Alzheimer/Velhice

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Um sopro...



Dia 8 de dezembro é um dia de saudade para mim. Foi nesse dia, no distante ano de 1932 que a minha mãe nasceu. Naquele início de século, no interior da pequena Uruguaiana, fronteira com a Argentina, ela começou sua caminhada no rumo da beleza. Guardo sempre na memória seu riso de cristal, meio tímido, tão raro. No geral, era uma briguenta, e devo ter herdado dela essa mania de criticar tudo. Foi uma mulher comum, dessas de vida simples, cuidando dos filhos e da casa. Morreu em fevereiro de 1998, quase carnaval. Foi embora poucas horas depois de termos falado ao telefone, quando me contava de um bolo que estava fazendo. O bolo ficou no forno, enquanto ela dava seu último suspiro.

Lembro que estava indo para a Univali, parada no ponto do ônibus da UFSC, quando minha colega veio me chamar. Haviam ligado. Ela me disse: tua mãe se foi. E eu ri. Não podia ser, acabara de falar com ela. Mas, não era mentira. Num átimo, e ela era só saudade. A vida e suas peças. A ceifadora sempre à espreita.

Meu primeiro contato doloroso com a morte foi com a do meu avô, o qual eu amava com um amor sem tamanho. Por ele desacreditei de deus. Tão bom tinha sido, tão generoso, e morrera sem sua terra, com o peito estourando de tanta dor. Não me parecia justo.

Desde aí entendi que a vida da gente é feita de nossas escolhas. E há que pagar alto preço se elas não estiverem dentro das regras. Também vi que se há algo certo nesse mundo é essa hora dura em que temos de nos despedir desse imenso jardim. Deixar de brincar, deixar de rir e conviver com quem amamos, dar a mão à ceifadora e partir. Duro momento.

Nesses dias tristes, que mais sombrios ficam conforme anunciam festas e festejos natalinos, assomam os meus mortos, os que já encantaram. Sinto falta dos seus risos, do som da voz, do toque. E fica aquela sensação de que não expressamos suficientemente o amor, distraídos que estávamos em cuidar da própria vida. Mas, depois, pensando bem, imagino que o melhor presente para eles deve ser isso mesmo: a capacidade de seguirmos sozinhos, rasgando a vida sem medo.

Fico também pensando nos vivos, nos que ainda aí estão e que amo. Muitas vezes sem poder ver, sem poder dar carinho, impedida do abraço. E essa sim é a hora noa (da angústia), porque ainda há tempo, porque ainda correm os minutos. E a vida mesma, essa doida, nos joga para cá e para lá, com seus golpes. Até que venha o sopro fatal, quando nada mais restará.

São dias confusos e tristes... O balanço está vazio, o riso desaparecido. Como minha linda Abya Yala, feneço, olhando nos olhos da ceifadora, e paradoxalmente pedindo que espere um pouquinho mais...



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