Eu tinha acabado de chegar a Florianópolis para fazer a
faculdade de jornalismo. Era 1987. Dividia um apartamento, no mítico Itambé,
próximo à UFSC, com mais três colegas de aula. Dias duros, sem trabalho,
precisando pagar as contas. Então um deles arranjou uma namorada. E ela entrou
na minha casa e na minha vida como uma rajada de vento. Era maio. De cara eu
não gostei daquela guria magrela, alta, de olhos rasgadinhos e de cabelos
radiantes como o sol. “Filha de milico, arg! Boa coisa não pode ser...” Era eu
destilando meus pré-conceitos.
Toda vez que ela vinha eu repetia minha cara blasé. De pura
nojentice. Não queria criar laços.
Mas, sem eu querer, a guria foi entrando. O namoro com o
colega acabou, e a gente seguiu amigas. Ano após ano, construindo uma relação
de amor. Conflituosa, às vezes, mas capaz de resistir a todas as tormentas. Ela
parece que tem um radar, capaz de sentir desde longe, quando a tristeza me vem.
Então liga, e sua voz apascenta minha alma. Sempre foi assim.
Tem uma qualidade única, coisa jamais vista. Ela me liga
quando está feliz, quando vive algum momento estelar, quando transborda de
contentamento. Como o menininho do texto do Galeano, ela repete o “me ajuda a
olhar”, na presença do infinito. Somos capazes de ficar em silêncio quando tudo
é grande demais, e podemos morrer de rir de coisas idiotas, que só nós
compreendemos.
Nossa amizade é feita de pequenas e grandes coisas, de
alguns vazios, de cumplicidade amorosa, de cuidados, tanto na dor quanto na
alegria. Ela conhece meus tormentos, minhas escuridões. E nunca foi capaz de se
perder de mim, nem quando me faço insuportável.
Desde aquele maio de 1987 vamos caminhando nesse mundo.
Separadas geograficamente, mas sempre antenadas com o que se passa da vida da
outra. Amizade sólida, pétrea, que não se esboroa.
São 30 anos de bem-querença e eu rendo graças aos deuses por
um dia ter deixado aquela compridona entrar no Itambé, no meu coração e na
minha vida.
Te amo, Catarina Gewehr, mulher/vento/sol. E te agradeço,
por sempre estar...