Foto: Miriam Santini de Abreu, no Quilombo São Roque
O racismo é uma coisa brutal. Alguém é considerado inferior
apenas por conta da intensidade de sua melanina. O racismo não é algo natural.
É coisa construída, em nome da necessidade de poder. Na Europa, o racismo se consolida com as
grande invasões do 400, quando portugueses e espanhóis singram os mares em
campanhas de conquista, depois seguidos por outros povos da região. Assim, eles
invadem a China, o Japão, a Índia, Abya
Yala, a África inteira... Discriminam os amarelos, os azuis, os vermelhos, os
negros. Chamam de seres inferiores, simplesmente porque não são como eles. Com
isso, justificam a dominação, a escravidão, o extermínio. Visão grega de mundo,
na qual só o igual é ser. Os demais são não-seres. Portanto, passíveis de
destruição. Toda a cultura e história milenar desses povos dominados são
ignoradas.
O tempo passa, o colonialismo daquele então se acaba, mas as
marcas e a herança maldita seguem vivas. Hoje, na Europa, depois de terem
destruído a vida de milhões e milhões de pessoas, com a invasão e o massacre,
as gentes ainda são capazes de discriminar africanos, asiáticos, árabes e
latinos, apenas porque eles são quem são. Nada mais. Essa gente sequer se dá
conta de que seus países são responsáveis por toda a pobreza e miséria na qual vivem esses povos, na periferia do sistema capitalista. Ainda assim,
rechaçam, matam, humilha, violentam, massacram. No Brasil não é diferente. O
ódio contra índios e negros, que teve sua origem na invasão portuguesa, segue
com a mesma força. E isso se vê todos os dias, em pequenos gestos, comentários
racistas, atitudes discriminatórias.
Agora, vejo um
campanha iniciada pelo jogado Neymar, que alude ao gesto de um outro jogador
brasileiro - vítima de racismo - que resolveu agir sem alarde diante de uma
banana jogada a seus pés, comendo-a, como a dizer: fodam-se, racistas! O ato do
jogador, nem discuto. Como branca, é incognoscível para mim saber o que pode
ter sentido esse rapaz, assim como tantos outros negros submetidos a momentos
de humilhação, sistemáticos, constantes, dia após dia. Talvez tenha sido um
esgotamento, um ódio surdo. Não sei.
O que me causa espécie é a atitude de tantos outros
brasileiros, na tentativa de se solidarizar com o atleta que hoje vive na
Espanha, possivelmente por estar submetido - sem chances de escapar - a essa
forma de escravidão moderna que é o futebol. Não creio que a melhor saída seja
se fotografar com bananas, aludindo que "somos todos macacos". Não o
somos. Nem nós, os brancos, nem eles, os negros. Somos de uma triste espécie,
frágil e fraca, chamada humana. Uma espécie que só conseguiu sobreviver até
agora porque há uma parte de seus indivíduos que coopera e se solidariza no
processo de construção da vida. Uma parte que consegue manter o equilíbrio
apesar de outra parte insistir na destruição e no egoismo.
Fico aqui, agora, depois de ler, entristecida, uma matéria
sobre um povo negro, do Quilombo São Roque, que teve de jogar fora centenas de
quilos de semente, porque está proibidos de plantar em sua própria terra
ancestral. Condenados á miséria, ao abandono. Não são macacos, são humanos. Vejo
também, no facebook, os cartazes distribuídos em algum lugar desse nosso triste
Brasil que dizem que os índios são "atrapalhos" ao progresso,
incitando assim o ódio e a violência contra os parentes de todas as etnias. E
os índios tampouco são macacos. São humanos.
Então me dá um cansaço, um esgotamento, um ódio. E me deixo
ficar na impotência. Não há o que dizer para quem não quer escutar. A
solidariedade ao povo negro, aos índios, aos que nos aparecem como diferente não
precisa de fotos no facebook. Precisa de ações concretas, na vida cotidiana.
Nietzsche, ao criticar o mundo moderno, dizia que somos
humanos, demasiado humanos... Mas não sei, se um dia chegaremos, como raça, a
cumprir esse designo!
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