Alzheimer/Velhice

sábado, 21 de fevereiro de 2009

A mão que me alimenta


Nós somos a teia de nossas relações. Ao longo da vida vamos amealhando pessoas com as quais costuramos essa bonita colcha que é nossa existência. E, nesse costurar, vamos tecendo a “família”. Coloco a palavra entre aspas porque entendo que família é algo que está além da consangüinidade. Senti isso neste verão quando, trabalhando, não encontrei aqueles que me alimentam nos dias de labor. Eles, que para muitos são invisíveis, se mostraram absolutamente essenciais para minha existência. Sem estas criaturas, a colcha do meu viver ficou mais feia.

Reparei nisso no dia em que os vi voltar. Era uma tarde quente e, ao escapulir da sala para levar um documento, os percebi lavando mesas e preparando o bar para voltar à ativa. Ali estavam com seus sorrisos e seus rostos iluminados. Enchi-me de alegria, pois eles me faziam falta. Num átimo percebi que estes seres também são minha família. Estão colados em mim. O Emerson, que no escondido da cozinha prepara os lanches, a Elisângela que nunca aparece, mas faz aqueles bolos deliciosos que nos espreitam no vidro. O Leandro, o Éderson, o Itamar e a Bruna que se revezam na azáfama de atender toda a gente nas horas de burburinho, sempre com um sorriso, apesar do cansaço. E o Habdon, que invariavelmente tem um comentário sobre a política da América Latina. Nenhum lanche é servido sem uma boa análise.

Cada um deles, presentes no meu cotidiano, tece parte de mim. É das mãos deles que vem o café, o pastel, o bolo, o sanduíche, a energia que move meu corpo nestas tantas lutas. Por isso, nestes dias de volta às aulas, eu me sinto impelida a agradecer. Porque eles poderiam ser só funcionários do bar, seres anônimos. Mas não são. Estas vidas que vendem sua força de trabalho ao Marcos e Angelis, têm nome próprio, são seres singulares, meus companheiros de classe. Cúmplices no sonho de uma vida boa. Eles no balcão e eu criando mundos com palavras. Trabalhadores, todos nós, conspirando para que chegue a sociedade sonhada, na qual não existam explorados nem oprimidos. Essa coisa boa que chamamos socialismo...

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