segunda-feira, 6 de julho de 2020

A administração da UFSC e os trabalhadores

Promessas feitas por Cancellier foram esquecidas pela atual gestão

Quando Luiz Carlos Cancellier  venceu as eleições em 2015, para a reitoria da UFSC, levou com ele um número significativo de votos dos trabalhadores técnico-administrativos. Havia se comprometido, para o segundo turno, com as tão sonhadas 30 horas, que fariam a universidade ficar com as portar abertas desde manhã até a noite, sem fechar ao meio-dia. Eleito, precisou ser pressionado para levar adiante a proposta. Relutava, colocava entraves, mas ia caminhando.  Com sua trágica morte, em outubro de 2017, depois de uma espetaculosa ação da Polícia Federal, as demandas dos trabalhadores voltaram à estaca zero. No final daquele triste ano e no que se seguiu, a comunidade como um todo precisou se mobilizar para garantir que a universidade continuasse funcionando, até que viesse uma nova eleição.  As lutas particulares ficaram em segundo plano.

Em 2018, quando Ubaldo Balthazar enfrentou Irineu Manoel de Souza, os trabalhadores técnico-administrativos, em grande número, acreditaram que, por ser da equipe de Cancellier, Ubaldo honraria as promessas do reitor morto. Decidiram não colocar suas vidas nas mãos de Irineu, que já fora TAE e que já apontara com clareza meridiana suas propostas para a universidade, nas quais os TAEs teriam vez e voz. 

Com a chegada de Ubaldo Balthazar à administração central, os TAEs já tiveram de enfrentar de saída um longo processo de luta para garantir a permanência de uma trabalhadora que tinha sido reprovada no estágio probatório. Uma excrecência administrativa e uma clara perseguição. Não foi uma luta fácil, sempre barrada pela Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas, que viria desde aí se mostrar, de maneira paradoxal, contrária a muitas demandas dos trabalhadores. 

Ao mesmo tempo em que a batalha por Juliane seguia dura, estava também colocada na mesa a proposta de controle de horário dos trabalhadores através do ponto eletrônico. Isso já tinha sido tentado em outras administrações, todas barradas. Os trabalhadores tinham construído uma proposta de controle social e com ela foram para a mesa de negociação, buscando esclarecer ao reitor que a universidade não era uma fábrica de salsichas e como uma instituição educacional não se prestava a um controle estrito como o do ponto. Mas, a conversa com a administração sempre foi difícil. Primeiro porque o reitor raramente se manifestou, sempre alegando que seguia o que mandava a Justiça, preferindo colocar a questão nas mãos da Pró-Reitoria de Gestão ou do chefe de gabinete, Áureo Moraes. 

Durante todo o processo que levou o Ministério Público indicar a implantação do ponto,  a reitoria se limitou a uma defesa formal sobre o tema, sem chamar os procuradores para uma conversa e sem propor uma ação mais agressiva no sentido de discutir a especificidade da universidade. Deixou que a questão corresse sem defender os trabalhadores, usando inclusive a ação como pretexto para acelerar o processo de controle. Estava mais do que claro para os trabalhadores que essa administração seguia a mesma linha de pensamento de praticamente todas (exceto a de Diomário de Queiróz) as que já passaram pela UFSC: a de tratar os TAEs como mão-de-obra desqualificada, sem qualquer ligação com o processo educacional. Para  maioria dos professores – e a administração parece se colocar aí – o TAE não desenvolve qualquer trabalho intelectual, podendo então ser controlado através do relógio. 

A administração finge desconhecer o trabalho dos TAEs que se faz nos espaços de ensino, de  pesquisa e de extensão, afinal, até mesmo os que tem como função abrir e fechar as portas estão envolvidos intelectualmente com seu fazer  e com a educação, porque sabem que se a porta não tiver aberta, o processo educacional não se realiza. Além do que, os que têm essa função não se limitam a ela, visto que esses trabalhadores também são responsáveis pela excelência dos espaços de aula e dos laboratórios, acumulando um conhecimento sobre os equipamentos e os processos que muito professor não tem. Isso é trabalho intelectual. 

O fato é que, passados três anos da administração de Ubaldo Balthazar, a gestão tem sido leonina com os trabalhadores TAEs. Praticamente nenhum avanço nas demandas internas, ainda que existam encontros e conversas amistosas que só revelam a omissão e o não-comprometimento com as promessas de campanha. O desmoronamento do já implantado processo das 30 horas foi central. Tudo foi cancelado sem levar em conta toda a estruturação da vida que já tinha sido modificada. Sem discussão e sem diálogo, os setores que já faziam 30 horas tiveram de desfazer os turnos e fechar os setores. 

Agora, em plena pandemia e todo o desconforto gerado pelo trabalho remoto, que tem esgotado e onerado os trabalhadores, a reitoria coloca como pão comido a implantação do malfadado ponto eletrônico. Nunca lutou junto com os trabalhadores, nunca se comprometeu, nunca sequer tentou compreender a proposta do controle social. Todo o debate sobre o tema sempre foi  marcado por uma postura anti-trabalhador  da pró-reitora Carla Búrigo – uma TAE – mostrando que o ponto nunca esteve em questão para essa administração, visto que nem o reitor, nem a Prodegesp esboçaram qualquer atitude diante das intervenções do Ministério Público e da Justiça.  A administração abriu mão da autonomia, não foi capaz de mostrar a verdadeira face do trabalho realizado na universidade e agora já dá como uma realidade sem volta a implantação do ponto eletrônico. Um ponto que será biométrico, com o uso de câmeras e catracas. Ou seja: O Ministério Público e a Justiça agem como se os trabalhadores da UFSC fossem um bando de irresponsáveis e relapsos, vagabundos em potencial, sempre dispostos a driblar o trabalho. E a administração aceita isso sem pestanejar. É o que pensa também? Acredita que os trabalhadores precisam desse tipo de controle bizarro e fora de propósito?

Claro, fora de propósito para nós que somos TAEs, porque para a administração e boa parte dos professores, é a coisa mais acertada a fazer: colocar um cabresto no trabalhador para voltar a exercer sobre ele o mesmo tipo de controle que havia quando não existia sequer concurso público: a velha moeda de troca para ganhar eleições. Aí, haverá chefes que afrouxarão, pedirão favores, tudo como antes na fazendinha Assis Brasil.

Assim que é hora de os trabalhadores compreenderem o tremendo erro que foi confiar nas promessas do grupo que trouxe Ubaldo para a reitoria. Porque foi um engano. Nem deu sequência às promessas feitas por Cancellier – e esse grupo venceu como defensor de seu legado – nem bancou as próprias promessas feitas. Para os TAEs essa administração não apontou nada de bom.  Pelo contrário.

É tempo de aprender a lição.