A manhã desperta bonita em Florianópolis. Sol amarelo numa cidade que desde o final de agosto só vê chuva. O prenúncio é bom, luz, vida, alegria. Mas, as coisas não são tão simples assim. Não basta que o sol nasça para que haja o bom viver. No dia anterior, emburrado e chuvoso (20.09), o estado inteiro de Santa Catarina sofreu uma perda brutal. A companhia de Água e Saneamento (Casan) foi privatizada. Segundo os deputados cúmplices do crime, o governo seguirá com o controle acionário e garantirá o interesse público. Mas, quem em sã consciência acredita nisso? Qualquer guri de dez anos, com um pouco de cérebro sabe que a casa legislativa catarinense, com alguma exceção, está ali para defender os interesses dos empresários, do capital. E isso é em todo o país. Essa é a regra na democracia liberal, representativa.
Na manhã em que os trabalhadores, sindicalistas e pessoas do povo foram para a Assembléia Legislativa gritar o seu “não” à proposta privatista, a casa que supostamente deveria ser do povo chamou a tropa de choque, como é comum em todas as vezes que o poder se sente ameaçado. A tropa é patrimônio do estado, o estado é opressor e quem quer lutar contra isso sabe que o lombo será chicoteado, porque assim tem sido desde muito tempo. É da natureza do capitalismo defender seus interesses com a força policial do estado. Tudo está ligado.
A água é um bem público e, em tese, não deveria ser uma mercadoria. Qualquer pessoa, em qualquer lugar precisa ter acesso a ela, pois sem água, o ser humano não consegue sobreviver mais de três dias.
Pois agora, em Santa Catarina, a empresa que garante a água está 47% privada. O restante é do estado, mas o estado é amigo do privado e, juntos, eles decidem que o precioso líquido valerá “x”. Que será dos pequenos municípios? Dos lugarejos perdidos no interior? Que será das pessoas e dos lugares que não representarem lucro em potencial? Quem acredita que um empresário que compra uma empresa para auferir lucros estará interessado na situação de um pobre coitado sem acesso à água ou saneamento?
No mesmo dia, esse fatídico 20 de setembro, a Câmara Federal privatizou os hospitais públicos. Dizem os cínicos que é uma empresa estatal. E de fato é. No papel. Na prática, a empresa que vai administrar os hospitais universitários em todo o país, poderá fazer “parcerias” com os planos privados, abrindo duas portas de entrada nos hospitais. A porta dos pobres, dos deserdados, e a dos que podem pagar. Então, numa emergência, ou mesmo no cotidiano da doença, quem vocês acham que será atendido? Até porque no estatuto da lei da “empresa pública” está bem claro: os hospitais deverão cumprir metas, metas de produção. Ora, o que produz um hospital? Produz doentes. Assim, numa situação em que a doença é mercadoria, quanto mais gente doente, melhor! Não é incrível? Talvez por isso tenham liberado o feijão transgênico...
Os trabalhadores das universidades que estão em greve há mais de 100 dias, em luta pelo salário digno e também contra a privatização dos hospitais, estavam lá na Câmara, lutando, dizendo não. Mas, tanto para os deputados cúmplices do capital, assim como para a mídia vendida aos mesmos donos, essa gente não existe. “São os responsáveis pelo rombo do governo, os vagabundos, os que não trabalham”. Mentiras e mais mentiras que são reproduzidas à exaustão para que a população acredite e defenda o que, na verdade, só vai beneficiar a uns poucos.
E assim terminou melancolicamente o 20 de setembro neste país incensado pela imprensa como o que mais cresce na América Latina. Esse é o legado da popular presidente Dilma e seus parceiros.
Nos anos 90, FHC privatizou grandes empresas públicas, extremamente lucrativas, que poderiam financiar com seus ativos a saúde, a educação e tantas outras coisas. Mas, em vez disso, foram entregues a preço de banana aos grandes empresários nacionais e internacionais. Naqueles dias, alguns trabalhadores gritaram e não foram ouvidos. Quem se preocuparia com empresas que produzem aço, minério, cimento? Pois agora, na era PT, o governo vai privatizando a telefonia, a luz, a água e a saúde. Não há dinheiro para bancar esses serviços, diz o governo. Mais uma mentira. No orçamento da União, o governo reserva 44,93% para pagamento de juros de uma dívida ilegítima. Transfere aos estados apenas 9,24%. Investe 2,89% em educação, 3,91% em saúde, 0,06 em cultura e 0,04 em saneamento. Então como é isso? Não tem dinheiro? Precisa privatizar água, luz, telefone e todos os direitos das gentes em nome de quê? Do pagamento da dívida, ilegal e ilegítima.
Assim, a política governamental, os deputados federais, os deputados estaduais, os vereadores, tudo isso está a serviço de um único patrão: o empresariado predador. A eles todas as benesses. Ao povo a precariedade da saúde, a falta de água, a falta de esgoto, os preços caríssimos. Para fechar o círculo da perversidade, ainda abrem linhas de crédito e financiamentos para que os pobres, que com seus salários ficam impossibilitados de consumir as promessas do capitalismo, possam se endividar mais e mais, engordando de forma mais rápida aqueles que mais lucram no mundo: os banqueiros.
É preciso abrir os olhos e ver.
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