Cuidar de uma pessoa velha requer um longo aprendizado,
feito de tentativa e erro. Quando trouxe o pai para viver comigo, sabia que
seria um caminho desconhecido, mas não hesitei. Haveria de dar a ele um tempo
bom, nessa hora em que a pessoa deixa de ser útil. Sim, porque o velho é um
inútil do ponto de vista do sistema. Ele não produz mais valor. Não trabalha.
Só vive. Vive e frui. O tempo lhe pertence, não há compromissos nem ansiedades
com o cotidiano. Muito da memória vai embora, e me parece até bom. Porque a
pessoa pode sofrer um bocado com as lembranças.
Nesse emaranhado de coisas, o cotidiano do cuidado não é coisa fácil. Mas, a gente vai
aprendendo.
Acostumado a um regime alimentar bem simples, foi dureza
fazer o pai comer coisas como frutas, legumes ou peixe. Tudo que oferecia ele
recusava.
- Quer um pedaço de mamão, pai? Tá muito bom.
- Eu detesto mamão. Não quero.
- Vamos comer um peixe hoje no almoço, que tal?
- Detesto peixe. Não
vou comer.
E eu me descabelando, sem saber o que fazer para ele comer
coisas como brócolis, couve, manga e
outros quetais. A ordem médica era comer bem, tentar ingerir as vitaminas necessárias
com a comida, para evitar as bagas.
Foi aí que me deu o estalo. Lembrei das historinhas do Rubem
Alves. O negócio é não dizer o que é.
Desde então, preparo uma tigela com mamão cortadinho, ou melão, ou manga, cubro com
melado, e boto na sua mão.
- Ó, come aí que tem vitamina.
Ele me olha, sereno, pega a tigela e vai comendo. E se o o cardápio do dia for peixe, eu simplesmente ponho no prato, como quem não quer nada e ele
vai comendo, bem campante. Já as folhas verdes, não tem jeito. Se colocar no
feijão, ele vai caçando as bichinhas, uma a uma, acumulando no lado do prato.
- Isso é ruim.
O jeito então é fazer “tortillas”, misturado as folhas com
batata e ovo. Aí dá certo. Ou então, bater no liquidificador e misturar no
feijão, invisíveis.
- Quer café, pai?
- Deus me livre.
Espero um pouquinho, faço o café e levo pra ele, postado em
frente à TV, vendo novela mexicana. Ele pega a xícara e vai tomando, comendo um
bolinho de cenoura, sem chiar.
A parada é dura, mas é também engraçada. O marrentinho é
figura!
Nenhum comentário:
Postar um comentário