O Brasil segue em vertigem. Não que fosse muito diferente antes, mas é
impossível não ver que desde o primeiro de janeiro de 2019 foi dado uma espécie
de sinal verde para a barbárie. Tudo está liberado. Matar índio, matar gay, matar
povo da umbanda e do candomblé, seguir caçado e matando jovens negros nas
favelas, matar sindicalista, matar político. Está tudo bem. O Ministro da
Justiça aparece na televisão e vaticina: está tudo sobre controle. E está
mesmo. Sob o controle da mais avassaladora sanidade do capital.
A conjuntura latino-americana já vem mostrando
sistematicamente que não há mais espaço para a democracia burguesa no mundo do
capital. Aquele arremedo de liberdade, no qual as pessoas se sentiam decidindo
alguma coisa através do voto, já não
pode mais ser tolerado. A voracidade do sistema se acirra e é preciso mão-dura
em todos os aspectos da vida. É por isso que os golpes se sucedem seja contra governos
de esquerda, como nos de direita. É preciso cerrar todas as portas ao povo. Esse
alerta foi dado ainda em 2004, com a invasão do Haiti e veio caminhando com o
golpe em Honduras, no Paraguai, no Brasil. O professor Nildo Ouriques vem
alertando desde há tempos: o que precisa ser visto e combatido não são os governos
em si, mas o sistema. Só que essa é uma
verdade difícil de assimilar. E o que se vê são movimentos e partidos tentando
humanizar o capital.
Agora, no Brasil, o governo federal escancara as portas para
a violência, tanto pessoal quanto corporativa. Tudo está validado. Desde matar
a mulher que não que não nos quer até as
comunidades que atrapalham a mineração e a pecuária. Incomodou? Elimina! Como se
fosse um inocente Big Brother . O poder aplaude todas as iniciativas que levem
a medidas de exceção. É tudo que se quer, criar o caos para que a sociedade
mesma peça pelo salvador.
Mais uma jogada nessa direção entra em cena, em pleno
carnaval, quando ministros do governo e
até o mandatário nacional chamam o povo às ruas para se manifestar pelo fechamento
do Congresso Nacional. Um lance de mestre. O Congresso, que é um consolidado
antro de pessoas que não se importam para nada com a maioria da população é, de
fato, um espaço indefensável. Lá, não há
qualquer chance para as pautas populares. Tudo é definido no andar de cima,
para o bem dos grandes grupos econômicos
nacionais e internacionais.
A queda de braço do governo federal com o Congresso é uma
briga de cachorro grande. Não diz respeito à maioria da população e não tem
nada a ver com democracia ou liberdade. É um enfrentamento intraclasse
dominante para ver quem fica com o bolo todo. O governo – que se ampara nos
pilares de parte dos militares e igrejas evangélicas – quer que o Congresso
aprove tudo o que encaminha e se há disputa de poder aí, bom, inicia-se a batalha
pela hegemonia de poder. De maneira
bastante inteligente, como já fez o presidente
de El Salvador, o executivo convoca o povo às ruas para apoiar medidas de força,
forçando a barra com as instituições. O judiciário já está dominando e mesmo que
chamar à destituição do Congresso seja inconstitucional, quem vai julgar? Ora,
esse é o jogo democrático. Ou as pessoas não sabiam disso?
E assim, com pequenos – mas barulhentos - espetáculos os
homens do poder vão tramando o tabuleiro do jogo. Pode ser que nem precise
fechar o Congresso, porque na verdade isso não importa. Assim como não importa
ter ou não um STF. O que vale é apertar a soga para ver quem desiste primeiro.
No fundo, toda essa gente quer a mesma coisa: defender o capital a qualquer
custo, ainda que para isso 99% da população tenha que se explodir em miséria,
fome, desemprego, doença. E, o mais dramático é saber que entre esses 99% tanta
gente há que seria capaz de dar a vida por essa gente, acreditando que tudo o
que querem é o seu bem.
Passado o carnaval a vida real começa de verdade no Brasil, então
vai ser a hora de inventar novos factoides, tal como espichar a histeria pelo
coronavírus ou qualquer outra desgraça, mantendo as pessoas atadas ao medo. O
medo é bom para quem governa. O medo é tudo.
Nesse ínterim vamos tentando manter a cabeça fora da merda,
esperando que partidos e movimentos coletivos, de esquerda, apontem caminhos
para além dos memes. Porque, não se iludam: não há saídas individuais. Ou vamos
juntos, ou sucumbimos.
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