domingo, 23 de março de 2025

os perrengues



A vida da gente é esse rodopio incessante de pequenos sobressaltos. Na última semana, por exemplo, num calor de mais de 30 graus, o sistema desintegrado de ônibus me deixou na mão duas vezes. Na primeira vez, calor dos infernos, carro sem ar-condicionado, cheio até a boca, veio pela Gramal sofrivelmente, fazendo um barulho estranho. “Essa porra vai parar”, eu pensei, e os usuários se olharam cada um torcendo para que o busão fosse o mais longe possível. Não deu. Umas quatro paradas depois do Hiperbom o ônibus parou. “Tem que descer, pessoal”. Putz! Tinha quase todo o Gramal pela frente e depois ainda o caminho vicinal até em casa. Toca andar porque até chegar o ônibus reserva passaria um dia inteiro. Sol na moleira lá fui eu, suando em bicas. Obviamente cheguei a casa praguejando. Maldito Topázio. 

Na segunda vez foi dentro do mesmo terminal. Cheguei da UFSC vindo por Tirio/Titri. Ninguém na fila. Glória a Deus. Poderia ir sentado já que o horário que sairia em seguida era o Eucalipto, que leva uns 40 minutos até passar no meu ponto, depois de dar a volta em três bairros. Eu ali, bem faceira, primeira da fila. Chega o ônibus, abre a porta e eu entro, aboletando no meu banco preferido perto da porta. Os minutos passam. O ônibus enchendo. Quando dá a hora, vem o motorista. Liga o carro e nada. Só aquele barulho estranho, sem fazer a ignição. O motorista Pragaja. Liga e liga e liga, e nada. “Vai ter de descer, pessoal”. Puta merda. Desce todo mundo, sem qualquer respeito à fila e na confusão eu fico lá no final. Quando vem o carro novo, entra no mundo todo e eu fico em pé. Maldito Topázio. 

Ontem, calor da peste, desço eu no meu ponto na Gramal e venho me arrastando, ao sol, pela rua de casa, que dá quase uma milha até chegar. Lá longe avisto o “Malino” que é o nome que eu dei a um cachorrinho que vive numa casa da rua. Ele vez em quando escapa e fica deitado bem no meio da rua. É uma cruz de pincher com algum vira lata, porque é grandinho, mas tem o gênio pincher. Há que ter uma técnica para passar por ele sem ser atacado. A gente não pode fazer contato visual. Se olhar pra ele, arreganha os dentes e vem pra cima. Quando o pai ainda estava vivo era um perregue quando a gente saia porque eu dizia: não olha, pai. Pois aí mesmo que ele olhou e o malininho atacou. Pensei, vou dar a volta, mas isso significaria caminhar de volta até o final da rua e depois vir pela rua paralela, que dava mais um quilômetro. Era muita mão. Arrisquei. Ergui a cabeça como o olhar o céu e avançar. Ele deitadão bem no meio da rua. Estava tudo indo bem, eu passando, ele quieto, eu passando. Quando finalmente passei por ele arrisquei um revesgueio. Carambolas! Péssima ideia. Ele arreganhou os dentes e atacou. Lá vou eu correr do malino, me defendendo com a bolsa, enquanto ele me persegue até o portão. Desgrama! Aqui não posso dizer maldito Topázio, afinal desta o prefeito não tem culpa. Entro, esbaforida. É só mais um dia normal.