Nas grandes cidades chinesas o
trânsito é coisa de doido. Logo na chegada, a impressão que se tem é de que ninguém
respeita o pedestre. Quase não há sinaleiras e o movimento é ininterrupto. Mas,
depois, acostumando-se com o ritmo da cidade, o que se percebe é que é
justamente o contrário. O pedestre é que é soberano. Capturei isso olhando,
desde o décimo andar, para uma enorme rótula numa das entradas da muralha de Xian.
Parecia impossível que as pessoas pudessem atravessar a rua naquela sequência
alucinante de carros, sem que houvesse passarelas ou sinais. Só que tudo se move
como num bem ensaiado balé. Os carros andam em velocidade baixa, as bicicletas
atravessam em paz e as pessoas vão cruzando a rua, por entre os veículos. Ninguém
xinga e todos seguem seus caminhos, num
ritmo nada acelerado.
Aparentemente pode parecer
caótico, mas tem uma ordem ali. Mesmo no meio da madrugada, os carros que
cruzam a rótula seguem em baixa velocidade. Vão lentos, mesmo que não haja
ninguém na rua. Nas cidades como Beijin e Shangai, com mais de 25 milhões de
habitantes, esse ritual é muito parecido. As ruas largas até tem algumas faixas
de pedestres, mas ainda assim as pessoas vão atravessando em qualquer parte da
rua, devagar e ritmadas, como numa dança com os carros. Da mesma forma as
bicicletas e os estranhos taxi-bicicletas que se veem por toda a parte.
Navegando pela internet vi muitos
comentários de pessoas que viajaram para a capital chinesa, falando mal do
trânsito. Pareceu-me que essas criaturas não conseguiram compreender a profunda
sintonia que existe nas ruas. Um pouco aquela coisa de olhar um mundo tão
distinto como o chinês, a partir da perspectiva ocidental. Eu circulei pelas
imensas ruas de Beijin no mesmo diapasão: compartilhando o espaço com os carros,
atravessando lentamente as ruas, desviando dos possantes e das bicicletas. Em
nenhum momento senti medo de ser atropelada, coisa que sinto comumente no meu
país, mesmo estando em cima da faixa. Penso que existe lá, naquela cultura
milenar, um respeito profundo pelo humano que, apesar de todo o crescimento
econômico, tão visível nos grandes centros, ainda não se perdeu.
Definitivamente, as ruas das
grandes cidades chinesas são adoráveis espaços humanos.
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