Gosto da minha rua de areia, na qual afundo meus pés. Gosto do cheiro doce de dama da noite que se esparrama quando o dia vai embora. Encantam-me os risos de criança que se fazem ouvir a toda hora. Há sempre algum menino a brincar, jogando bola, empurrando carrinho, saltando de bicicleta. Há sempre uma guriazinha a saltitar, pulando corda, gargalhando, jogando taco. Estão sempre pela rua, em liberdade, com os pés no chão e cabelos ao vento.
Pela rua também circulam, soltos e livres, os cachorros. Vez ou outra algum deles encrespa e ataca, com os dentes arreganhados, mas uma voz de comando os aquieta. São inofensivos. No geral andam por ali sem maiores alardes. Alguns nos seguem até o mercado, como se fossem velhos companheiros. Também passeiam pela areia as galinhas, crias do Luis, e entram pelas casas sem causar qualquer turbação. Todo mundo as respeita e algumas até já têm nome. Duvido que o Luis possa matá-las um dia para comer.
Pelos muros igualmente voejam as grandes corujas, sempre alertas para o caso de algum gato pular e transformá-las em almoço ou jantar. Nos fios de luz posicionam-se os passarinhos, de vários tipos, com seus cantos inebriantes. E pela diversidade de árvores outros tantos oferecem seus trinados nestes dias quentes de verão.
Minha rua tem essa aura de rua de cidade pequena, na qual os vizinhos se conhecem, se cumprimentam com sorrisos, frases de cortesia e pedem arroz ou linha branca. Tem também muitos buracos por onde as bicicletas saltitam, malucas. E, quando chove, formam-se pequenos lagos em alguns pontos, nos quais alguns carros velhos acabam ficando. Quando a noite vem pode-se ficar admirandos os vagalumes e seu bailado, enquanto a gurizada se junta na frente de alguma casa para conversar e dar altas risadas.
A minha rua é assim, ainda não contaminada pelo ideia do progresso. Contam alguns que já vem vindo o calçamento e quando penso nisso, entristeço demais. Com o calçamento lá se vão os jogos de bola e os pés afundados na areia. Tomara que demore... tomara que demore....
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