Alzheimer/Velhice

sexta-feira, 11 de agosto de 2023

Rádio Campeche, 25 anos

Balaio da Rádio - Foto: Rubens Lopes


A rádio comunitária do Campeche completará 25 anos em novembro. Um quarto de século sendo o espaço comunicativo das lutas e da cultural local. Nasceu em 1998, fruto da ação do jornalista Lúcio Haeser que conseguiu juntar todas as forças vivas que atuavam no bairro: a comunidade em luta. Desta união nasceu a ARCA, Associação Rádio Comunitária Campeche, cujo objetivo primeiro foi dar vazão a toda informação criada na batalha pelo Plano Diretor. Foi um tempo de grande ebulição social e muita participação popular. Nosso bairro era ponta de lança no debate sobre a cidade. E a rádio surgiu para ser o elo entre os movimentos, irradiando as propostas construídas coletivamente.  

Desde aqueles intensos anos a comunitária vem cumprindo seu papel de ser o espaço onde as vozes em luta podem se expressar. Muitos programas nasceram e morreram, muitos companheiros e companheiras passaram, porque a luta comunitária é assim mesmo, dinâmica e fluida. O plano diretor foi construído, as propostas foram debatidas e aprovadas, as batalhas com a administração da cidade foram travadas. Algumas nós vencemos, outras não. O plano aprovado não foi o que os movimentos desenharam e agora estamos de novo em luta por conta de outras mudanças e transformações. 

Nestes 25 anos muita coisa mudou por aqui. O bairro cresceu demais, vertiginosamente, e todos os dias podemos ver terrenos sendo tomados pelas máquinas, nossa vegetação atlântica sendo derrubada, nossas corujas buraqueiras sem lugar para criar seus filhotes.  Os novos moradores que chegam por conta da paisagem especulada não sabem quem foi Dona Nicota, nem o seu Chico, não conheceram seu Getúlio, nem arrastaram redes das canoas. Poucos são aqueles que se integram ao bairro de verdade, buscando viver o Campeche em toda a sua plenitude. A maioria só mora aqui. E, nesse contexto a própria rádio fica meio perdida. 

Alguns novos parceiros pensam que a rádio deveria se abrir aos novos tempos, buscar novos sócios entre os novos moradores de plástico, mudar o estatuto, permitir patrocínios. Os mais velhos insistem que a rádio não é uma rádio comercial, não nasceu para fazer dinheiro e sim para servir a comunidade. E comunidade entendida como povo em luta, como gente que compartilha um projeto comum.  Uma rádio comunitária não representa um grupo de moradores aleatórios ou que ocupam um mesmo território. Uma rádio comunitária representa aqueles e aquelas que estão sempre em luta por uma vida melhor no bairro e na cidade. 

Essas diferentes concepções de rádio sempre estiveram em disputa nestes mais de 20 anos, sendo que a proposta comunitária, depois de reiterados debates, até agora deu o tom. Mas, não sabemos até quando será assim. Afinal, não foi apenas o bairro que mudou. A cidade mudou, as pessoas também. Aquela generosa proposta de um Campeche-jardim, de casas baixas e vizinhos atentos no cuidado da praia e da vida comunal anda meio apagada. As propostas liberais de humanização do capitalismo estão cada vez mais fazendo a cabeça das pessoas, mesmo aquelas que se reivindicam de esquerda. É um tempo gris. 

Estamos abrindo agora em agosto mais um processo eleitoral para a direção da rádio. Será um momento decisivo porque as lutas renhidas, típicas da nossa comunidade, estão em baixa. E quando não há movimento a rádio também sente. Afinal, vai divulgar as lutas de quem? Já passamos por momentos assim, de baixa pressão. E decidimos seguir na resistência, em pé, mantendo os velhos princípios, fomentando e esperando novos ventos. Agora estamos assim de novo. Na virada de um quarto de século vamos mais uma vez decidir o que queremos ser. Ou seguimos comunitária, ou assumimos o caminho da rádio livre, desligada das lutas reais, focada em particularismo. 

A história dirá. 

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