sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Carta aberta à comunidade universitária



Os trabalhadores técnico-administrativos em educação (TAEs) estão em greve desde o dia 05 de agosto. Decidiram por deflagrar esse movimento depois que a reitora Roselane Neckel, rompendo um processo de negociação que vinha sendo construído desde a greve de 2012, baixou uma portaria, definindo, de maneira unilateral e autoritária, como deveria ser a jornada de trabalho da categoria, desconsiderando todo a construção de um grupo de trabalho criado pela própria administração para discutir a reorganização da vida laboral na UFSC. Surpreendidos com a medida, que abarcava apenas os TAEs, os técnico-administrativos entenderam que a atitude se configurava uma retaliação pela participação dos trabalhadores na última greve da Fasubra, encerrada em junho desse ano.

Assim, depois de muito debate, os TAEs optaram por deflagrar um movimento de greve que chamaram de “ocupação”. Ou seja, a greve fugia da lógica tradicional, de paralisação dos serviços, e se apresentava com a proposta de ampliação dos serviços, uma vez que boa parte dos estudantes fica excluída do atendimento da UFSC, já que os setores fecham no horário do meio-dia e também à noite, quando muitos cursos têm aulas.  Os trabalhadores não aceitaram a decisão antidemocrática de estabelecer um horário comercial para uma única categoria que, tal e qual os colegas professores, produz trabalho imaterial, fora da lógica da produção.  

A greve, histórica, por ser a primeira greve interna da UFSC decidiu, como metodologia de luta, implantar os turnos corridos de seis horas, mantendo os setores abertos por mais de 12 horas, enquadrando-se assim na lei que permite a jornada de 30 horas, caso haja o atendimento ininterrupto. Era uma forma de mostrar à reitora que já estava na hora de a UFSC ser exemplo nesse processo que está em curso, com lutas semelhantes em praticamente todas as instituições federais. E assim foi feito.

Imediatamente, os trabalhadores encaminharam pedido de abertura de negociação. Queriam retomar o diálogo interrompido com a medida autoritária. Conseguiram garantir três mesas de negociação, ainda que sem a presença das reitoras, que, infelizmente, recusam-se a negociar cara-a-cara com os trabalhadores desta universidade. De qualquer forma, os TAEs se dispuseram a conversar, colocando na mesa a necessidade de uma discussão ampla em toda a universidade, não só sobre a jornada dos trabalhadores, mas todo o processo de organização laboral, incluindo também os professores, já que também são servidores federais, e os estudantes. Apenas na terceira mesa ouviram do chefe de gabinete que a proposta de debates costurada ao longo da greve estava aceita.

Mas, para surpresa de todos, um dia antes da assembleia que iria discutir a proposta acordada na última mesa de negociação, a reitora baixa uma ordem de notificação de desconto de horas dos trabalhadores em greve. Alega a dirigente da UFSC que os trabalhadores estão sendo “impontuais”. A reitora se recusa a reconhecer que os TAEs estão em greve. Manda cortar salário sem levar em conta o movimento. Não bastasse essa ser uma decisão também histórica - jamais um reitor cortou horas de trabalhadores em luta  - ela se faz sem qualquer base material. Ficou a cargo das chefias estabelecerem o número de horas “faltantes”. Mas, como saber quantas horas um trabalhador trabalhou se as chefias não ficam o tempo todo no setor? Muitos chefes estão enviando boletins de frequência com informações falsas, já que não têm como provar se o trabalhador estava ou não no setor.

Nesse contexto de “caça aos TAEs” deflagrado pela reitora Roselane Neckel, muitas são as diferenças de tratamento. Como a universidade não é uma fábrica e os setores precisam atender em horários diferentes, tem sido prática corrente os acordos, nos quais chefias e trabalhadores estabelecem seus horários levando em conta as necessidades dos setores. Alguns desses acordos estão se dando em bases ilegais, com os trabalhadores assinando a folha ponto com um número de horas que não corresponde a realidade. Mas, como estão “sob acordo”, tudo fica bem.

Muito tem sido dito pela atual administração central sobre legalidade. Observamos um movimento contínuo de Roselane Neckel de esconder-se atrás da Procuradoria Federal, e recusar-se a realizar os debates no campo da política. Lamentavelmente, muita desinformação sobre legislação vem sendo difundida pela gestão atual, que se recusa a discutir casos de IFES em que reitores, exercendo a autoridade administrativa que lhes é cabida, autorizaram a redução da jornada de trabalho com ampliação de atendimento. O caso de Pelotas é emblemático, mas, também recentemente, a reitoria do IFSP instituiu tal medida, demonstrando, mais uma vez, que cabe ao administrador máximo de cada instituição tomar esse tipo de decisão.

Mais lamentável ainda é o fato de a atual gestão que se pauta numa suposta “legalidade” quando assim convém, mas fechar o olho para irregularidades quando necessário para levar a cabo suas políticas. É o que se evidencia quando cria um órgão deliberativo próprio, o suposto “Fórum dos diretores”, sem participação estudantil ou dos TAEs, transformando o Conselho Universitário num espaço meramente formal. Ilegais também são as ordens emitidas pela reitoria às chefias dos setores, para que se adulterem os documentos de registro de frequência dos TAEs, retirando deles qualquer menção da palavra “greve”.

Os trabalhadores não querem compactuar com corrupção, nem querem acordos individuais, que os aprisionam em redes de favores e privilégios, ao bel prazer dos chefes. Os trabalhadores em greve querem um debate amplo na UFSC sobre a organização do trabalho na universidade. Um debate honesto, levando em conta todas as especificidades de cada Centro, cada setor. E que a universidade, como instituição autônoma, decida sobre seu funcionamento, sem se render a ordens de outras entidades. Só a UFSC sabe como deve gerir sua vida. É isso que os trabalhadores querem: uma decisão coletiva, autônoma e honesta.

A reitora insiste em punir com corte de salário os trabalhadores que estão exercendo seu direito legítimo de greve, e, neste caso, sem prejudicar o funcionamento da UFSC, uma vez que estão trabalhando normalmente.  E mais, busca promover acordos individuais para que saiam da greve. Caso desistam do movimento, propõe, terão o “perdão” do desconto. Isso é desonesto com os trabalhadores e com a sociedade. Não queremos acordos, nem enganos. Queremos que a sociedade saiba que o trabalho que realizamos pode e deve ser feito em turnos ininterruptos, garantindo atendimento de qualidade, sem exclusão.

Nossa batalha não é contra o registro de frequência. pelo contrário, temos propostas concretas para isso, que não passam pela ultrapassada folha ponto, nem pelo ponto eletrônico, igualmente ineficaz para o tipo de trabalho que se produz na universidade. Temos propostas e queremos ser ouvidos. Essa é a luta!

Pedimos o apoio de todos nessa luta. Que a comunidade se levante contra os “acordos secretos”, que não aceite a ilegalidade, a falsidade ideológica. Que haja os debates, amplos e em todos os Centros, Reitoria e nos campi, para que possamos apresentar nossas demandas e defender nossas ideias. Essa é uma universidade democrática e permitir uma arbitrariedade com os TAEs hoje, é abrir caminho para o fortalecimento do autoritarismo. A mão que hoje golpeia os TAEs pode golpear qualquer um amanhã.

Queremos que a reitora reconheça nossa greve, que suspenda as punições e que abra o debate sobre a jornada de trabalho. Que comporte-se com a dignidade que o cargo exige, e seja coerente com a plataforma política com a qual se elegeu.

Técnico-administrativos em Educação em greve
OUTUBRO/2014

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