quinta-feira, 2 de julho de 2020

Mulher-gato


Lidar com meu velhinho não é moleza. Os dias são difíceis e tensos, porque a demência é coisa dura de lidar. Mudanças rápidas de humor, a ideia fixa de ir embora, o pega-pega de coisas, o ir e vir sem parar. Uma rotina que não dá folga, ainda mais agora na pandemia. Mas, tem também seus momentos engraçados e mostra o quanto a gente tem a capacidade de se reinventar, ou de descobrir habilidades jamais imaginadas. Uma delas é o radar do movimento. Durante a noite, deito na cama ao lado do pai e quando ele adormece, eu também durmo. Mas, ao menor movimento, mesmo que eu esteja em alfa, acordo. Ele levanta umas quatro vezes para ir ao banheiro e é sempre um salseiro. Mas, eu não falho.

A outra habilidade que descobri em mim é a do olfato apurado,praticamente felino. Como agora ele não se dá mais conta que está fazendo cocô, se desobriga a qualquer momento, sem ir ao banheiro. Nos primeiros dias era aquela confusão, cocô por todo o lado, uma sujeirada. Tentei as fraldas. Não deu. Resolvi colocar nele só calças de pernas bem largas, então, se ele se aliviava, a coisa caia pelas pernas e eu corria para limpar. Estava dando certo. Mas, agora, eu adquiri a capacidade de sentir quando o processo começa. Então eu sinto o cheirinho e já saio correndo com os lencinhos umedecidos para aparar na saída, sem que ele chegue a sujar as calças. É incrível. Estou infalível, como um gato. É uma aventura e tanto. E engraçado. Porque ele sempre faz aquela cara de surpresa intensa.

- Mas, o que é isso?

- Nada não, só um cocozinho.

- Mas que barbaridade.

E assim, seguimos...


2 comentários:

Krishna Neffa disse...

Incrível a capacidade do ser humano de se adaptar às mais adversas situações. Minha vó tb estava assim. Mas ela usava fraldas. 😌

Krishna Neffa disse...

Elaine, você é uma figuraça! Admiro-a.