Em Santa Catarina seguem as discussões sobre quais propostas levar para a Conferência Nacional de Comunicação, que deve se realizar em dezembro deste ano. Há meses que representantes de vários setores do movimento social (majoritariamente os ligados ao campo da comunicação) estão se reunindo e debatendo. No último dia 15 de agosto foi a vez da realização do Primeiro Seminário Pró-Conferência Estadual, com a participação, como conferencistas, do presidente da Federação Nacional dos Jornalistas, Sérgio Murilo de Andrade, e do professor da UFSC, Carlos Locatelli, além de representantes de várias regiões do estado.
No debate, que ocupou toda a parte da manhã, foi possível perceber a dificuldade que será o avanço nas questões mais estruturais da problemática comunicacional brasileira. No mais das vezes, cada grupo acaba refletindo apenas as suas questões intestinas, minimizando o debate dos temas mais gerais. Não bastasse isso, ainda há os que atuam dentro de uma consciência ingênua acreditando que os meios de comunicação, da maneira como estão estruturados, não são tão maléficos assim, e que a população de maneira geral tem bastante clareza sobre a enxurrada de lixo - e sobre a sedução capitalista - que os meios lançam sobre ela. Por conta disso, acusam os que querem pensar a totalidade de estarem subestimando as gentes.
Outra questão que mostra certa debilidade no debate é o desconhecimento dos avanços efetuados em outros países da América Latina no que diz respeito à comunicação. No geral, as pessoas não se preocupam em saber sobre como se deu, por exemplo, a mudança da lei na Venezuela, onde durante vários meses o governo discutiu com a população a proposta de uma lei geral de radiodifusão, que acabou aprovada sob o nome de Lei Resorte, garantindo mudanças estruturais no sistema. Também poderíamos citar o caso da Argentina, que desde a ditadura militar não mexia neste setor e que agora, no governo de Cristina Kirchner, também aprova uma lei que avança em pontos que o movimento social considera importantes. Igualmente na Bolívia e no Equador, as novas Constituições apontam mudanças e provocam reestruturações que devem ser conhecidas para que se possa pensar o nosso país dentro do contexto latino-americano. E aí não se trata de copiar modelos, mas de perceber como estes países conseguiram avançar desde uma postura nova do Estado.
E é por entender que sem mudança no Estado fica praticamente improvável o avanço da democratização, que a nossa intervenção se dá na direção da proposta de um outro Estado, com democracia participativa, com projeto nacional, com propostas concretas de transformação estrutural. A conferência precisa realizar um grande debate sobre qual é o Estado que queremos, porque é isso que vai delimitar os avanços que poderemos fazer acontecer. O governo de Luis Inácio, desde o seu início, em 2003, deixou bem claro a quem está servindo. É um governo se tem se prestado a todas as demandas do capitalismo internacional e, como se sabe, é da natureza deste sistema viver sob a ditadura do capital, inviabilizando, portanto, qualquer avanço democrático de fato. A dita democracia capitalista é um regime no qual a lei é movediça e está sempre mudando para defender os interesses dos graúdos. Assim, fincar pé em pequenas mudanças na lei é fazer muito barulho por nada, já que nestas condições, as mudanças acontecem apenas para que tudo fique como está.
Os empresários
A última jogada do tabuleiro da Confecom deixa muito explícita a tranquilidade do empresariado da comunicação no que diz respeito à movimentação popular. Ao não verem contempladas as suas exigências na organização do evento, no qual queriam impor suas pautas, decidiram sair do processo, deixando registrado em documento oficial que os movimentos sociais poderiam “fazer a conferência e apresentar as suas sugestões”. Ou seja, ao povo está dado o direito de “fazer sugestões” porque eles, que são os que detêm o controle do Estado, podem fazer o que quiserem depois. Isso, por si só, já deveria mostrar aos movimentos sociais que sem uma mudança no quadro de poder do Estado, muito pouco vai se avançar.
Mas, na contramão da história, os dirigentes da Fenaj insistem que a presença dos empresários na Conferência é muito importante para que se estabeleça o diálogo. “Queremos os empresários lá, porque teremos condições de igualdade”, afirmou Valci Zucolloto. “Muita coisa nós podemos discutir só com o Estado, mas outras não. Por exemplo, a regulamentação, as concessões. Isso temos que discutir com os empresários”, disse Sérgio Murilo.
Acreditar que a simples presença dos empresários na Conferência estabelece uma “igualdade no diálogo” é, no mínimo, estar muito equivocado sobre o lugar histórico que a Fenaj ocupa neste jogo de poder que é a luta por uma comunicação verdadeiramente democrática, com controle social. O espaço da conferência não dá e não pode dar igualdade porque esta igualdade não existe no plano real. O que há, de fato, é um poder enorme dos grandes monopólios de comunicação, em completa harmonia com o Estado. Aos movimentos sociais caberia compreender que, por serem maioria e por estarem conectados com os anseios populares, a eles – e só a eles - pertenceria o papel histórico da luta concreta por uma mudança radical no setor de comunicação. Nenhuma composição de classe é possível, nenhum consenso habermasiano é possível, quando aos donos das empresas - ramificados nos legislativos nacionais, estaduais e locais – está reservado todo o poder. E, se é assim, por que diabos discutir com eles questões chaves como as concessões? Se a radiodifusão é uma concessão do Estado, é com ele, e só com ele, que a sociedade tem de dialogar. Os empresários deveriam apenas se submeter à vontade popular, pois isso sim é democracia.
O povo não é bobo
Algumas falas durante o encontro catarinense se remeteram a idéia de que o povo sabe muito bem que os meios de comunicação mentem e que não é preciso que nenhum “iluminado” venha “ensinar” sobre esta questão. Isso para rebater a proposta de que é necessário sair das reuniões de gabinete e ganhar às ruas onde está a maioria das gentes que não pertence ao mundo da comunicação. Mas, como bem já ensinou Guerreiro Ramos existe uma diferença abissal entre a consciência ingênua e a consciência crítica. O trabalho daqueles que atuam na área da comunicação não é o de “ensinar”, mas sim o de desvelar os mecanismos que fazem os meios serem como são, levando as pessoas a entender de maneira crítica aquilo que elas já sabem não ser bom.
As gentes que não estão envolvidas diretamente neste processo não têm como saber sobre todas as nuances que envolvem o jogo de poder, no qual os empresários da comunicação dão a diretriz e instituem a pedagogia da sedução capitalista. Por isso que atuar nas Associações de Moradores, nos sindicatos, nos movimentos populares de outra ordem que não os da comunicação, passa a ser condição fundamental para o sucesso da Confecom. Sem tirar da mira a idéia de transformações estruturais, poderemos avançar nesta conjuntura, mesmo sabendo que a luta será difícil. Mas, sem a participação de outros setores da luta social isso fatalmente não acontecerá.
No debate, que ocupou toda a parte da manhã, foi possível perceber a dificuldade que será o avanço nas questões mais estruturais da problemática comunicacional brasileira. No mais das vezes, cada grupo acaba refletindo apenas as suas questões intestinas, minimizando o debate dos temas mais gerais. Não bastasse isso, ainda há os que atuam dentro de uma consciência ingênua acreditando que os meios de comunicação, da maneira como estão estruturados, não são tão maléficos assim, e que a população de maneira geral tem bastante clareza sobre a enxurrada de lixo - e sobre a sedução capitalista - que os meios lançam sobre ela. Por conta disso, acusam os que querem pensar a totalidade de estarem subestimando as gentes.
Outra questão que mostra certa debilidade no debate é o desconhecimento dos avanços efetuados em outros países da América Latina no que diz respeito à comunicação. No geral, as pessoas não se preocupam em saber sobre como se deu, por exemplo, a mudança da lei na Venezuela, onde durante vários meses o governo discutiu com a população a proposta de uma lei geral de radiodifusão, que acabou aprovada sob o nome de Lei Resorte, garantindo mudanças estruturais no sistema. Também poderíamos citar o caso da Argentina, que desde a ditadura militar não mexia neste setor e que agora, no governo de Cristina Kirchner, também aprova uma lei que avança em pontos que o movimento social considera importantes. Igualmente na Bolívia e no Equador, as novas Constituições apontam mudanças e provocam reestruturações que devem ser conhecidas para que se possa pensar o nosso país dentro do contexto latino-americano. E aí não se trata de copiar modelos, mas de perceber como estes países conseguiram avançar desde uma postura nova do Estado.
E é por entender que sem mudança no Estado fica praticamente improvável o avanço da democratização, que a nossa intervenção se dá na direção da proposta de um outro Estado, com democracia participativa, com projeto nacional, com propostas concretas de transformação estrutural. A conferência precisa realizar um grande debate sobre qual é o Estado que queremos, porque é isso que vai delimitar os avanços que poderemos fazer acontecer. O governo de Luis Inácio, desde o seu início, em 2003, deixou bem claro a quem está servindo. É um governo se tem se prestado a todas as demandas do capitalismo internacional e, como se sabe, é da natureza deste sistema viver sob a ditadura do capital, inviabilizando, portanto, qualquer avanço democrático de fato. A dita democracia capitalista é um regime no qual a lei é movediça e está sempre mudando para defender os interesses dos graúdos. Assim, fincar pé em pequenas mudanças na lei é fazer muito barulho por nada, já que nestas condições, as mudanças acontecem apenas para que tudo fique como está.
Os empresários
A última jogada do tabuleiro da Confecom deixa muito explícita a tranquilidade do empresariado da comunicação no que diz respeito à movimentação popular. Ao não verem contempladas as suas exigências na organização do evento, no qual queriam impor suas pautas, decidiram sair do processo, deixando registrado em documento oficial que os movimentos sociais poderiam “fazer a conferência e apresentar as suas sugestões”. Ou seja, ao povo está dado o direito de “fazer sugestões” porque eles, que são os que detêm o controle do Estado, podem fazer o que quiserem depois. Isso, por si só, já deveria mostrar aos movimentos sociais que sem uma mudança no quadro de poder do Estado, muito pouco vai se avançar.
Mas, na contramão da história, os dirigentes da Fenaj insistem que a presença dos empresários na Conferência é muito importante para que se estabeleça o diálogo. “Queremos os empresários lá, porque teremos condições de igualdade”, afirmou Valci Zucolloto. “Muita coisa nós podemos discutir só com o Estado, mas outras não. Por exemplo, a regulamentação, as concessões. Isso temos que discutir com os empresários”, disse Sérgio Murilo.
Acreditar que a simples presença dos empresários na Conferência estabelece uma “igualdade no diálogo” é, no mínimo, estar muito equivocado sobre o lugar histórico que a Fenaj ocupa neste jogo de poder que é a luta por uma comunicação verdadeiramente democrática, com controle social. O espaço da conferência não dá e não pode dar igualdade porque esta igualdade não existe no plano real. O que há, de fato, é um poder enorme dos grandes monopólios de comunicação, em completa harmonia com o Estado. Aos movimentos sociais caberia compreender que, por serem maioria e por estarem conectados com os anseios populares, a eles – e só a eles - pertenceria o papel histórico da luta concreta por uma mudança radical no setor de comunicação. Nenhuma composição de classe é possível, nenhum consenso habermasiano é possível, quando aos donos das empresas - ramificados nos legislativos nacionais, estaduais e locais – está reservado todo o poder. E, se é assim, por que diabos discutir com eles questões chaves como as concessões? Se a radiodifusão é uma concessão do Estado, é com ele, e só com ele, que a sociedade tem de dialogar. Os empresários deveriam apenas se submeter à vontade popular, pois isso sim é democracia.
O povo não é bobo
Algumas falas durante o encontro catarinense se remeteram a idéia de que o povo sabe muito bem que os meios de comunicação mentem e que não é preciso que nenhum “iluminado” venha “ensinar” sobre esta questão. Isso para rebater a proposta de que é necessário sair das reuniões de gabinete e ganhar às ruas onde está a maioria das gentes que não pertence ao mundo da comunicação. Mas, como bem já ensinou Guerreiro Ramos existe uma diferença abissal entre a consciência ingênua e a consciência crítica. O trabalho daqueles que atuam na área da comunicação não é o de “ensinar”, mas sim o de desvelar os mecanismos que fazem os meios serem como são, levando as pessoas a entender de maneira crítica aquilo que elas já sabem não ser bom.
As gentes que não estão envolvidas diretamente neste processo não têm como saber sobre todas as nuances que envolvem o jogo de poder, no qual os empresários da comunicação dão a diretriz e instituem a pedagogia da sedução capitalista. Por isso que atuar nas Associações de Moradores, nos sindicatos, nos movimentos populares de outra ordem que não os da comunicação, passa a ser condição fundamental para o sucesso da Confecom. Sem tirar da mira a idéia de transformações estruturais, poderemos avançar nesta conjuntura, mesmo sabendo que a luta será difícil. Mas, sem a participação de outros setores da luta social isso fatalmente não acontecerá.
Elaine, parece a defesa do Guilherme Canela: devemos olhar para os exemplos de comunicação dos países consolidados. Quando ouvi isso, pensei com meus botões "ué, onde tem isso???"
ResponderExcluirOu seja, observar modelos dos países latino-americanos não vale para as ditas personalidades brasikleiras que tratam da democratização das comunicações.
Outra, fica atenta: mesmo com a saída de 5 entidades empresariais da Comissão Organizadora Nacional, o Governo insiste com uma representação de 40% de delegados do empresariado, mais 60% [!!!!!!!!] de voto qualificado para temas sensíveis. Algumas comissões estaduais pró--conferência já se manifestaram contrárias a isso.
Dá uma lida na nossa nota: http://rsproconferencia.blogspot.com/2009/08/nota-da-comissao-rs.html
Beijo desde Porto Alegre!
Claudia Cardoso
A propósito do comentário do "Dialógico", quero testemunhar pelo exemplo de Portugal que, embora com nuances nacionais, o problema da manipulação da informação é hoje um fenómeno global. A exigir, de facto, um combate determinado por parte de todos os verdadeiros democratas.Essa luta deve começar pela exigência de uma Imprensa de independente do poder económico e que recuse intromissões do poder político; depois, seja imparcial, amante do relato honesto da realidade, democrática, cumpridora do princípio do contraditório, numa palavra, fosse aquilo que há muito se encontra consagrado nos códigos deontológicos dos jornalistas, esses profissionais da informação que hoje mais parecem uma "espécie" à beira da completa "extinção". Mas, vamos à luta!
ResponderExcluirSaudações.