terça-feira, 7 de outubro de 2008

O tempo dos homens lentos



Gosto de ficar parada, bem na entrada do terminal urbano, olhando as pessoas que correm. Na última sexta-feira então, estava mesmo bonito. Era fim de campanha eleitoral e as bandeiras apareciam em todo o seu esplendor. Era um mar de gente parada, segurando as bandeiras coloridas, e outro mar de gente em movimento, passando apressada, sem ver. Muitos sequer aceitam pegar um papel, ou se dignam a admirar a arte dos artesãos que buscam ganhar o pão de cada dia. Não há tempo, a vida ruge.

Penso no grande Milton Santos, geógrafo, intelectual, um ser de grande luz que dizia ser este o tempo dos homens lentos. Ele afirmava que as cidades tal qual como se conformam, transformadas em megalópolis, estão com seus dias contados. Essa vida de loucuras, de correrias, de tempo que se esvai, precisa acabar. Há que se buscar a vida boa em lugares de até cinco ou seis mil habitantes. Fazer como faziam os povos originários destas terras que quando percebiam o crescimento exagerado das aldeias, imediatamente fundavam outra, para que as gentes pudessem seguir vivendo em paz. Quanta sabedoria.

Nestas nossas cidades irracionais, os pobres moram longe de seus trabalhos, porque os aluguéis são altos demais nos bairros próximo ao centro. Comprar uma casinha então, nem pensar. Toca a se esconder na periferia, cada dia mais longe. Gastam mais tempo no transporte que os leva e traz, e ainda precisando amargar as filas do sistema desintegrado. Por isso correm. Um vivente que saia as seis do trabalho, certamente só chegará em casa lá pelas oito, na melhor das hipóteses, se conseguir fugir dos engarrafamentos monstros.

Por isso estas gentes que passam correndo lá no terminal têm os rostos tão tristes. É raro ver alguém com aquele sorriso fugidio na cara, de quem trama alguma marotagem. São rostos tensos, cansados, franzidos. Apenas a gurizada mais jovem se concede uma risada, uma gritaria. Mas os trabalhadores, estes não. Quando conseguem sentar, eles encostam seus rostos ao vidro e fecham os olhos, e gemem, e se retorcem. Sonham em ser homens e mulheres lentos, sorvendo a vida, prazenteiramente. Mas, qual, há que fazer girar a máquina do capital.

Assim, quando tarde do dia esse povo chega em casa para mais uma jornada de trabalho antes que corpo estafado desabe, nos salões, os homens e mulheres que vivem do trabalho alheio sentem as borbulhas do champanhe e riem. Ah, quando chegará o dia do levante das gentes?!...

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