Fotos: Juliana Adriano/MST |
Desde que em 1985 um grupo de agricultores sem-terra decidiu ocupar terras da união ou improdutivas para forçar a reforma agrária que o Brasil passou a conhecer o Movimentos dos Trabalhadores Sem-Terra: o MST. Naqueles anos de fim do regime militar e de recomeço da frágil democracia brasileira, os sem-terra eram demonizados: bandidos, baderneiros, subversivos. Para a mídia comercial nada mais eram do vagabundos roubando terra alheia. E, para eles, o que estava reservado era a polícia, a prisão, a violência, a difamação.
Mesmo assim, milhares de famílias que já não tinham nada a perder decidiram engrossar as fileiras do movimento e as ocupações de terra foram crescendo em todo o país. A primeira grande ocupação, a Fazenda Annoni, no interior do Rio Grande do Sul, chegou a abrigar mais de seis mil pessoas numa imensa cidade de lona, em luta e em resistência.
A partir daí o Movimento só cresceu e hoje está organizado em 24 estados do país. Nesses 35 anos mais de 350 mil famílias saíram da condição de acampados sem-terra e conquistaram a terra produzindo coletivamente nos assentamentos do MST. Esse tem sido o desafio dos agricultores: produzir, apesar de todas as dificuldades que são colocadas para eles.
Como é sabido o Brasil tem cantado loas para o agronegócio - que é a monocultura do grão ou o latifúndio da pecuária - mas muito pouco investe na agricultura que realmente produz comida para a mesa dos brasileiros. Cada avanço nas políticas para os pequenos produtores tem de ser conquistado na luta renhida, coisa que nunca faltou ao movimento sem-terra. E muitos dos programas que existem hoje para o pequeno produtor são fruto dessa luta.
É assim que, na batalha cotidiana, o MST vai fortalecendo sua produção e suas cooperativas. Tem profunda ligação com a agroecologia e procura produzir sem o uso do agrotóxico, acabando assim com o mito de que é impossível uma agricultura em escala sem o uso de veneno. A vitória da agricultura sadia é possível de ser notada no fato de o MST ser, por exemplo, o maior produtor de arroz orgânico da América Latina. Isso não é pouca coisa. É fruto do modo de produção sustentável e solidário construído pelo movimento.
Desde o ano passado que o novo governo que ocupa o executivo federal vem desmontando as políticas para a pequena e média agricultura. Isso passa pelo fim de programas de crédito e pelo investimento massivo apenas no agronegócio. A agricultura familiar está cada dia mais perdendo os poucos benefícios que conquistou. Além disso, a destruição do Incra, órgão responsável pela condução das políticas de reforma agrária, acaba por também inviabilizar a continuidade de programas que garantem novas terras para novos assentamentos. A reforma agrária, que não aconteceu em sua inteireza, segue sendo um sonho. São mais de quatro milhões de famílias sem terra querendo produzir sem ter como fazê-lo porque as terras estão concentradas nas mãos de pouco mais de dois mil grandes proprietários.
E é justamente para mostrar como a reforma agrária pode dar certo que o MST realiza sistematicamente suas Feiras Estaduais visando dialogar com os trabalhadores urbanos sobre a importância da produção de comida saudável. Assim, quando chega o tempo da feira, o movimento vem para a cidade e finca suas bandeiras no espaço urbano para vender os alimentos e para discutir em profundidade com parceiros e sociedade em geral temas como agroecologia, reforma agrária e soberania alimentar.
Nesse ano de 2020 a Feira Estadual acontece nos dias 16, 17 e 18 de abril, no largo da Alfândega da capital. O lançamento da proposta foi feito na Assembleia Legislativa, em Florianópolis, nesta quarta-feira, dia 11 de março, e contou com a presença de autoridades, sindicalistas, movimentos social urbano e apoiadores. Foi tempo de discutir a nova conjuntura que se apresenta e mostrar os frutos colhidos pelas lutas e pela organização dos trabalhadores sem-terra.
O processo de destruição das conquistas sociais está em curso e é mais do que hora da união do campo e da cidade. O MST sempre esteve nessa batalha, compreendendo que muitos dos sem-teto urbanos são companheiros que tiveram de deixar o campo, as cidades do interior, para buscar uma forma de sobreviver nos grandes centros. Por isso, cada dia mais, a aliança operário/camponês se faz necessária. Os trabalhadores, juntos, construindo o mundo novo, que não é o do capitalismo reformado, mas o do socialismo.