domingo, 4 de março de 2018

Com amor, Vincent



A primeira vez que vi Vincent foi através de uma de suas pinturas, “Os comedores de batatas”, que compunham uma coletânea dos melhores pintores do mundo, numa dessas coleções que meu pai comprava dos vendedores de livros que batiam na nossa porta. Eu devia ter uns 10 anos. Gostava do quadro porque me lembrava da casa da vó Tila e do vô Dionísio. Lá não havia luz e a gente também comia sob a luz do lampião. Eles eram agricultores e a comida sempre era simples, no geral um único prato. E, por fim, porque eu sempre fui apaixonada por batatas. Assim, aquela cena de luz bruxuleante impregnava minhas retinas. Os trabalhadores e sua imanência.

Só bem mais tarde fui descobrir e também amar o Vincent mais colorido, amarelo e vibrante. Ainda assim, “os comedores de batata” seguia sendo meu quadro favorito. Para além da pintura, a história dramática do pintor, tão triste, sempre me comoveu e uma das primeiras coisas que fiz quando fui a Amsterdã foi buscá-lo, no museu que abriga suas obras. Por algum motivo não sabido, eu sempre o amei.

Ontem vi o filme de Dorota Kobiela e Hugh Welchman “Com amor, Vincent”, cujo projeto reuniu 100 diferentes pintores e somou 65 mil frames. Chorei o tempo todo da projeção e segui chorando, aos soluços, até umas três horas depois. O filme é uma poesia, uma belezura, uma obra de arte. Um grito de amor a esse tumultuado artista que, em apenas oito anos de trabalho, reinventou a pintura.

Ao ver que a história girava em torno do profundo amor que o carteiro Joseph Roulin tinha por Vincent, verteu o aguaceiro. Pois é justamente a família de Roulin que Vincent imortalizou no quadro “os comedores de batatas”. E a saga de seu filho, tentando desvelar a morte do pintor, é estonteante, apaixonante, abissal.

Enquanto o jovem busca a verdade, as telas de Vincent se movimentam sob nossos olhos e aí, essa mistura da pintura, da vida e dos sentimentos de Van Gogh vão amalgamando um sentimento que é misto de dor, alegria, prazer e desespero. 

Vincent começou a pintar aos 28 anos e morreu aos 37. Cedo demais. Ou não. A explosão de sua obra talvez tivesse sido grandiosa demais para o corpo. Em vida vendeu um único quadro e hoje é um dos mais importantes pintores de todos os tempos. O filme explora essa intensidade, essa necessidade oceânica de expressar a vida. O tempo passa e a gente não sente, misturada entre risos e lágrimas, entre a doçura e mão dura da dor.

Quando acaba, não acaba, e a gente fica atordoada por horas. Pela beleza da obra, por Vincent, pela beleza da vida. Uma vontade louca de abraçar aquele ruivo grandote e dizer: Te amo. Obrigada.

Recomendo o filme. É extraordinário...


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