sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Terno de Reis: cultura de raiz

Há 15 anos, preocupado com o desaparecimento das tradições açorianas, o incansável Gelcy Coelho, Peninha, então trabalhando no Museu da UFSC, onde conseguiu recuperar as obras de Cascaes, decidiu realizar um encontro de Terno de Reis. Afinal, essa tradição de andar de casa em casa, anunciando a boa nova, sempre foi muito arraigada à cultura local. Mas, com a migração e a especulação imobiliária, os costumes nativos foram perdendo força e a urbanização acelerada também foi suprimindo o hábito das visitas e das serenatas.

Então, buscando aqui e ali, o Peninha descobriu que, apesar de todos os problemas e do inchaço desordenado da cidade, a tradição sobrevivia em alguns bairros. Em pouco tempo já foi possível juntar vários grupos que ainda praticavam o milenar costume de anunciar a chegada de Cristo no dia seis de janeiro. E então surgiu o encontro dos Ternos de Reis que foi realizado com pompa e circunstância na catedral da cidade.

Hoje, o encontro segue acontecendo, já encampado pela Fundação Franklin Cascaes, responsável pela política cultural municipal. Assim, na semana do seis de janeiro, os ternos de reis dos bairros tradicionais se reúnem na praça central para lembrar e celebrar. E é coisa muito bonita de se ver porque centenas de pessoas acorrem para o centro numa alegria sem fim. Poucas vezes se pode testemunhar um encontro tão grande da gente nativa, do povo mais velho, ligado na tradição. As pessoas põem seu melhor traje e vêm, com a família inteira para honrar o “deus menino”.

As escadarias da catedral são insuficientes para tanta gente. E as senhoras da Barra da Lagoa, do Ribeirão, de Santo Antônio, do Sambaqui, do Campeche aparecem plenas na sua beleza. Um a um os ternos vão se sucedendo, numa cantoria bonita e aguda que, de tão alta, chega ao céu. Como explica Peninha, o terno de reis é uma tradição de anunciação. “Como antigamente não havia rádio, nem internet, era preciso que as pessoas andassem pela comunidade anunciando as coisas, um nascimento, um casamento, uma festa. E o dia de reis era um desses dias. Tinha que anunciar a chegada do salvador. E esse grupo é chamado de terno porque tem três vozes: a primeira, a segunda e a oitava. A oitava é essa voz agudíssima, bem alta, que era para chegar ao infinito”.

Na praça de Florianópolis o encontro chegou a sua 15 edição, com mais de 15 ternos se apresentando, alguns deles com gente bem jovem, o que mostra que apesar de toda a tecnologia de comunicação que está colocada a serviço das gentes, ainda há essa necessidade visceral do encontro face-a-face, da comunhão, da festa comunitária.

Ouça a entrevista com Peninha


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