Repito: a Venezuela não é uma ditadura, é um país democrático que serve de modelo de estudo a estudiosos de todo mundo pela sua original organização de cinco poderes. Uma democracia mais profunda que a tradicional. É uma novidade boa, mas disso nenhuma televisão fala.
Agora, não bastando toda a campanha desenvolvida pelo presidente Obama contra a Venezuela, outras lideranças políticas começam a engrossar o coro de apoio ao presidente estadunidense, visando dar cores de verdade a mais uma das mentiras inventadas pelo serviço secreto (nem mais tão secreto) dos Estados Unidos.
O tema é a prisão de Leopoldo López, o que incitou os jovens à violência, e a de Antonio Ledezma, outro político que conspirou pela queda do governo no episódios da guerra econômica, em janeiro. Os dois estão sendo pintados como os paladinos da democracia e recebem apoio de figuras como FHC, do Brasil e Felipe Gonzáles, da Espanha. Fernando Henrique, que foi o responsável pela entrega das estatais mais rentáveis do Brasil à empresas estrangeiras, diz que "já basta de abusos" na Venezuela. Mas ora vejam só. Seria de rir, se não fosse trágico.
E Felipe González já foi até expulso de Miraflores por Chávez quando tentou negociar a venda da CanTV a uma empresa telefônica espanhola que ele representava em 2006. A CanTV foi estatizada por Chávez, que ousou definir a comunicação como espaço estratégico na Venezuela.
Pois essa gente do tipo de FHC, González, Piñera e outros que posam de vestais da democracia jamais tiveram coragem, quando nos seus governos, de aprofundar o processo democrático como fez Chávez. Jamais teriam topado uma reforma constitucional que desse ao povo poder maior. Tudo o que fazer é servir aos interesses das empresas transnacionais e dos governos centrais, dos quais são meros marionetes. Quem pensam ser esses senhores para abrirem a boca sobre a vida da Venezuela? Querem, por acaso, repetir a arrogância de outro refinado títere, o rei Juan Carlos, que ousou dizer à Chávez que se calasse. Ele, um monarca conduzido ao trono por um ditador?
Que se calem esses senhores sobre a Venezuela. Mal ou bem as gentes estão conduzindo seus destinos. Ao longo da quinta república estão realizando eleições, referendos, assembleias democráticas, e refinando sua democracia. Esse é o verdadeiro perigo que Obama não diz ao seu povo e ao mundo. O perigo da democracia mais profunda, popular. Essa é a ameaça que causa insônia ao monarca do "mundo livre" . Porque o "mundo livre" é uma pequena comunidade de ricos empresários, que controla os governantes a base de muito dinheiro, usando as populações a seu bel prazer, produzindo guerras, miséria, violência e medo.
A democracia direta, a democracia que se aprofunda e se aprimora é objeto de terror para esse "mundo livre", porque ela desloca o poder dos pequenos grupos legislativos e executivos, que são fáceis de corromper. Ela coloca o poder na mãos das gentes, muito mais numerosas para serem corrompidas. Esse é o medo, essa é a ameaça.
O doloroso nisso tudo é pensar que a maioria das gentes, a que realmente tem o poder de mudar as coisas, segue dominada pelo brilho ilusório da televisão ou pelas mentiras das redes sociais. Não querem ver a verdade, ou não podem, por várias razões. Essa maioria, que um dia haverá de ver... E, aí sim, provocar a grande transformação.
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