Nós estaremos na Felipe, a partir das 15 horas - 31 de outubro - Foto: Rubens Lopes
Dia 31 de outubro se celebra no Brasil, o Dia do Saci Pererê
e seus amigos. Uma resposta cultural e uma ação de resistência diante da invasão
fetichizada da festa do “raloím”, bastante importante na cultura estadunidense,
mas que para nós diz muito pouco. E, da
maneira como é festejada, nada mais é do que outro bom motivo para vender
coisas, as mercadorias do mercado capitalista.
Em Florianópolis, no ano de 2003, um pequeno grupo decidiu
enfrentar o desafio de resistir a mais essa invasão. O raloím, que até então
era festejado só nas escolas de inglês, passou a invadir as escolas públicas e
até as creches. Uma coisa de doido, porque aqui quase ninguém sabe o que esse
mito representa. E mito é coisa séria.
Diz do humano, do que nos é mais profundo.
Estávamos no Sindicato dos Trabalhadores da UFSC e tínhamos
acabado de conhecer a batalha de alguns grupos do interior de São Paulo, que
procuravam contrapor o Saci ao mito do raloím. Resolvemos então trazer para
Florianópolis a celebração desse adorável mito brasileiro, que é uma mistura
das três grandes matrizes da cultura brasileira: o branco, o índio e o negro.
Tudo junto e misturado. Nosso mito mais profundo, que simboliza o guardião das
florestas, das matas, da vida. Que representa nossa alegria, nossa molecagem,
nosso espírito rebelde.
Então, no 31 de outubro, levamos o Saci para as ruas. A
resposta foi incrível. As pessoas conhecem e amam o Saci, elas apenas não têm
oportunidade de brincar com ele, de conhecê-lo em profundidade. E foi isso que
começamos a oferecer. Todo ano, no mesmo dia do raloím, lá vamos nós para a rua,
carregando o Saci e contando sua história, que é, na verdade, nossa história
profunda. A gente distribui panfletos, conta histórias, dança, pula, se diverte
à larga. E junto com a gente, brincam todas as pessoas que passam pelo calçadão
da Felipe. Ninguém fica imune. A alegria contagia. E mesmo aqueles que apontam com a cara fechada, ao verem o Saci
e ao perceberem que aquela muvuca é uma festa pindorâmica, ancestral, abrem o
riso e passam pulando.
A festa foi sendo realizada todos os anos, já virou uma
tradição. Sempre construída com o apoio de sindicatos e movimentos, promovida
agora pelo grupo da Pobres e Nojentas. E movimenta tanto a vida da cidade nesse
dia de resistência cultural, que o Dia do Saci e seus amigos foi oficializado
pela Câmara Municipal de Florianópolis, como um dia de festa no calendário da
cidade, assim como é de festa o dia do aniversário, o dia das rendeiras, dos
pescadores. Isso é legal porque pode permitir que a municipalidade também atue
na resistência cultural. Não tem feito isso, mas pode fazê-lo se quiser.
Pois agora, um vereador do PSB chamado Bruno Souza quer
revogar a lei que institui o Dia do Saci e seu amigos, que aqui na ilha inclui
também as bruxas do Cascaes e o Boi-de-mamão, mitos e festejos típicos do lugar.
Ele diz que isso é uma bobagem e que a lei é inútil. Ele deve crer também que
festejar a cultura nacional é inútil. Talvez acredite que o melhor mesmo é
comprar uma roupa de esqueleto e sair por aí festejando o raloím.
Esse ano, vamos para a rua de novo, no décimo quarto ano de
Dia do Saci e seus amigos. Porque a gente gosta das coisas inúteis. Essas
coisas que não se prestam a valor de troca nem de uso. Não são pra vender, nem
pra comprar, nem pra usar. São coisas para viver, brincar, amar. As coisas inúteis são essas que nos conectam
com a suprema beleza, com o sagrado profundo, as que provocam uma quentura por
dentro e explodem em ondas de felicidade.
Nós vamos para a Esquina Democrática nesse 31 de outubro,
com nosso Saci e com o Boi-de-Mamão. Vamos denunciar o golpe que vive nosso
país, vamos denunciar o Estado de Exceção que prende, julga e mata sem qualquer
processo - como fez com o reitor da UFSC, o Cao Cancelier. Vamos denunciar o
capitalismo que destrói tudo que toca. Vamos informar sobre a luta dos povos
originários, que ainda precisam batalhar por seus territórios, vamos denunciar
as mortes no campo, o extermínio dos jovens negros, a violência contra as
mulheres.
Vamos mostrar que estamos vivos e que não desistimos da
luta. E que ela pode se expressar também nesses momentos “inúteis”, de pura
brincadeira. Em meio a toda dor de um país que vai sendo destruído por poderosas
gangues que ocupam hoje os cargos de poder, nós dançaremos nas ruas. Como Jeremias,
no centro de sua terra arrasada, nós pularemos com o Saci, acreditando piamente
que é da nossa luta, como povo unido, que brotará a primavera.
O Dia do Saci e seus amigos será celebrado, como tem sido ao
longo desses 14 anos, no centro de Florianópolis. Haverá brincadeiras, danças,
pulos, e distribuição de sacizinhos. Terá o Boi-de-Mamão e terá alegria. Nós te
convidamos. Começa às 15 horas e vai até as 16h e 30 min. Passa lá. O Saci
também estará lá, com seu cachimbo e suas peraltices.
Venha pular e dançar, porque é preciso. Há uma longa e feroz
batalha para travar nesse nosso país acossado pelo golpe. E, nessa caminhada,
precisamos da alegria.
Esperamos vocês...
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