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Conversas com El Che
Sempre que vem chegando o nove de outubro eu convoco el Che para uma charla. Ele vem. Chega mansinho e se aboleta no meu alpendre, nas cálidas noites desse mês de primavera. Então, cevando um bom mate, vamos falando sobre as coisas do mundo. Conto tudo o que se passou desde a última conversa, falos dos ataques do império. Ele cospe no chão e pragueja em argentino.
Esse ano cumprirão 50 anos do seu assassinato em La Higuera, Bolívia. A gente sempre fala disso. Da tristeza do nunca mais, da interrupção dos planos e sonhos. Mas, também falamos dos avanços dos trabalhadores e dos revolucionários de todo o mundo. Ele gosta de saber que a Bolívia hoje é um estado plurinacional, e que os indígenas tem constituído um poder capaz de fazer avançar suas demandas.
Ele lembra bem do dia em que morreu. Executado por um soldado boliviano que sequer sabia muito bem quem era o homem que matava. Lembra do tremor da mão do garoto, dos olhos perplexos, lembra de ter sentido um queimor e, depois, o silêncio.
O corpo do jovem guerrilheiro argentino, que ajudou na vitória cubana e nas lutas africanas por libertação, virou poeira cósmica, energia. Mas suas ideias seguem reverberando tanto tempo depois. Os homens da CIA que decretaram sua morte, cortaram suas mãos e desapareceram com o corpo. Como se isso pudesse fazer desaparecer toda uma proposta de um novo tipo de ser humano, ético e solidário, capaz de se comprometer com cada irmão caído.
Aqui, no alpendre, entre um mate e outro, vamos relembrando tudo o que já se passou no mundo desde que ele se foi. E o quanto sua figura e seu ideário ainda evoca libertação, paixão, amor pela vida.
Ele olha pra mim e sorri. "Não há silêncio". Sim, comandante. Não há. As gentes empobrecidas e exploradas pelo capital seguem resistindo e clamando por um tempo novo. Novas lutas, novas propostas, novas práticas.
Nessa semana de lembranças de sua caída, milhares de pessoas no mundo estarão lembrando, estudando, conhecendo, construindo projetos, lutando. "Ainda goteja a fonte do crime", grita Mahmoud Darwish, o poeta palestino. E acrescenta: "Rebelem-se". É o que seguimos fazendo, até que chegue o grande meio-dia.
No amargo do mate, que ronca uma última vez, a lição mais profunda: "Há que estudar, estudar e estudar. Há que ser perfeito. Há que se mover por grandes sentimentos de amor".
Vamos tentando, comandante. Vamos tentando.
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