Ouvi de um amigo agora pela manhã, falando sobre a marcha do
dia 15, chamada pela direita brasileira: "Eu já não sei mais o que é
esquerda, o que é direita". Eis aí um grande nó para a compreensão da
realidade. Acreditar que não há mais diferenças na forma de pensar e agir sobre
o mundo é cair numa armadilha de alienação. Sempre foram muito claros os conceitos
de direita e esquerda. Ser de direita é apostar na conservação dos privilégios
de poucos, é a postura da maioria dos mais ricos, por exemplo. Eles querem
seguir controlando as riquezas do país, para delas tirarem proveito, querem
dominar o espaço político, querem manter os mais pobres sob controle. Já ser de
esquerda é lutar contra isso, garantindo participação para todos, direitos
respeitados, o fim da opressão.
Pode parecer meio simplista explicar as coisas assim, mas de
fato a coisa é mesmo simples. A sociedade está dividida em classes sociais.
Uma, controla a produção e a outra vende seus serviços. Uma domina, outra é
explorada. E é justamente sobre a exploração de uma classe que a outra garante
seus lucros e sua vida boa. No meio desse processo as pessoas vivem uma
sistemática batalha. Os que são explorados querem uma vida melhor, e os que
exploram procuram não permitir que isso ocorra. Quando muito abrem mão de
coisas pequenas, quando a luta se acirra, apenas para tentar acomodar as
coisas. Mas, no fundo, segue apostando na manutenção dos privilégios.
A confusão sobre o que é ser esquerda e direita, em parte,
foi provocada pelo próprio Partido dos Trabalhadores, hoje no poder político. Forjando
toda a sua construção em pautas da esquerda, o partido chegou ao governo e
passou a ceder passo aos velhos grupos da tradicional direita. Tudo isso dentro
da chamada tentativa de governabilidade. Dilma, por exemplo, agora , nesse
segundo mandato chegou ao cúmulo de entregar setores estratégicos como as
finanças, a agricultura e a educação para figuras carimbadas da direita
nacional. Difícil então não ficar confuso.
O fato é que esses malabarismo de governabilidade só
alimentam o monstro. A elite brasileira é insaciável. Não lhe basta ter os
setores estratégicos na mão. Ela quer tudo. Então, engordados pelo próprio
governo, os velhos grupos de poder vão se fortalecendo, chegando ao ponto de
pedirem o impedimento e a renúncia da presidente. As razões para isso -
aparentemente - são as irregularidades na Petrobras. Argumentos bastante pueris
e insustentáveis. Mas, apesar da fragilidade da consigna, esses grupos tem
conseguido aglutinar pessoas que, mesmo no grupo dos explorados, por algum
motivo "compram" a proposta da direita. Temos visto gente gritando
pela volta do regime militar, argumentando que será só para tirar a Dilma, "depois
eles entregam o país". Para quem? Ah, bom, isso não importa. Há uma
completa falta de compreensão histórica. Os tenebrosos anos de regime militar,
que tantos horrores causaram nos mais variados países latino-americanos parecem
ter sido apagados da memória. Existe uma juventude que tampouco tem noção do
que está dizendo quando chama a intervenção militar. É uma ingenuidade muito
bem aproveitada pelos marqueteiros do golpe.
Agora, os movimentos sociais, cuja maioria estava adormecida
e domesticada,começam, lentamente, a perceber que há uma grande batalha em
curso. E procuram uma reação. Por isso estão chamando uma marcha para o dia 13,
dois dias antes da marcha da direita. E, assim, o Brasil vai realizar um exercício de manobras nas ruas,
expressando claramente os interesses em jogo.
Na marcha do dia 13 estão os sindicatos de luta, os
movimentos populares, as entidades de direitos humanos e civis. Estará a esquerda
crítica e estarão também os que apoiam Dilma. Porque a pauta da marcha do dia
13 é uma pauta dos trabalhadores. As gentes marcharão em defesa da Petrobras,
por reforma agrária, por demarcação de terras indígenas, pela democratização da
mídia, pelo combate à corrupção. Será uma mobilização da esquerda, com propostas
que visam a melhoria da vida de todos os brasileiros, especialmente dos
empobrecidos e dos que têm apenas a sua força de trabalho para vender.
Já a marcha do dia 15
é a marcha do golpe, da direita organizada e dos que, mesmo explorados, são
seduzidos por um canto de sereia que promete mudanças. Mas, a mudança prometida
é da manutenção dos privilégios e dos mesmos velhos grupos de poder. Sem
matizes. Participar disso é apoiar o atraso.
Mas, para muitos, a marcha do dia 15 é unicamente o libelo
contra a Dilma. Ora, eu também estou contra as políticas implementadas pelo
governo Dilma. Mas isso não significa que, por conta disso, vou me aliar ao que
há de mais nefasto nesse país. Como bem diz o professor Nildo Ouriques, o
projeto petista esgotou. O que igualmente não significa que no seu lugar tenha
que ser colocado o outro velho projeto - da direita - que também esgotou. Ou
será que as pessoas não se lembram do que FHC causou ao país nos seus dois mandatos?
Se hoje, o governo petista se assemelha àquele, qual é a saída? Constituir o
novo! Rearticular as forças, combinar projetos de transformação, avançar, ir
para frente.
Assim que não é necessário viver em confusão. Os clássicos
elementos que diferenciam a direita e esquerda seguem vigentes. Pode-se dar
outro nome para isso que alguns insistem em negar, mas o fato é que tudo é
muito simples. Ou estamos caminhando junto com os trabalhadores, os explorados,
os empobrecidos, ou estamos de mãos dadas com os poderosos, os exploradores, os
que sangram a maioria em nome de seus interesses pessoais. Simples assim.
Por isso que nessas horas de acirramento da luta de classes
não há espaço para vacilação. Temos de estar com os trabalhadores, ainda que
alguns deles sigam tendo ilusões com o governo petista.
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